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01/04/2013 - 03h50

Praça Tahrir, no Egito, vira zona de alto risco para as mulheres

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MAYY EL SHEIKH
e DAVID D. KIRKPATRICK
DO "NEW YORK TIMES"

CAIRO - O número de mulheres vítimas de agressões sexuais e estupros em uma única praça pública do Cairo tornou-se grande demais para ser ignorado. Por isso, islamitas conservadores da nova elite política do Egito se enfureceram -com as mulheres.

O general da polícia, parlamentar e islâmico conservador Adel Abdel Maqsoud Afifi comentou: "Às vezes, uma moça contribui 100% para seu próprio estupro".

O aumento das agressões sexuais nos últimos dois anos e a disputa decorrente sobre a quem deve ser atribuída a culpa estão entre os problemas que acometem o Egito no momento em que o país procura se reinventar, depois de jogar uma ditadura por terra.

Num primeiro momento, a revolução egípcia prometeu reabrir o espaço público às mulheres. Homens e mulheres protestaram lado a lado e pacificamente na praça Tahrir durante os emocionantes 18 dias e noites que resultaram na deposição do ditador Hosni Mubarak.

Minutos após a saída de Mubarak, contudo, um grupo agrediu sexualmente a jornalista Lara Logan, correspondente de uma rede de televisão americana.

Enquanto os protestos continuam, os ataques vêm se tornando mais violentos e ousados. Hoje o lugar que é o centro simbólico da revolução, a praça Tahrir, virou uma zona proibida para mulheres, especialmente de noite.

No dia 25 de janeiro, quando o Egito celebrou o segundo aniversário da revolução e manifestantes protestaram contra o novo governo liderado por islâmicos, uma onda extraordinária de ataques sexuais -pelo menos 18 foram confirmados por grupos de defesa dos direitos humanos- chocou o país, chamando a atenção do presidente Mohamed Mursi e de diplomatas ocidentais.

Mohamed Abd El Ghany - 25.jan.2013/Reuters
Mulheres protestam na praça Tahir no segundo aniversário do início das manifestações que derrubaram Hosni Mubarak
Mulheres protestam na praça Tahir no segundo aniversário do início das manifestações que derrubaram Hosni Mubarak

A jornalista Hania Moheeb, 42, foi uma das primeiras vítimas a vir a público para denunciar o que sofreu naquele dia. Numa entrevista à televisão, contou que vários homens a cercaram, arrancaram suas roupas e a violentaram durante 45 minutos. Todos os homens gritavam que estavam tentando salvá-la.

Seis mulheres foram hospitalizadas naquele dia devido aos ataques sexuais. Uma delas foi esfaqueada na área genital. Outra teve que ser submetida a uma histerectomia. Depois disso, vítimas de outros ataques sexuais na praça Tahrir e em seus arredores nos últimos dois anos também fizeram denúncias.

Yasmine Al Baramawy contou que, durante uma manifestação pública em novembro passado, ela e uma amiga foram cercadas por dois grupos diferentes de agressores. Alguns diziam que as estavam protegendo dos outros, mas ao mesmo tempo participavam do ataque. Eles usaram facas para cortar a maior parte das roupas de Baramawy e então a prenderam, seminua, sobre o capô de um carro. Eles continuaram a torturá-la durante todo o trajeto até um bairro vizinho, onde moradores intercederam para salvá-la. "Disseram às pessoas que eu estava com uma bomba sobre o abdome, para impedir as pessoas de virem me resgatar", contou Baramawy.

Os ataques chamam a atenção para o fracasso do governo do presidente Mursi, da ala política da Irmandade Muçulmana, em restaurar a ordem social. As declarações de seus aliados islamitas culpando as mulheres pelos ataques intensificaram o constrangimento.

Pakynam al-Al Sharkawy, assessora política do presidente e a mulher de mais alto escalão no governo de Mursi, qualificou as declarações como "totalmente inaceitáveis".Ela atribui os ataques à deterioração generalizada da segurança, ao clima de violência crescente nas ruas e também à recusa dos manifestantes em deixar a polícia entrar na praça, desde a revolta contra Mubarak. "Os manifestantes insistem em impedir a entrada de seguranças na praça, mesmo para dirigir o tráfego", disse a assessora.

Até agora, a única medida tomada pelo governo Mursi para fazer frente ao problema foi redigir uma lei que criminaliza o assédio sexual.

Algumas mulheres estão encarando sua segurança como tarefa a seu próprio cargo. Numa passeata para chamar a atenção aos ataques sexuais, várias mulheres ergueram as mãos segurando facas. "Não se preocupem comigo", disse a advogada Abeer Haridi, 40. "Estou armada."

Alguns islâmicos ultraconservadores condenaram as mulheres por falarem publicamente.

"Vemos essas mulheres falando como ogros: sem vergonha, sem educação, sem medo e sem feminilidade", declarou o pregador Ahmed Abdullah.

Hania Moheeb, a jornalista, considerou a declaração "escandalosa" e disse que a resposta vista até agora por parte de parlamentares islâmicos equivale à cumplicidade nos ataques.

"Quando pessoas comuns falam coisas desse tipo, a ignorância pode ser uma desculpa", disse a jornalista. "Mas, quando um parlamentar dá declarações desse teor, está incentivando os agressores."

 

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