Vinícolas pagarão R$ 7 mi em indenizações por caso de trabalho escravo no RS

Acordo com Promotoria prevê que, desse valor, R$ 2 mi serão repassados aos trabalhadores resgatados em Bento Gonçalves

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Porto Alegre

O MPT (Ministério Público do Trabalho) firmou na noite de quinta-feira (9) um termo de ajuste de conduta com as vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton, envolvidas no caso de trabalho análogo à escravidão flagrado em 22 de fevereiro em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul.

Em indenizações, as vinícolas pagarão R$ 7 milhões —dos quais R$ 2 milhões serão repassados de forma igualitária aos trabalhadores resgatados e R$ 5 milhões serão em multa por dano moral coletivo, que serão revertidos a "entidades, projetos ou fundos que permitam a recomposição de danos coletivos causados aos trabalhadores" que serão indicados pelo MPT. Cada trabalhador receberá R$ 9,6 mil.

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Operação com PRF, MPT e Ministério do Trabalho resgatou trabalhadores mantidos em situação de escravidão em Bento Gonçalves (RS) - Divulgação

As vinícolas pagarão valores diferentes, estabelecidos conforme o que a investigação apurou a cerca da responsabilidade de cada uma: A Aurora pagará aproximadamente R$ 3,2 milhões – R$ 2.291.666,67 mais R$ 916.666,67 aos trabalhadores, a Salton R$ 2,5 milhões – R$ 1.791.666,67 mais R$ 716.666,67 aos trabalhadores e a Garibaldi R$ 1,3 milhão –R$ 916.666,66 mais R$ 366.666,66 mil aos trabalhadores. As multas por dano coletivo serão pagas nos próximos dois anos, em fevereiro de 2024 e 2025.

Em 2022, as três vinícolas somadas anunciaram faturamentos que somam mais de R$ 1,5 bilhão - A Aurora faturou R$ 756 milhões, a Salton, R$ 500 milhões e a Garibaldi, R$ 265 milhões. O valor do TAC, corresponde, portanto, a cerca de 0,46% do faturamento das empresas no ano passado.

Conforme o MPT, o valor foi negociado e estabelecido com base em precedentes judiciais de empresas do mesmo porte econômico, em balancetes das empresas e levando em consideração as desvantagens de uma eventual judicialização, caso o acordo não fosse firmado imediatamente:

"Quem olhar de fora vai achar que poderia ser mais. Mas foi o valor que foi possível devolver rapidamente à sociedade por meio de indenização e para assegurar que na próxima safra já haja um controle da cadeia produtiva. Foi um valor estabelecido por um esforço muito intenso e eu acredito que foi um valor substancial", diz o procurador do trabalho Lucas Santos Fernandes.

Segundo o procurador, não houve dúvida sobre a responsabilidade das vinícolas no ocorrido.

"A responsabilidade existia. No sentido de ignorar deliberadamente e acintosamente [as condições dos trabalhadores resgatados]. Elas optaram por desconhecer a realidade daqueles trabalhadores. Se elas firmaram um acordo e se propuseram a pagar essa quantia vultuosa é porque não havia dúvidas de que elas falharam no dever de zelo, fiscalização e controle da cadeia produtiva", diz Fernandes.

As empresas também assumiram 21 obrigações de fazer e de não fazer para aperfeiçoar o processo de tomada de serviços, com a fiscalização das condições de trabalho e direitos de trabalhadores próprios e terceirizados, e impedir que novos casos semelhantes se repitam no futuro. O descumprimento dessas obrigações, conforme o TAC, acarreta em multas de até R$ 300 mil, conforme a violação.

Outro objetivo expresso no documento é monitorar o cumprimento de direitos trabalhistas na cadeia produtiva. As obrigações pactuadas passam a valer imediatamente.

A Fênix, empresa terceirizada responsável direta pela situação degradante em que se encontravam os trabalhadores, não firmou o acordo com o MPT. O órgão havia proposto, além da admissão de culpa, mais R$ 600 mil em indenizações - o que não impediria ações individuais dos trabalhadores contra a empresa.

Em razão do desacordo, a Justiça do Trabalho determinou o bloqueio de R$ 3 milhões da empresa, que é ainda investigada no âmbito criminal. Logo após a operação, a empresa desembolsou cerca de R$ 1 milhão nas rescisões e pagamentos pendentes aos trabalhadores.

Após o TAC, as três vinícolas se manifestaram por meio de nota.

A Aurora disse que o TAC é "mais um passo para assegurar o comprometimento da empresa com medidas permanentes de promoção de condições dignas e seguras no trabalho". Disse ainda que reafirma à sociedade brasileira "seu compromisso de aperfeiçoar cada vez mais os processos produtivos e mecanismos de fiscalização, garantindo aos trabalhadores, diretos e indiretos, uma jornada com segurança, salubridade, treinamento adequado e respeito".

A Salton disse que " tem o intuito de reforçar publicamente seu compromisso com a responsabilidade social, boa-fé e valorização dos direitos humanos, bem como a integridade do setor vitivinícola gaúcho", mas, diferentemente da avaliação do MPT, diz que "sua celebração não significa e não deve ser interpretada como assunção de culpa ou qualquer responsabilidade por parte das vinícolas pelas irregularidades constatadas na empresa prestadora de serviços [Fênix]".

Já a Garibaldi disse que o TAC "reafirma seu compromisso, perante a sociedade brasileira e a cadeia vitivinícola, de atuar de forma efetiva no cumprimento e na exigência de práticas que respeitem os direitos humanos e trabalhistas", e que já vem implementando "novas práticas internas" para a contratação e fiscalização de prestadores de serviço desde o episódio.

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