Trump oferece benefício fiscal a empresa para que fique nos EUA
Em fevereiro, 1.400 trabalhadores de Indiana anteviram o olho da rua. A chefia avisou que, "para continuar competitiva", a empresa onde alguns deles batiam ponto há décadas se mudaria para o México.
Uma funcionária gravou a reunião. O vídeo viralizou e chamou a atenção de um pré-candidato à Casa Branca. Agora presidente eleito, Donald Trump voltou na quinta (1º) à Carrier, fabricante de ar-condicionado, no primeiro dia de sua "USA Thank You Tour" (turnê de agradecimento pela vitória).
Lá exaltou seu "feito": convencer a companhia a ficar nos EUA, e, com ela, mil postos locais. Em troca, ofereceu US$ 7 milhões de benefício fiscal ao longo de dez anos, fração dos US$ 65 milhões anuais que a Carrier economizaria com a transferência, segundo a CNN.
Jim Watson/AFP | ||
O presidente eleito nos EUA, Donald Trump |
Ao lado de Mike Pence, que governava o Estado antes de virar seu vice, e tietado por operários que o fotografavam, Trump falou grosso: "Companhias não vão mais deixar os EUA sem consequências".
A manobra, porém, levantou dúvidas se ele não exagera no marketing (não há como socorrer todas as empresas) e manda um recado errado ao mundo corporativo: basta pressionar que ele cede.
O porta-voz da Casa Branca, Josh Earnest, alfinetou: "Trump teria de fazer mais 804 anúncios desses para igualar a média de empregos criados no setor" na era Barack Obama.
Ao "Washington Post", o senador Bernie Sanders criticou a "solução Band-aid". Ao conquistar incentivos, a United Technologies, empresa-mãe da Carrier, "fez Trump de refém e ganhou", escreveu.
Para Sanders, o precedente é perigoso, já que outras companhias poderiam ameaçar sair do país, atrás de prêmios fiscais.
Trump concordou com Sanders, ao menos em fevereiro. Em campanha, ridicularizou agrados a empresas "fujonas". "Nossos Estados davam empréstimos com juros baixos. 'Tome um aí para [a companhia] ficar na Pensilvânia. Você nem tem que pagar.'"
Ele defende outras alternativas, como sobretaxar produtos fabricados no exterior. Já falou em até 45% para os "made in" México e China. Mas isso traria outros riscos, como retaliações comerciais e alta no preço final —como o consumidor reagiria a um iPhone mais caro por ter sido feito em casa, onde a mão de obra é mais cara, e os benefícios fiscais, menos atraentes?
SEM VOLTA
Para cada fábrica salva, outra afunda na próxima esquina. Quase que literalmente: a quilômetros da Carrier, a Rexnord também anunciou o México como nova morada, levando cerca de 300 empregos.
Em 2014, o Burguer King se mudou para o Canadá, e antes a belga InBev incorporou a americaníssima Budweiser. A própria marca Trump produz de gravatas a lustres no exterior.
"Obviamente, o governo não pode subsidiar toda companhia que ameaça levar empregos para fora", diz à Folha Timothy Slaper, diretor de análise econômica da Universidade Indiana. "Mas pode se valer de persuasão moral, pulso firme e alguns 'docinhos' [incentivos] para que que corporações reconsiderem."
Os EUA perderam cinco milhões de postos fabris desde 2000. E a concorrência internacional sequer é o maior problema. "Há muito trabalho perdido para a automação", afirma Robert Shapiro, da Universidade Columbia.
Segundo a BCG, consultoria de Boston, 25% de toda a produção industrial será robotizada até 2025.
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