Descrição de chapéu casamento

Casamentos adiados lotam agenda de profissionais de eventos em 2022

Remarcações sucessivas dificultam o encaixe de novos clientes, o que pode tornar recuperação do setor mais lenta

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São Paulo

O setor de eventos fechou o ano passado com queda de 98% no faturamento. Cerca de 4 em cada 5 celebrações foram adiadas, segundo a Abrafesta (Associação Brasileira de Eventos).

“Tivemos um primeiro trimestre excepcional de vendas em 2020, com perceptiva muito boa. Estávamos muito felizes”, afirma Angela Soares, sócia do espaço de eventos Oca Tupiniquim, em São Paulo.

Tudo mudou em março, com as restrições a aglomerações. Mas, para os profissionais, o trabalho não parou. Começou a tarefa de remarcar os casamentos e de atuar como psicólogo dos clientes, motivando-os a não desistir do sonho da festa.

“O cancelamento é nosso bicho-papão. Imagina se 30 casais cancelam e tenho que restituir uma parte do que foi pago? A empresa, por mais organizada que esteja, sucumbe”, afirma André Gomes, que junto com sua esposa Camila forma a dupla Amora Fotografia.

Para não perder clientes, os profissionais do ramo estão aumentando o prazo de pagamento e diminuindo os valores de entrada.

A lei 14.046/20 também permite que, em caso de cancelamento de evento até 31 de dezembro de 2021, os empresários devolvam o valor recebido até o final de 2022, caso não seja possível uma remarcação ou conversão em créditos.

Os reagendamentos viraram a função principal da assessora de festas Camila Relva, há 17 anos na área. Em vez de ajudar a noiva a escolher todos os detalhes, ela passou a lidar com protocolos de segurança, cláusulas contratuais e advogados dos clientes.

“De repente, começamos a mexer com frustração. É complicado, porque estamos ali pela noiva, mas entendemos o lado dos fornecedores.”

Cada área do setor enfrenta uma dificuldade específica. Cris Castilho, sócia do Atelier Luit, especializado em vestidos de noiva, conta que nos últimos meses muitas clientes ganharam peso ou engravidaram. Com isso, alguns modelos terão que ser refeitos.

Ela viu o movimento do ateliê cair de 60 clientes ao mês para uma média de 20. Mas, em março deste ano, o pior mês da pandemia até agora, realizou apenas dois atendimentos.

Apesar da dificuldade, ela afirma que a empresa está segurando as pontas para não demitir funcionários. “Não pensamos em demitir. Nossa equipe é antiga, e o treinamento das artesãs para lidar com vestido de noiva demanda muito tempo”, diz.

A empresária enfrenta um problema comum entre os empreendedores desse mercado: como conseguir novos clientes se ainda está presa aos antigos? O setor trabalha com até dois anos de antecedência, o que significa que boa parte do dinheiro cobrado dos noivos já foi recebido —e, muitas vezes, gasto.

Com os eventos ainda por realizar, os profissionais ficam com a agenda futura comprometida e têm dificuldade para encaixar novos clientes.

As remarcações sucessivas pioram o cenário, já que uma mesma cerimônia pode ter ocupado datas em 2020, 2021 e agora ter sido transferida para 2022. Na prática, são três possíveis clientes a menos para os empresários.

Além disso, as datas disponíveis são limitadas. Como explica Camila Relva, há apenas 52 sábados por ano, e esse dia é o mais buscado pelos casais. Para contornar o problema, os profissionais tentam convencê-los a remarcar a cerimônia para dias alternativos, como sexta-feira ou domingo.

A dupla Badulaque, formada pelo casal de músicos Ataiza e Leandro Medeiros, toca há cinco anos em casamentos. Faziam 45 festas por ano, mas desde o começo da pandemia foram só sete apresentações.

“No início, tínhamos uma reserva. Depois que ela acabou, estamos vivendo um mês de cada vez”, afirma Ataiza.

Noivos de costa olhando para dupla cantando e tocando vioção
Ataiza e Leandro Medeiros, a dupla Badulaque, que se apresenta em casamentos - Divulgação

O casal também faz serenatas virtuais, mas afirma que a busca por esse tipo de serviço fica concentrada no Dia dos Namorados e das Mães. Agora, eles buscam financiamento para lançar um projeto autoral.

A captação de novos clientes é feita pelas redes sociais, mas, com a pandemia, começou a até faltar material de divulgação, já que os vídeos eram feitos nos próprios casamentos. Para conseguir conteúdo, eles passaram a fazer gravações em casa.

Os fotógrafos Camila e André Gomes enfrentaram o mesmo problema. Logo antes da pandemia, eles pagaram para entrar na lista de fornecedores de um grande blog de casamentos e investiam em conteúdo nas redes.

Para continuar postando, começaram a organizar editoriais —casamentos falsos, feitos por fornecedores que se unem para criar material de divulgação.

O casal ficou sem trabalhar em eventos de abril a setembro. Em 2021, até agora, fizeram quatro casamentos.

Voltar a fotografar é um alívio, mas também uma preocupação. “Nós observamos como é um casamento na pandemia. As noivas querem seguir os protocolos, mas não tem como segurar os convidados”, afirma a fotógrafa.

A organizadora Camila Relva conta que, no momento, recomenda a remarcação dos eventos para 2022, a fim de evitar esse tipo de problema. “Muitas noivas têm medo, pensam que alguém pode pegar a doença no casamento e morrer.”

As festas que ainda estão marcadas para este ano tendem a ser menores e sem pista de dança. Os convidados precisam usar máscara e permanecer sentados.

No espaço de festas Oca Tupiniquim, agora, estão sendo organizados para o segundo semestre jantares para grupos pequenos, com 15 ou 20 convidados.

Angela Soares conseguiu manter três dos cinco funcionários fixos até o momento. A segunda demissão foi feita neste ano, quando ela percebeu que teria que enfrentar mais meses de pandemia.

A empresária já renegociou o aluguel do local e os contratos com fornecedores. “Já fico bem feliz de ter suportado este primeiro ano, da empresa estar de pé, e agora nosso desafio é segurar por mais um”, afirma. Sua prioridade é continuar agendando novos casamentos, inclusive para 2023.

“Somos uma empresa estruturada, com prestígio no mercado e caixa para resistir”, diz a empresária, que critica a falta de políticas públicas para apoiar o setor. “A sensação é que estamos sozinhos.”

Setor espera boom de eventos após pandemia

Ricardo Dias, presidente da Abrafesta, aposta que, quando os eventos voltarem a ocorrer com mais normalidade, haverá uma grande demanda, e os empresários do setor entrarão em boa fase.

O problema é chegar até lá. Segundo Dias, metade das empresas do segmento deve fechar ou mudar de ramo até o fim da pandemia, por não aguentar passar tantos meses sem faturamento.

Para amenizar a crise, uma das medidas que a Abrafesta apoia é o PL 5638/20, para a criação do Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos).

O texto inclui a possibilidade de parcelamento de débitos das empresas em até 120 vezes, dá desconto de 70% em multas e juros, acaba por 60 meses com as alíquotas de alguns impostos e exige que bancos federais tenham linhas de crédito para o setor. O projeto foi aprovado na Câmara no último dia 7 e aguarda sanção presidencial.

Quem tinha um planejamento financeiro forte consegue ver um lado positivo na crise. Victor Luz, dono do Grupo Calzone, que tem bufê e dois espaços de eventos em São Paulo, comprou um terceiro local para festas durante a pandemia.

"Tem oportunidade melhor no segmento imobiliário, para quem tem reserva financeira, é um bom momento para comprar e locar", diz.

Sua ideia é usar o novo espaço para desafogar a agenda das remarcações e não ter que recusar clientes por falta de datas.

Desde que a pandemia começou, ele adaptou as degustações do bufê e provas da decoração para o delivery, complementado por chamadas de vídeo com o chef da casa e vendedores.

"A gente acredita que neste ano ainda vamos sofrer um pouco, mas nos próximos teremos tudo flexibilizado e a aglomeração que o brasileiro gosta. Nossa expectativa é que a demanda triplique", afirma.

98%
é a queda de faturamento do setor de eventos no território nacional, em 2020

79%
dos eventos sociais e corporativos foram adiados no Brasil em 2020

Fonte: Abrafesta

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