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Pequeno empresário recorre a redes de networking para enfrentar solidão

Contato com outros empreendedores ajuda a alavancar negócio com novas soluções e parcerias

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São Paulo

Focados na operação diária de seus negócios, empresários acabam se sentindo sozinhos, sem tempo para desenvolver uma rede de contatos ou mesmo para desabafar sobre os problemas que enfrentam. O fenômeno é mais drástico entre os pequenos, que muitas vezes não têm nem sequer uma equipe.

A engenheira eletricista Raquel Lemos, 38, conta que se sentiu isolada desde o momento que resolveu empreender, em 2016, quando fundou a Real Bem-Estar, que comercializa travesseiros e colchões terapêuticos.

“Eu me vi sozinha em diversos sentidos. Nem a minha família concordava com a decisão. Achavam que era algo muito instável. Quando se trabalha em uma empresa, você debate com outros para saber como resolver um problema, mas eu não tinha ninguém.”

Raquel Lemos, proprietária da Real Bem-Estar, em seu escritório, na zona oeste de São Paulo
Raquel Lemos, proprietária da Real Bem-Estar, em seu escritório, na zona oeste de São Paulo - Zanone Fraissat/Folhapress


Ela procurou, então, redes de networking para empresários, visando atenuar o a solidão e aumentar os negócios.

“Além de ajudar nas vendas, com recomendações, nesses grupos você convive com outras pessoas, o que pode ajudar até no seu potencial criativo. Sozinho, você fica dentro de uma caixa, enxergando só problemas’”, diz ela. A Real Bem-Estar tem um funcionário fixo além de Raquel e fatura cerca de R$ 50 mil por mês.

Buscando ajudar exatamente esses profissionais, Kalil Lucena, 35, fundou em setembro a Rede Kai, que promove encontros semanais, no momento online, entre empresários.

“A ideia é formar uma comunidade de empreendedores de uma mesma região, a maioria pequenos e médios, para que façam negócios entre si. Mas a convivência traz outros ganhos, como apoio durante momentos difíceis e um espaço para oxigenar as ideias”, diz. A anuidade da rede custa R$ 2.750.

Durante a pandemia, a necessidade de conexão ficou mais clara, seja para buscar negócios num momento complicado ou apoio para quem teve de se reinventar.

Licca Fernandes, 54, encontrou ajuda na rede quando viu sua empresa de 13 anos, a QG Eventos, praticamente acabar durante a quarentena. O setor foi um dos mais atingidos.

“Tive 14 eventos cancelados entre março e junho do ano passado. Fiquei abalada. Não tinha com quem conversar. Eu não tenho funcionários, porque contrato sob demanda.”

Sua rede de networking, porém, a ajudou, inclusive, a mudar seu modelo de negócio para sobreviver.
“Eu queria até me afastar das redes, porque realmente não tinha o que oferecer, mas as pessoas se preocuparam comigo. Senti carinho, amizade, solidariedade”, diz.

Além do apoio emocional, Licca se juntou a dois conhecidos e resolveu levar sua expertise para mundo virtual. Assim, nasceu a plataforma Live Events, que realizou 50 eventos digitais entre julho e dezembro de 2020.

“Existe uma associação médica para a qual organizo eventos há 18 anos. Eles confiaram em mim para fazer uma versão online em 2020 e houve mais de 11 mil acessos”, diz, reforçando o poder do networking.

A QG faturou cerca de R$ 400 mil em 2019; a Live Events conseguiu o dobro disso só nos últimos seis meses de 2020.

Outro que recorre às redes de empresários é Ronaldo Azevedo, 44, dono da CRB Profissional, empresa de soluções de higienização e limpeza que tem 12 anos de mercado.

Ele se lembra de um caso inusitado no qual seus conhecidos o ajudaram a diminuir um prejuízo inesperado.

“Certa vez um técnico foi instalar nossa solução numa academia e detonou as instalações. Tinha que resolver, e a brincadeira iria custar R$ 12 mil. Conversando com parceiros, consegui encontrar um reparo por R$ 3.000. Eu gastei um quarto do que gastaria porque conheço gente”, diz.

A CRB Profissional tem dez funcionários e fatura cerca de R$ 500 mil por mês.

Para David Kallás, professor de estratégia no Insper, além das redes, os empresários têm outras alternativas para driblar a solidão.

“Uma opção é fazer cursos de curta duração, já que provavelmente eles não têm tempo para MBA. Outra é procurar associações setoriais e profissionais. Com o tempo, você acaba vendo sempre as mesmas pessoas nos eventos [agora online] e as conhece”, diz.

Ronaldo Azevedo, dono da CRB Profissional, na sede da companhia, em SP
Ronaldo Azevedo, dono da CRB Profissional, na sede da companhia, em SP - Zanone Fraissat/Folhapress

O Sebrae-SP criou uma mentoria gratuita de inteligência emocional, demanda surgida na pandemia. “Nos ligavam desesperados, ansiosos, sem conseguir tomar decisões sozinhos, e daí veio a iniciativa”, diz Raíssa Kill, analista. A oficina, online, já chegou a ter 1.200 espectadores simultâneos.

Edgar Barki, coordenador de empreendedorismo da FGV, lembra que buscar relações é tão importante para uma empresa quanto qualquer outra área. “Não é perda de tempo, mas uma forma de alavancar seu negócio. Tem que se concentrar nisso da mesma forma que se preocupa com fluxo de caixa ou compra de materiais”, afirma.

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