Cerco ao descartável cria nicho para fralda e absorvente de pano

Peças são mais econômicas a longo prazo, mas o investimento inicial é maior

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São Paulo

O cerco ao plástico atinge fraldas e absorventes, itens essenciais de higiene. 

Para se ter uma ideia da quantidade de lixo que eles geram, uma criança usa, até os dois anos, cerca de 3.100 fraldas, segundo tabelas de fabricantes. Já uma mulher que precisa de três absorventes diários e tem ciclos de cinco dias vai consumir 7.800 unidades em 40 anos de período fértil. 

Ana Paula Silva, fundadora da Morada da Floresta, na sede da empresa, em São Paulo
Ana Paula Silva, fundadora da Morada da Floresta, na sede da empresa, em São Paulo - Bruno Santos/Folhapress

Diferentemente dos canudos, que são opcionais, substituir fralda e absorvente não é simples. Mas há empresas apostando em alternativas. 

A Nós e o Davi, que fabrica fraldas de pano reutilizáveis, foi fundada por Lais de Oliveira depois que seu filho nasceu, em 2013. Ela diz ter se sentido incomodada com a quantidade de lixo que passou a gerar. 

Os modelos vendidos são diferentes daqueles do passado, que tinham proteção plástica e eram presos à criança com alfinetes. As novas fraldas são de tecidos mais confortáveis, como o pul, um poliéster impermeável, e ajustadas ao bebê com elásticos e botões. 

Elas podem ser lavadas na máquina e não precisam ser passadas. Convencer os consumidores dessa praticidade, porém, é um desafio. 

“Há uma referência de que fralda de pano é muito trabalhosa, mas desenvolvemos um método mais simples”, diz Ana Paula Silva, dona da Morada da Floresta, outra marca que fabrica e vende esse tipo de produto.

As peças têm vida útil suficiente para todo o período em que o bebê as utiliza. São mais econômicas a longo prazo, mas o investimento inicial é maior, já que é preciso comprar várias de uma vez —um recém-nascido usa cerca de oito fraldas ao dia.

Cada fralda da Nós e o Davi custa entre R$ 49 e R$ 70; na Morada da Floresta, os preços vão de R$ 54 a R$ 70.

A Morada vende fraldas de pano desde 2009. No final de 2017, lançou um modelo em parceria com a apresentadora Bela Gil, o que aumentou a a visibilidade da peça. 

“Vendíamos 400 fraldas por mês, dobramos esse número com a parceria”, diz Silva. 

Diminuir o consumo de absorventes descartáveis é outra preocupação da empresária, que aposta em similares de pano, vendidos no site da Morada. Neste ano, a empresa começou a vender também calcinhas absorventes. 

Elas se parecem com lingerie comum, mas têm três camadas de tecido nos fundilhos que absorvem o fluxo menstrual e dispensam o uso de protetores descartáveis. Após o uso, basta lavar a peça e usá-la novamente. 

Esse tipo de calcinha é produzido há anos nos Estados Unidos e na Europa, mas os modelos não se encaixavam nas necessidades das brasileiras, segundo Emilly Ewell e Maria Eduarda Camargo, fundadoras da Pantys, marca nacional de lingerie absorvente.

Ewell, que é norte-americana, conta que trabalhava com ecommerce e estava fazendo um projeto com fornecedores de lingerie quando conheceu as peças absorventes vendidas lá fora. Porém, percebeu que as calcinhas tinham função complementar, eram usadas com absorventes internos, para evitar vazamentos. 

Foi feita, então, uma pesquisa de mercado, mostrando que a brasileira prefere absorvente externo.

“Precisávamos de uma calcinha com poder de absorção para substituí-lo”, diz Camargo. 

A empresa desenvolveu sua própria linha de calcinhas, com três níveis de absorção.

A lingerie chamou a atenção da Johnson&Johnson, fabricante dos absorventes Sempre Livre, que procurou a empresa para lançar um modelo em parceria. O resultado é uma calcinha que já está disponível no ecommerce da Pantys e que começa a ser vendida em uma rede de farmácias brasileiras neste mês por R$ 55 —outros modelos da marca custam R$ 95. 

“A tecnologia é a mesma, mas fizemos um modelo mais básico e acessível”, diz Ewell. “Queríamos trazer esse produto para mais clientes”. 

Além da sustentabilidade, já que evitam o uso de materiais plásticos, as calcinhas absorventes e as fraldas de pano são mais confortáveis, de acordo com os fabricantes. 

Consumidores de fraldas de pano e lingerie absorvente são em geral pessoas adultas de classe B, com preocupação ambiental. Mas, lentamente, o mercado está se diversificando. As calcinhas, agora, também são procuradas por meninas saídas da adolescência e mulheres com incontinência urinária leve.

Na Nós e o Davi, a procura pelas fraldas já foi mais motivada pela questão econômica, mas, hoje, Oliveira diz perceber um número maior de consumidores impulsionados por valores. “Eles estão preocupados com sustentabilidade e compra consciente, querem saber de onde a fralda veio, como foi feita”, diz.

Por isso, a empresária deixou de terceirizar a confecção. É uma forma de se certificar de que a cadeia é justa. 

Se para as fraldas de pano o principal empecilho às vendas é a ideia de que são pouco práticas, as calcinhas absorventes enfrentam o tabu em torno da menstruação e o desconhecimento dos brasileiros sobre o tema, acredita Fábio Mariano, sociólogo especialista em consumo e professor da ESPM. 

Como o tema é pouco discutido, muitas consumidoras nem sabem para que serve o produto ou como usá-lo. Vencer essa barreira é importante para sair dos nichos de renda e escolarização alta. 

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