Empreendedores contam os desafios de investir em uma franquia na pandemia

Como donos de negócios, profissionais tiveram que aprender a lidar com incertezas e contornar restrições da quarentena

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São Paulo

Por vontade de empreender, busca por uma alternativa para fugir da crise ou dificuldade de se recolocar no mercado de trabalho, muitos profissionais decidiram investir em franquias na hora de começar um negócio. Confira, abaixo, a história de quatro deles —que tiveram que aprender a lidar com incertezas e contornar restrições da quarentena ao empreender depois da chegada da Covid-19.

‘Temos que estar preparados para conviver com a instabilidade’

Albar Kopper, 57, franqueado da rede de energia fotovoltaica Blue Sol, em São Paulo

Até 2016, eu atuava na locação de equipamentos para engenharia civil, sempre com carteira assinada. Saí da empresa em uma fase muito difícil de encontrar recolocação, tanto por causa da minha idade quanto pela economia. Então voltei para a Costa Rica, país onde nasci, e fiquei até o começo da pandemia. Daí acabou o trabalho lá também. Como minha mulher e meu filho estavam aqui, voltei no primeiro avião que consegui, já pensando em trabalhar por conta própria.

Fiz prospecção no mercado de energia fotovoltaica e, nessa busca, encontrei um modelo da Blue Sol que era interessante para mim: a franqueadora faz toda a parte técnica, e eu, como franqueado, fico com a parte comercial. O investimento inicial é menor. Foram R$ 20 mil, com retorno planejado em um ano, mas acredito que vai chegar antes. Em abril, consegui fechar vários negócios, pode ter sido sorte, mas isso anima. As pessoas estão abrindo o olho para o consumo de energia, porque há risco de racionamento.Começar um negócio na pandemia me deixou receoso, mas, para ser honesto, o mais difícil é dar o primeiro passo.

No começo, fui resistente com o trabalho online, apresentar a proposta por videoconferência. Não sei se a pessoa do outro lado da tela está me vendo. Mas percebi que as pessoas gostam e, como estão isoladas, bem ou mal a videoconferência é um bate-papo.A franqueadora faz investimento em marketing, mas faço a minha a parte, divulgo para amigos. Aprendi que agora é por minha conta. Vamos viver com a instabilidade e precisamos nos preparar. Desde o ano passado estou cortando despesas desnecessárias —todo mundo está.

‘É bom ver que não ficamos parados em uma época tão difícil’

Rosana Vasco Tomé, 56, franqueada da Chocolateria Brasileira, em São Paulo

Trabalhei muito tempo no mercado financeiro, os últimos 20 anos na Bolsa de Valores. Na junção da Bolsa com outras empresas, fui desligada. Quis saber como seria ficar em casa, cuidar da minha vida. Fiz isso por dez anos. Meu marido também tinha carteira assinada, atuava em logística no setor de alimentos, mas foi desligado da empresa pouco antes da pandemia. A gente já pensava em ter um negócio e essa poderia ser uma oportunidade.

Planejamos uma franquia de cafeteria, mas, quando estávamos para fechar o contrato, no final de março de 2020, tivemos que adiar por causa da pandemia. Nesse tempo, achamos uma opção melhor, juntando cafeteria com chocolateria. Se fosse só café, ficaríamos mais dependentes do consumo presencial.Achamos um ponto e resolvemos arriscar. Foi bom porque pegamos o Natal, mas a pandemia é um desafio diário. Justamente na Páscoa tivemos que fechar e nos reinventar.

Negociamos com fornecedores e começamos a vender por meio do Instagram. Eu não conhecia nem acreditava muito nisso, mas estamos aprendendo e tem dado certo.Investimos cerca de R$ 250 mil. O plano era recuperar em 24 meses, mas refizemos as projeções e agora esperamos retorno em até 36 meses.

O desafio é nunca saber o que vai acontecer, vivemos um dia de cada vez. Sei que é complicado esse negócio de se reinventar, mas é bom ver que não ficamos parados nesta época tão sem perspectiva.
O país não ajuda, a burocracia para abrir um negócio é imensa. Tive de aprender a ter muita paciência, a lidar com pessoas e a persistir. E aprender a fazer café.

‘Driblamos a falta de contato presencial com marketing digital’

Ednilson Barbosa de Souza, 30, franqueado da Credfácil, em Castanhal (PA)

Eu já era funcionário de uma empresa de crédito consignado, mas estava frustrado: trabalhava demais e o retorno financeiro era baixo. Sempre desejei empreender, mas é difícil atuar na área financeira fora das grandes instituições. Pesquisei, vi que a Credfácil tinha dois modelos de franquia, um em home office, outro com loja física. Minha mulher também trabalhava em banco. A gente não tinha dinheiro para comprar a franquia, então começamos a fazer bicos e conseguimos um crédito consignado de R$ 20 mil para começar.Transformei nosso quarto de hóspedes em escritório. Eu vendia sozinho, de casa, mas as pessoas queriam conversar pessoalmente.

Um dia, encontrei uma sala no centro da cidade, decidi alugar. Abri a loja em março de 2020, mas em menos de um mês tive que fechar, por causa das restrições da pandemia.Voltei para o meu quartinho, mas já com uma carteira de clientes. Em abril pude voltar a trabalhar na loja, mas sem receber clientes. Fui tomando fôlego, as coisas foram reabrindo, e, em agosto, comecei a pensar num lugar maior.

Abri em outubro, ainda com restrições de funcionamento. Esperava ter lucro em um mês, mas não deu. Em novembro, fiz minha melhor contratação: minha mulher veio trabalhar comigo. Já estabilizamos o caixa, temos mais uma colaboradora e estamos treinando outra pessoa.No início da pandemia, o maior obstáculo foi a falta de contato presencial. Mas investimos no marketing digital e viramos referência. Outra dificuldade foi a incerteza. Mas às vezes é bom ser ingênuo e acreditar que sua empresa vai crescer. Aprendi que não dá para esperar uma estabilidade, que talvez nunca chegue, para começar um negócio.

‘O mais difícil foi vencer o medo de investir tudo o que eu tinha’

Cleonice de Oliveira Silva, 47, franqueada da Sofá Novo de Novo, em Guarulhos

Eu era auxiliar de enfermagem. Há cinco anos, meu pai morreu em meus braços e não consegui voltar ao hospital. Resolvi parar de trabalhar, mas comecei a me cansar de ser dona de casa. Procurava o que fazer na internet e não encontrava nada. Um dia, mexendo no Instagram, achei uma rede de higienização e blindagem de estofados. Já estávamos na pandemia, todo mundo trancado querendo arrumar a casa. Eu tinha um dinheiro guardado da rescisão com o hospital.

Antes de investir, pesquisei na internet, conversei com pessoas que atuavam na área e fui fazer o treinamento da franqueadora. Tive medo de começar meu primeiro empreendimento no meio da pandemia, mas decidi arriscar.

Eu sempre fui assim, nem a Covid me abalou. Mas afetou todo mundo. Tive cliente que cancelou o serviço. Mesmo assim, consegui atender muitas casas, sempre tomando todos os cuidados. Não contratei ninguém de fora. Desde o começo quem trabalha sou eu e meu filho, de 21 anos.
A gente começa às 9h e termina lá pelas 19h30. Não é uma rotina difícil para quem já trabalhou em pronto-socorro.

Meu maior desafio foi vencer o medo de investir e não ter retorno. Gastei R$ 25 mil na compra da franquia e pago um salário mínimo por mês para a franqueadora. Em um ano, quero ter de volta o que coloquei no negócio. Aprendi que tudo na vida envolve custo. Ainda não penso em contratar funcionários e estou usando as redes sociais da franqueadora para não gastar com divulgação. O boca a boca está funcionando. Estou com a agenda cheia até julho.

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