'A União Soviética não fazia sentido sem a Ucrânia', diz Serhii Plokhy
O historiador ucraniano Serhii Plokhy, 59, ganhou notoriedade ao descrever minuciosamente o processo que levou a União Soviética a seu fim no ano de 1991.
Em "O Último Império" (Leya, 2015), ele conta, a partir da leitura de arquivos desclassificados como secretos na União Soviética e outras fontes, como foi solapada a tentativa de Mikhail Gorbatchov de salvar o país.
Nesta entrevista, o professor da Universidade Harvard (EUA) comenta fatores como a rebeldia da Ucrânia, que se voltam contra Moscou como há 25 anos.
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Serhii Plokhy, historiador e autor do livro "O Último Império", sobre o colapso da União Soviética |
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Folha - Como um arco narrativo, parece que muitas das questões de 1991 são as mesmas em 2016. Qual é sua avaliação da política de Putin sobre isso? Ele está apenas reagindo à expansão da Otan e usando a "carta do czar" para mostrar-se forte, ou há um plano estratégico maior quando ele fala da União Eurasiana e da tragédia do fim da União Soviética?
Serhii Plokhy - A expansão da Otan sempre foi uma justificativa, mas ela parou após a guerra de 2008 da Rússia com a Geórgia. Já na Ucrânia o gatilho foi o plano de Kiev de assinar um acordo com a União Europeia. As principais causas para a agressão russa estão na tentativa de criar a União Eurasiana a leste para competir com a China e, a oeste, com a Europa.
Em 1991, a União Soviética não fazia sentido sem a Ucrânia. Em 2014, a intenção de Moscou era a mesma. As nostalgias pela União Soviética e por ser uma grande potência foram secundárias, embora elas seja importantes para o pensamento da elite no Kremlin, que se formou no ápice do poder soviético, nos anos 1970.
Como o sr. vê o crescimento do nacionalismo de viés anti-globalizante? É uma janela de oportunidade para Putin? Os Estados Bálticos devem se sentir ameaçados?
Há uma revolta global anti-globalização, e Putin pode celebrar. Nesse novo clima internacional, a Rússia pode fazer ganhos na Europa Oriental, mas isso iria aumentar os problemas em sua economia.
No Báltico, no mínimo haveria sanções enormes, cortando mais ainda acesso a mercados e novas tecnologias. No longo prazo, a Rússia não pode competir efetivamente num mundo de Estados nacionalistas, onde o PIB chinês é 10 vezes maior que o seu e o americano, 15. É do interesse russo ter regras claras, e não enfrentar darwinismo nas relações internacionais.
A Rússia é talvez tão fraca economicamente como a União Soviética foi nos estertores, embora seja difícil comparar sistemas. E Putin tem um problema interno sério para 2018, já que não há successor claro. O sr. vê esses dois próximos anos como decisivos para o futuro do putinismo?
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Com as notícias de mudança na velha guarda do Kremlin, é fácil imaginar que o regime está entrando em uma nova fase. Isso é a situação lá dentro. Fora, o governo está envolvido em um grande jogo geopolítico, que mobiliza o eleitorado doméstico, mas que danifica a economia. Na situação atual, só uma pessoa pode manter a Rússia relativamente estável, e é Vladimir Putin. Hoje é difícil imaginar uma transição bem-sucedida de poder, mas o Kremlin já nos surpreendeu no passado, e pode surpreender de novo.
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