Descrição de chapéu Dia da Consciência Negra

Feiras literárias impulsionam editoras que priorizam autores negros

Empreendedores negros frequentam eventos para ampliar visibilidade e atrair mais leitores e escritores

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Participar de eventos é uma das principais estratégias de empresários do ramo editorial que, diante da falta de representatividade no mercado de livros, dedicaram seus negócios às obras escritas por pessoas negras. Assim, suas editoras alcançam mais leitores, atraem autores e ampliam a visibilidade.

Criada em 2018, a Editora Kitembo participa de até cinco feiras por mês, das quais obtém a maior parte de sua receita. Com mais eventos presenciais, a expectativa é terminar o ano faturando R$ 80 mil ante R$ 52 mil em 2021, diz o editor Israel Neto, 35, que abriu a empresa para incentivar autores negros a atuar no campo da literatura fantástica.

"As feiras são fundamentais e também dá certo quando vamos em eventos não literários. Na internet, é preciso investir muito para ser visto", diz.

Retrato de Israel Neto, um homem negro, careca, com barba preta e curta; ele usa óculos de grau com armação preta e camiseta preta; com uma das mãos, ele segura três livros de sua editora, a Kitembo: 'Dadá e o Garfo Mágico', 'Omí Ìpalolo: Águas Silenciosas' e 'Crianças nas Sombras', todos com capas coloridas e ilustradas com personagens negros
O escritor e editor Israel Neto, fundador da Editora Kitembo, negócio que se dedica a publicar literatura fantástica - Jardiel Carvalho/Folhapress

Os livros da Kitembo também são encontrados no ecommerce próprio, em marketplaces e em livrarias voltadas à literatura negra e periférica. Até agora, a editora já publicou 13 títulos de 39 autores.

Neste mês, a Kitembo está na segunda edição da Expo Internacional da Consciência Negra, realizada em São Paulo até este domingo (20), e estará na Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), na qual lançará a fantasia "Omí Ìpalolo: Águas Silenciosas" e uma coletânea de quadrinhos afrofuturistas.

Um dos desafios desses negócios é compor o portfólio de autores, diz Fábio Mariano Borges, professor do mestrado em comportamento do consumidor da ESPM.

Fui revisora de texto, preparadora, editora e coordenadora editorial de uma das principais editoras de São Paulo. Quando completei 20 anos de mercado, percebi que nunca tinha trabalhado com um autor negro

Luciana Soares da Silva

fundadora e CEO da Aziza Editora

"Eles existem, mas até então não tinham espaço. É preciso buscá-los e chamá-los, porque muitos não acreditam na possibilidade de publicar."

Para atrair leitores, Borges sugere estimular o público, independentemente de sua cor ou raça, a se comprometer com a leitura de livros de autoria negra. "Os editores precisam utilizar todos os recursos para se conectar com as pessoas. Tem que estar no TikTok, nos eventos e nas faculdades, para mostrar quão relevante é ler essas obras."

Como bibliotecário, o editor Vagner Amaro, 45, tinha dificuldade para encontrar títulos de escritores negros contemporâneos. Após pesquisar o mercado, fundou a Editora Malê em 2015 com o objetivo de equilibrar o cenário.

"Percebi que boa parte desses escritores publicava de forma independente. As obras eram vendidas pelos próprios autores, e eles não eram muito convidados para feiras."

Hoje, a editora deve encerrar o ano com 140 títulos e cerca de 200 escritores no catálogo —alguns finalistas do 64º Prêmio Jabuti, como Sandra Menezes e Eliana Alves Cruz .

Neste ano, a Malê esteve na Flup (Festa Literária das Periferias, no Rio de Janeiro), na Flipelô (Festa Literária Internacional do Pelourinho) e na Bienal do Livro da Bahia.

Além disso, Amaro atribui a expansão da Malê, que cresce 30% a cada ano, à estruturação da loja online desde o início, à parceria com livreiros que vão a eventos, à divulgação de lançamentos pelas redes sociais —são cerca de 20 novas obras por ano— e à presença em livrarias.

"Se a grande não quer, procuramos a pequena. Há um movimento do mercado para revigorar as livrarias de rua, então hoje não dependemos tanto das grandes redes."

Para Jézio Gutierre, diretor-presidente da Fundação Editora da Unesp, vender em livrarias especializadas e em lojas virtuais é fundamental para as pequenas e médias editoras, já que os leitores procuram as obras nesses canais.

Fundada em 2019, a Aziza Editora usa essas estratégias para distribuir seus sete títulos. Com isso, registrou faturamento de R$ 260 mil em 2021.

A empresa nasceu concentrada no universo infantil, mas investe na expansão —na Flip, lançará o livro "Ódio", do poeta Cizinho Afreeka, para adultos. Seja qual for o leitor, a fundadora e CEO Luciana Soares da Silva, 45, evita selecionar textos que abordem apenas o racismo.

Foto mostra Luciana sentada sobre tapetes redondos de tricô, nas cores azul, rosa e amarelo; atrás dela, há uma estante em formato de meia-lua repleta de livros; Luciana é uma mulher negra, com cabelo black power preto; ela sorri, veste camiseta e saia brancas, e segura um livro infantil
A pesquisadora e contadora de histórias Luciana Soares da Silva, fundadora e CEO da Aziza Editora - Arquivo pessoal

"Não quero publicar títulos que trazem personagens negros em contexto de dor, porque é contra esse estereótipo que luto. Para os livros infantis, busco o encantamento."

Em duas décadas de atuação, Silva foi revisora de texto, preparadora, editora e coordenadora, mas não tinha trabalhado com escritores negros antes da Aziza.

"Faço questão de ir aos eventos. Gosto de falar que tenho mais de 20 anos de mercado não para dar carteirada, mas porque sou uma mulher negra. Quando falo que tenho uma editora, tem gente que arregala os olhos, porque não vê pessoas como eu nesse lugar."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.