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12/01/2012 - 03h30

No Haiti, a inflexibilidade política atrapalha a recuperação

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BERNICE ROBERTSON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Depois de sobreviver ao pior terremoto acontecido no Hemisfério Ocidental, muitos haitianos viam 2011 como um ano de esperança e recuperação.

Mas as esperanças iniciais de melhora no país que enfrenta problemas de pobreza e restrições à democracia terminaram destruídas por um cenário político de hostilidade impiedosa e pelas instituições deficientes.

Quando o presidente Michel Martelly assumiu, em maio, depois de uma eleição complicada que ocupou as atenções do país ao longo do primeiro ano de recuperação pós-terremoto, os haitianos celebraram, com razão, a virada de uma página em sua história.

A posse de Martelly foi a primeira vez que um presidente haitiano transferiu o poder a um candidato oposicionista eleito, e as promessas de Martelly quanto ao crescimento econômico rápido e reformas no setor de segurança pareciam atender às amplas necessidades de segurança física e financeira do país.

Com a chegada do segundo aniversário do terremoto, muitos haitianos continuam à espera de boas notícias quanto à reconstrução, empregos, habitação, educação e segurança.

A mensagem de Martelly -a de que os haitianos terão de um dia retomar o controle de sua reconstrução e desenvolvimento, hoje comandados por agências assistenciais e doadores internacionais- conta com apoio no exterior. E seu plano econômico depende do investimento estrangeiro, e não da assistência, como estímulo sustentável à economia haitiana.

Mas 2011 também foi um ano de incerteza e frustração, no qual os haitianos tiveram de enfrentar instituições demolidas e um ritmo anêmico de progresso político. O governo praticamente se paralisou durante os cinco meses de impasse que transcorreram até a seleção de um primeiro-ministro.

O Legislativo só confirmou o terceiro candidato proposto por Martelly, o médico Garry Conille, em outubro.

Martelly conseguiu indicar um juiz para o supremo tribunal, posto que estava desocupado desde 2004, mas a hostilidade entre seu governo e os legisladores bloqueou a indicação de integrantes e a constituição do Conselho Supremo do Poder Judiciário (CSPJ), que supervisionará melhoras muito necessárias na Justiça e permitirá que o Judiciário exerça seu papel no sistema de equilíbrio entre os poderes em um Haiti democrático.

Se os líderes haitianos continuarem a dividir as benesses do poder entre seus colaboradores mais próximos, 2012 trará novos problemas.

Uma coabitação difícil entre as instituições locais, provinciais e centrais, bem como a mão pesada com que Martelly supostamente trata seus oponentes certamente bloquearão a reconstrução do Estado. Ainda que as políticas sociais do presidente tenham mérito, uma reconstrução viável não será possível enquanto ele não mudar seu esquema de jogo político.

Martelly tem a oportunidade de se promover como líder nacional e democrático, e adquirir a confiança dos legisladores para permitir que isso se concretize.

Acordo prévio quanto a questões prioritárias, como o orçamento nacional haitiano e as emendas constitucionais votadas em maio, sinalizaria que a coalizão do presidente está disposta a governar tendo em mente os interesses de todo o país, garantindo uma reconstrução de maior sucesso em longo prazo.

A discussão aberta do orçamento nacional promoverá maior transparência, permitirá uma melhor definição de prioridades e garantirá recursos adequados.

O destino da Comissão Interina de Reconstrução do Haiti (IHRC) também precisa ser resolvido. Criar uma nova entidade só retardaria o progresso. O governo deve buscar aprovação parlamentar à renovação da IHRC, proposta por Martelly, e elevar a participação haitiana, apontando seus principais ministros como representantes do Executivo do país.

Isso tornaria o governo parte da estrutura e ajudaria na evolução de uma estrutura de gestão plenamente haitiana.

Nas próximas semanas, deve haver debate transparente em torno da realização das eleições municipais e provinciais, já muito atrasadas, bem como sobre a eleição parcial para o Senado que deve acontecer em maio, a fim de conter as tendências antidemocráticas e evitar maior instabilidade institucional.

Deve ser constituído um conselho eleitoral confiável para fiscalizar o processo. O sucesso da eleição não depende de esse conselho funcionar de modo provisório ou permanente, e sim do processo político necessário a formar um conselho de ampla aceitação, capaz de organizar um processo justo que resulte em eleição confiável.

O caminho mais curto para a criação de um conselho eleitoral permanente está nas emendas constitucionais aprovadas pelo Legislativo em maio mas cuja publicação foi bloqueada por erros de tramitação.

O Executivo e o Legislativo precisam chegar a acordo para remover os obstáculos à entrada em vigor das novas leis. Apontar os integrantes do CSPJ é necessário para que o Judiciário desempenhe papel independente na nomeação do conselho eleitoral permanente.

O presidente Martelly precisa cumprir sua promessa e o Legislativo tem de apoiá-lo para que as indicações judiciais pendentes se tornem realidade.

Apenas democracia efetiva em todos os níveis de governo é capaz de fomentar a reconstrução duradoura e a segurança que os haitianos merecem. 2012 será um ano decisivo: empregos, saúde, educação, habitação e segurança estarão em jogo enquanto o presidente Martelly luta para derrotar o unilateralismo político.

Bernice Robertson é analista sênior do International Crisis Group para o Haiti

TRADUÇÃO DE PAULO MIGLIACCI

 

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