Seis empreendedores experientes dão seus conselhos para novatos

Não desperdiçar tempo com atividades secundárias é a principal sugestão para quem quer abrir uma empresa

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Fernanda Lacerda
São Paulo

Sobreviver ao primeiro ano de negócio exige não só planejamento. O empresário também precisa ter expectativas realistas sobre o mercado e desapegar de estratégias que pareciam ser garantia de sucesso, mas não deram resultado. 

Relembrando o início de suas trajetórias, seis empreendedores de diferentes áreas de atuação recomendam valorizar, sobretudo, o tempo. Não se sobrecarregue tentando fazer tudo sozinho, não desperdice foco e energia com atividades secundárias ou ideias que você já percebeu que não vão vingar.

Os problemas do mercado brasileiro abrem, paradoxalmente, muitas oportunidades de negócio: quebrar cadeias longas e custosas, conectando diretamente fornecedor e comprador, é uma boa aposta. 

“Crie algo tangível para a maioria dos brasileiros e com isso você vai ter muito marketing boca a boca”, diz Dominique Olivier, presidente-executivo da marca de moda Amaro. 

Veja conselhos para quem quer começar um negócio neste ano.

‘Não se apaixone por suas ideias’

O principal acerto ao criar a Cantinho do Brincar, espaços de desenvolvimento para crianças da periferia, foi entender onde eu iria atuar. 

Eu não faço parte do público-alvo, não sou mãe nem moro na periferia. Então, fiz imersões, fui a creches, escolas públicas. Uma imersão na vida do seu cliente ajuda a entender a realidade dele. 

O próximo passo é entender o que não funciona. Não se apaixone por uma ideia que você tem e não gaste muito tempo em um contexto que não vai funcionar. 

Eu gostaria que tivessem me falado que a coisa mais valiosa que eu tenho é meu tempo. Acabamos gastando tempo fazendo coisas operacionais, em vez de contratar pessoas para isso. Isso atrasou o desenvolvimento do negócio. Não valorizamos o maior recurso que a gente tinha: o nosso tempo.

Para quem quer começar, eu recomendo ter clareza de suas motivações. Seus primeiros clientes vão ser empolgados, mas você não pode pensar que só existem essas pessoas no mundo. 

Renata Citron, 32, que criou em 2018 o Cantinho do Brincar

 

‘Você vai aprender com seus clientes, não na sala do coworking’

Uma falha que vemos muito entre os empreendedores é tentar resolver tudo por conta própria, essa sensação de que o dono sabe mais do que os outros. Talvez o grande segredo seja conseguir trazer pessoas melhores do que você para ajudar no negócio. 

Os empresários tendem a focar muito no produto e se esquecer do modelo de negócio. 

Para criar uma base sólida, é preciso conhecer muito o seu cliente. Não apenas por bate-papo, no balcão da loja, ou com base no “feeling”. Se você quiser vender mais e melhor, é preciso pensar em como o cliente vai comprar e como ele vai utilizar o produto. 

A melhor estratégia é lançar seu produto o quanto antes e ir para a rua contatar o cliente. Você vai aprender com ele sobre seu negócio, e não na sala do coworking. 

Acho que existem muitas oportunidades no país, apesar das dificuldades. Nunca vi tanto dinheiro disponível para financiar empreendimentos como agora. É um momento ótimo para aproveitar. Também há muitos empreendedores mais experientes dispostos a serem mentores. 

Claudio Sassaki, 45, presidente-executivo da Geekie, empresa que desenvolve soluções tecnológicas para a área de educação, fundada em 2011

‘Aprenda a conviver com o risco de falhar’

Meu conselho para quem está começando é: faça um plano bem detalhado de gastos. Verifique se você tem suporte financeiro para dar esse passo. Convide uma ou duas pessoas de confiança e peça para elas apontarem problemas que você pode não estar vendo no seu plano. Chame um “advogado do diabo”. 

A pessoa que quer empreender precisa saber se consegue viver com o risco de empreender. Você precisa se perguntar: se eu perder tudo, como vou ficar? É importante pensar que pode não dar certo e trabalhar com essa hipótese. 

Até quando você se permite colocar mais dinheiro? Os empreendedores, em geral, não abandonam o navio. Em algum momento, você precisa pular para o bote. 

Crie um planejamento para o primeiro ano, trimestre a trimestre, mês a mês, semana a semana e, se possível, dia a dia. Se você passa cinco dias sem faturar, já percebe que não vai alcançar o previsto.

Marcelo Abrileri, 54, empreende na internet desde 1995. Seu negócio mais recente é o clube de assinaturas de vinho Eniwine, em operação desde 2018

'Demore a contratar, mas demita rápido’

Muita gente chama o amigo para ser sócio, mas nunca reflete sobre as habilidades que aquela pessoa tem. 

Eu e meu sócio, Everton, temos um equilíbrio muito grande de personalidade na Vittude, empresa de terapia online. Eu fico com vendas e marketing; ele, com operações, finanças e produto. 

No começo, não nos preocupamos com alguns potenciais problemas. Fizemos contratos usando documentos padrão encontrados na internet em vez de buscar um advogado e depois percebemos como aquilo era nocivo. 

Só com a entrada de um fundo grande conseguimos organizar isso. Mas se a gente não tivesse crescido o suficiente, esses problemas teriam sido proibitivos. 

Outro ponto é como você contrata e demite pessoas. No início, todos da equipe estão muito juntos por ser um empreendimento pequeno. 

Isso faz com que você demore a se decidir por demitir um funcionário. Isso nos custou não só em termos de resultado, mas também no clima da equipe inteira.

Eu gostaria que tivessem me falado quando comecei para ter mais calma na hora de recrutar. Quando temos um time engajado, como agora, percebemos a importância da seleção. Contrate com calma, mas demita rápido. 

E, se possível, tenha uma reserva de dinheiro. Sempre achamos que vamos faturar, mas imprevistos ocorrem.

Tatiana Pimenta, 38, criadora da Vittude, empresa de terapia online fundada em 2016 

‘Curtidas não bastam e não dão dinheiro’

Gostaria que tivessem me falado que as coisas seriam menos difíceis do que me fizeram acreditar. Há um prazer quase que sádico em dizer que as coisas serão complicadas. 

No meu caso, percebi que muita gente dizia isso pelo incômodo de me ver avançar. Não é fácil. Não é mesmo. Mas também não é algo tão absurdamente difícil. Leva tempo.

Tem uma série de fatores que farão diferença. Habilidades, talento, técnicas, sorte, parcerias. Se você for uma mulher negra, será ainda mais difícil, mas ainda assim possível. 

Converse com quem está fazendo, participe de eventos da área. Não seja forçadamente simpático e seja realista. E faça planilhas orçamentárias.

Quando pensar em desistir, lembre do que te motivou a começar e, se ainda houver essa vontade inicial, siga. 

Cuidado com as redes sociais. Nelas, todo negócio parece bem-sucedido. Curtidas não dão dinheiro. Elas não são um problema, o problema é achar que elas bastam.

Janine Rodrigues, 38, dona da Piraporiando, editora de arte-educação fundada em 2015

‘Tente solucionar algo relevante na vida das pessoas ou das empresas’

Ao criar a Amaro, marca de moda, nosso maior acerto foi conseguir casar criatividade e tecnologia dentro de uma empresa. Contratamos pessoas de todas as tribos. Isso traz uma grande vantagem.

Nosso principal erro foi acharmos que o mercado online ia se desenvolver mais rápido do que efetivamente está se desenvolvendo. Seguimos pesquisas e olhamos para os dados friamente. 

Hoje, nosso modelo de negócio é baseado no feedback da nossa clientela. Criamos outros canais de venda, como os guide shops [lojas físicas], onde as pessoas que ainda não estão tão acostumadas com a compra online podem descobrir a marca.  

Tem duas coisas que gostaria de saber quando comecei. A primeira é que sempre demora mais tempo e custa mais dinheiro do que o que você colocou no seu plano de negócios. O segundo é que, em um mundo onde há muitos experts, é preciso ter cuidado. Você tem que ter filtro, escutar e colocar no seu contexto.

Para quem está começando, eu recomendo pensar sobre como seu produto ou serviço agrega valor para o cliente. Tente solucionar algo relevante para pessoas ou empresas. 

Dominique Oliver, 35, presidente-executivo da Amaro, marca de moda fundada em 2012 como ecommerce e que hoje tem lojas físicas

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