Após Obama, congressistas negros mobilizam-se para governo Trump

JESSE J. HOLLAND
DA ASSOCIATED PRESS, EM WASHINGTON

O Caucus Congressional Negro (CBC, na sigla em inglês), grupo que reúne os congressistas negros dos Estados Unidos, passou quase oito anos vivendo à sombra do primeiro presidente negro. Seus membros elogiavam as realizações do presidente Obama e, ao mesmo tempo, o pressionavam a fazer mais por sua base, maciçamente favorável à sua campanha e sua administração históricas.

Mas, com Obama prestes a deixar a Casa Branca em menos de duas semanas, deputados e senadores negros estão reavaliando o lugar que ocupam em Washington. Estão percebendo que vão voltar a ser alvo de atenção e a ser os políticos afro-americanos mais poderosos e visíveis na capital americana.

O presidente eleito, Donald Trump, enfrentará uma bancada negra maior e mais agressiva, que vai lutar "com um pouco mais força" pelas posições que defende, disse o deputado Danny Davis, democrata do Illinois e membro de longa data do CBC. "Sem Obama na Presidência, vamos nos posicionar com mais firmeza em relação à política do governo."

O deputado G.K. Butterfield, democrata da Carolina do Norte que está prestes a deixar a presidência do grupo, declarou: "As consequências são importantes demais; não podemos deixar de agir decisivamente".

Hoje há mais parlamentares negros que nunca no Congresso: 49 parlamentares afro-americanos, homens e mulheres, tomaram posse na terça-feira (3), incluindo a senadora democrata Kamala Harris, da Califórnia, apenas a segunda senadora negra que o país já teve. Também estão servindo no Capitólio a primeira senadora americana de origem indiana, 38 parlamentares hispânicos, incluindo a democrata Catherine Cortez Masto, do Nevada, a primeira senadora latina, e 15 americanos de origem asiática.

O CBC nunca teve uma relação perfeita com Obama, e, na primeira eleição presidencial dele, em 2008, vários de seus membros poderosos inicialmente apostaram em Hillary Clinton.

Parlamentares negros ajudaram a levar o maior número de eleitores afro-americanos na história recente a votar nas duas campanhas presidenciais de Obama; em 2012, os afro-americanos compareceram para votar em proporção maior que os brancos não-hispânicos (66,2% contra 64,1%). Mas os parlamentares negros se decepcionaram quando Obama não voltou tanta atenção quanto eles teriam desejado sobre questões importantes para sua base minoritária: a Justiça criminal e o policiamento, a representação de minorias na Suprema Corte e outros cargos de alto nível e o esforço para levar empregos e indústria às áreas rurais e os centros pobres de grandes cidades.

Crédito: Jonathan Ernst/Reuters O presidente Barack Obama concede primeira entrevista coletiva após vitória de Trump nas eleições americanas, em Washington
O presidente Barack Obama concede entrevista coletiva na Casa Branca em novembro

"Não levamos o presidente Obama a coincidir com nossos objetivos sempre. Precisamos pressionar os líderes a fazer seu trabalho. Eles não o farão por serem essencialmente bem-intencionados –precisam ser pressionados", explicou Julianne Malveaux, economista e autora do livro "Are We Better Off? Race, Obama and Public Policy" (Estamos em situação melhor hoje? Raça, Obama e política pública).

Membros do CBC disseram que percorreram uma corda bamba, querendo apoiar o primeiro presidente negro mas também promover suas próprias prioridades, que nem sempre pareceram ser prioridades para a Casa Branca de Obama.

"Há momentos em que você gostaria de ir mais longe do que a administração parece estar indo, mas, ao mesmo tempo, você quer dar o maior apoio possível a essa administração", disse Davis.

Hoje o Congresso e a Casa Branca estão sob controle republicano, e os parlamentares negros, a maioria dos quais é democrata, precisam descobrir uma maneira de simultaneamente fazer oposição à nova administração e o partido majoritário no Capitólio e trabalhar com eles.

"Estamos diante de um ambiente político e legislativo muito difícil, diferente de qualquer coisa que já vimos antes", disse Butterfield quando grupo se reuniu no Warner Theatre, na terça-feira passada para a cerimônia de posse dos novos parlamentares.

Com a saída de Obama, as atenções vão voltar a estar sobre o CBC, disse Frederick Harris, professor de ciência política na Universidade Columbia e diretor do Centro de Política e Sociedade Afro-Americanas da universidade. Com Trump como presidente, "o CBC vai se manifestar ainda mais abertamente do que fez na era de Obama, quando sua voz era reduzida pela Casa Branca de Obama e seus representantes, que repudiavam as críticas de que o presidente não estava dando atenção suficiente a questões raciais".

Todd Shaw, professor de ciência política na Universidade da Carolina do Sul, acha que Obama pode deixar o caucus em posição melhor do que o grupo ocupava antes de ele chegar à Presidência. Muitas pessoas, segundo ele, acharam que a eleição de Obama tinha assinalado o fim da política norteada pela raça e da necessidade de grupos como o CBC.

"É possível que se reconheça que ainda não estamos salvos, nem mesmo agora, depois de Obama", disse Shaw.

Tradução de CLARA ALLAIN

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.