Empreendedores voltam aos escritórios com regime híbrido e espaços menores

Empresas adotam sistema de rodízio de funcionários e diminuem gastos com condomínio e aluguel

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Com a suspensão das medidas de restrição na maioria dos estados, pequenas e médias empresas testam, ainda que lentamente, o retorno aos escritórios.

A volta ao trabalho presencial acontece gradualmente, com a implementação de modelos híbridos, a adoção de sistemas de rodízio e a continuidade do home office para parte da equipe.

A divisão do quadro de funcionários permitiu escritórios menores. E a redução dos gastos com condomínio e aluguel tem ajudado as empresas a prepararem o terreno para a reintegração do pessoal.

“Temos um ambiente novo, agora sem divisórias. Estamos contratando especialistas para treinar nossos colaboradores para essa nova realidade”, afirma Leonardo Pantaleão, diretor-executivo da Sices Solar, que atua no mercado de energia fotovoltaica.

A empresa colocou a maioria dos 150 funcionários em home office no início da pandemia e trocou o escritório de quase 2.000 metros quadrados por outro com a metade do tamanho. Com o avanço da vacinação, planeja, a partir de outubro, a volta dos funcionários no modelo híbrido.

Segundo Pantaleão, a decisão foi tomada após algumas pessoas manifestarem a preferência pelo trabalho presencial. Ainda assim, no espaço físico menor, a empresa economizará 40% no aluguel. “Diminuindo o custo fixo, consigo reduzir também o preço final do produto. A empresa fica mais competitiva”, diz.

Além da imunização dos funcionários contra o coronavírus, a marca de vinhos Veroni leva em consideração a variação no fluxo de caixa para planejar o retorno, a partir de novembro.

A empresa tem no catálogo vinhos rosé e branco, mais consumidos no verão. No ano passado, as vendas nessa estação do ano subiram cerca de 200%, de acordo com Mariana Noronha, sócia da Veroni.

“No trabalho remoto, a relação com a equipe fica menos humanizada. Alguns funcionários podem ter a sensação de que fazem um trabalho menos importante, o que não é verdade”, afirma Noronha.

Em um primeiro momento, os seis funcionários do setor administrativo da Veroni poderão escolher trabalhar em casa um dia da semana.

Na decisão do modelo mais adequado para o retorno ao escritório, gestores podem comparar os números de produtividade da empresa com dados específicos do setor de atuação, diz Alexandre Slivnik, vice-presidente da ABTD (Associação Brasileira de Treinamento e Desenvolvimento).

Cifras maiores ou menores do que as da concorrência podem indicar que o modelo remoto está dando certo ou que o trabalho presencial ainda é a melhor alternativa.

Antes de voltar ao escritório, as empresas devem se certificar de que tomaram cuidados para minimizar os riscos de contaminação. Ainda não há consenso, mas a Covid-19 pode ser caracterizada pela Justiça como doença ocupacional, alerta Paulo Sergio João, professor de direito do trabalho da PUC-SP e da FGV.

O distanciamento social entre os funcionários é uma preocupação da empresa de tecnologia BHC Sistemas, que estabeleceu rodízio para os 30 colaboradores no escritório de 180 metros quadrados.

Adalberto Bem Haja, fundador da BHC Sistemas, no escritório da empresa, em São Paulo
Adalberto Bem Haja, fundador da BHC Sistemas, no escritório da empresa, em São Paulo - Gabriel Cabral/Folhapress

A empresa adotou uma plataforma em que os profissionais reservam no máximo 15 postos de trabalho com antecedência, evitando a aglomeração. Após o uso de um ambiente, uma notificação é disparada para a equipe de limpeza fazer a higienização do local.

“Entro na plataforma e sei quem está em cada ambiente. Assim, garantimos a boa execução do protocolo de segurança”, diz Adalberto Bem Haja, fundador da BHC Sistemas.

A experiência com a plataforma foi tão bem sucedida internamente que a empresa passou a comercializá-la. No ano passado, registrou faturamento de R$ 6 milhões, 25% a mais do que em 2019.

Pesquisa da consultoria PwC mostra que 79% das empresas devem manter ou implementar o trabalho remoto nos próximos meses, e 68% das companhias planejam adotar o modelo híbrido.

A consultoria de qualidade e engenharia de software Yaman já adotava o modelo híbrido antes da pandemia. Com a crise, implementou o que chama de “work anywhere” (escritório em qualquer lugar, na tradução livre).

Segundo o presidente da empresa, Andrey Coelho, hoje a Yaman tem funcionários em 11 estados do país. “Ganhamos com a diversidade cultural e criatividade da equipe", diz.

Com a decisão de ir ou não para o escritório a critério dos próprios funcionários, o retorno ao trabalho presencial acontece a passos lentos. O menor fluxo de pessoas permitiu que a Yaman devolvesse metade do espaço alugado.

“Não queremos nos desfazer do escritório, mas nosso espaço físico mudou de propósito. Se tornou mais um ponto de encontro”, diz Coelho.

O presidente da consultoria de qualidade e engenharia de software Yaman, Andrey Coelho, no escritório da empresa, em Barueri (SP)
O presidente da consultoria de qualidade e engenharia de software Yaman, Andrey Coelho, no escritório da empresa, em Barueri (SP) - Karime Xavier/Folhapress

Na consultoria de recursos humanos NewValue, a volta ao escritório não será obrigatória, mas funcionários imunizados contra o coronavírus terão a estrutura física à disposição.

"No pré-pandemia, tínhamos colabores que levavam duas horas para ir ao escritório e mais duas para voltar. No home office, a qualidade de vida aumentou. Percebemos também aumento de produtividade", diz Marco Haidar, diretor-executivo da NewValue. A empresa também devolveu uma parte do espaço alugado durante a pandemia, diminuindo de 10% a 15% o valor do aluguel.

Já a FreteBras, plataforma online de transporte de cargas, decidiu adotar o sistema home office de forma permanente. O espaço físico foi devoldido e a economia com o aluguel convertida em benefícios para os funcionários, segundo Bruna Vilella, gerente de recursos humanos da FreteBras.

"Entre as medidas conseguimos aumentar nosso vale refeição, agregamos no plano de saúde a coparticipação dos dependentes e implementamos benefícios de auxílio para o home office", diz Vilella. "Dessa forma, ganhamos abertura para atrair talentos de outros estados".

Hoje há mais empresas que trabalham de forma totalmente remota, mas se desfazer do ponto físico pode ser um tiro no pé, segundo Fernando Moulin, professor do master em gestão da experiência do consumidor da ESPM e parceiro de negócios da Sponsorb, consultoria de performance.

“Muitas empresas se precipitaram. Hoje observamos fadiga do Zoom, pessoas com dores lombares e a miopia explodindo”, diz Moulin.

Ele lembra que mesmo companhias inovadoras do Vale do Silício (EUA), ainda que mantenham a flexibilidade, descartam o trabalho remoto em tempo integral.

As empresas também precisam ouvir os colaboradores. “Se a companhia implementar uma norma autocrática, pode perder grandes talentos”, diz Slivnik, da ABTD.

A depender dos trabalhadores, o modelo híbrido prevalecerá. Estudo da WeWork e da WorkPlace Intelligence, empresa de consultoria de RH, feito nos EUA, indicou que 95% dos funcionários desejam combinar as atividades em casa e no escritório.

Em muitas empresas, entretanto, o escritório nunca mais será o mesmo. Durante a pandemia, a fintech de crédito Capitalz decidiu criar uma "casa-escritório" para preservar a união da equipe ao mesmo tempo em que mantém o home office.

O valor que era gasto com o aluguel de uma sala pequena em um centro comercial passou a ser destinado para o aluguel de uma casa de 500 metros quadrados, com sala de reunião, escritório, academia, garagem, quartos, banheiros e cozinha, além de área externa com quintal e churrasqueira.

"Percebemos que, juntos, conseguimos produzir melhor e economizar ao mesmo tempo. Somamos o valor do aluguel de cinco funcionários e vimos que dava para alugar uma casa grande em um bairro bem localizado de Florianópolis", diz Bruno Vieira, fundador da Capitalz.

Cinco dos 15 funcionários da empresa moram na casa-escritório. A média de idade é de 22 anos. "Criamos um vínculo horizontal e aumentamos a proximidade da equipe, mas a principal vantagem foi o ganho na qualidade de vida", diz Vieira.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.