Tóquio e Seul chegam a acordo sobre escravas sexuais coreanas
Hong Ki-won/Reuters | ||
Ex-escravas sexuais sul-coreanas assistem à reportagem sobre acordo entre Seul e Tóquio |
Um pedido formal de desculpas do primeiro-ministro japonês Shinzo Abe e uma compensação financeira de 1 bilhão de ienes (R$ 33 milhões).
Esses são os principais pontos do acordo acertado entre o Japão e a Coreia do Sul, nesta segunda (28), para solucionar o impasse histórico relacionado à escravização sexual de mulheres sul-coreanas pelas Forças Armadas japonesas até 1945.
O pacto poderá pôr fim a décadas de animosidade e desconfiança entre os dois países.
"O acordo marca o início de uma nova era entre Japão e Coreia do Sul", disse o ministro japonês das Relações Exteriores, Fumio Kishida.
Segundo Yun Byung-se, ministro sul-coreano, Seul considerará o acordo "final e irreversível", caso o Japão cumpra suas promessas. Em contrapartida, a Coreia do Sul deixará de criticar o Japão publicamente sobre o assunto e negociará com movimentos da sociedade civil para a retirada de uma estátua que representa as vítimas sul-coreanas instalada em 2011 em frente à embaixada japonesa em Seul. Semanalmente, são realizados protestos no local.
O fundo de 1 bilhão de ienes, que provirá do Orçamento nacional do Japão, será destinado a projetos de apoio às vítimas que ainda estão vivas. São 46 na Coreia do Sul, a maioria entre os 80 e 90 anos.
CRÍTICAS
O acordo, no entanto, foi criticado por algumas das vítimas e por movimentos da sociedade civil por não explicitar que as "mulheres conforto" foram usadas como escravas sexuais pelo Japão.
No anúncio à imprensa, Fumio Kishida disse: "A questão das mulheres conforto, com o envolvimento de autoridades militares japonesas na época, foi uma grave afronta à honra e à dignidade de muitas mulheres, e o governo japonês está dolorosamente ciente de suas responsabilidades sob esta perspectiva. Como primeiro-ministro do Japão, Abe volta a demonstrar suas mais sinceras desculpas e remorso perante a todas as mulheres que passaram por experiências dolorosas e imensuráveis e que sofreram feridas físicas e psicológicas incuráveis como mulheres conforto".
"O acordo não reflete a visão de uma ex-mulher conforto. Vou ignorá-lo completamente", disse Lee Yong-soo, 88, uma das vítimas, ao jornal americano "The New York Times". Segundo Lee, o Japão ainda não admitiu sua responsabilidade legal nem ofereceu reparações formais pelo crime de seus militares.
Ela também se opõe à retirada da estátua em homenagem às vítimas em frente à embaixada japonesa em Seul.
O Korean Council for the Women Drafted for Military Sexual Slavery in Japan, uma das principais organizações que representam ex-mulheres conforto na Coreia do Sul, classificou o acordo como "diplomaticamente humilhante". Segundo o grupo, o governo sul-coreano excedeu sua autoridade ao afirmar que o assunto está encerrado.
"MULHERES CONFORTO"
Estima-se que cerca de 200 mil mulheres —eufemisticamente chamadas de "mulheres conforto"— tenham sido escravizadas sexualmente por membros das tropas japonesas, principalmente na China e na península de Coreia, da década de 1930 até 1945. A península coreana esteve sob jugo colonial do Japão de 1910 a 1945.
Jung Yeon-Je/AFP | ||
Estátua em frente à Embaixada do Japão em Seul representa vítimas de escravização sexual |
O tema voltou à tona a partir de 2013, quando o premiê Abe aumentou os gastos militares do Japão pela primeira vez em 11 anos e defendeu o fortalecimento das Forças Armadas. A Constituição japonesa pós-Segunda Guerra Mundial havia estabelecido que o Japão só poderia atuar militarmente para sua autodefesa.
Em 2007, Abe chegou a dizer que não existiam provas de que o governo ou o Exército japonês tivesse sequestrado estrangeiras para escravização sexual. Depois, ele voltou atrás em suas declarações.
Por muito tempo, o Japão argumentou que a questão estava resolvida desde 1965, quando um tratado restaurou as relações diplomáticas entre os países e houve a transferência de US$ 800 milhões em ajuda econômica e empréstimos de Tóquio a Seul.
Também em 1993 houve um pedido de desculpas, emitido pelo então chefe de gabinete do governo japonês, Yohei Kono. No entanto, os sul-coreanos argumentavam que não houve reconhecimento das autoridades japonesas sobre as atrocidades cometidas no período colonialista. Também a compensação financeira, na ocasião, provinha majoritariamente de doações privadas, não do governo japonês.
No mês passado, Abe e a presidente sul-coreana, Park Geun-Hye, realizaram uma cúpula bilateral, na qual decidiram acelerar as negociações para solucionar o assunto.
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