Fim da política 'pegar e soltar' assusta brasileiros que migram aos EUA

PATRÍCIA CAMPOS MELLO
ENVIADA ESPECIAL A WASHINGTON

A política do "pegar e soltar", cujo fim foi anunciado nesta quarta-feira (25) pelo presidente Donald Trump, foi um dos principais motivos para a alta no número de famílias brasileiras emigrando ilegalmente para os EUA acompanhadas de filhos menores de idade.

A maioria dos brasileiros vem pelo chamado "sistema cai cai" —cruzam a fronteira e imediatamente se entregam à polícia. Isso porque não se deportam automaticamente crianças que entram nos EUA de forma ilegal.

Muitos pais ou mães viajam acompanhados de um filho menor de idade para evitar a deportação.

Pelo chamado "pegar e soltar", após a apreensão na fronteira, os imigrantes ficam em centros de detenção por períodos que vão de alguns dias a alguns meses.

De lá, o adulto é liberado com uma tornozeleira eletrônica, junto com o menor, e fica à espera de uma audiência com o juiz que decidirá seu caso, enquanto recebe visitas periódicas de um oficial de imigração.

Mas os tribunais de imigração estão sobrecarregados e as audiências podem demorar anos para acontecer.

"Mudou completamente o perfil dos brasileiros que vêm: dez anos atrás, eram pessoas sozinhas ou casais sem filhos; agora, são famílias, por causa da política do cai cai", afirma Liliane Costa, diretora executiva do Brazilian American Center, em Framingham.

COIOTES

Antes, muitos brasileiros vinham com visto de turista e simplesmente iam ficando, além do prazo permitido. Mas a taxa de recusa de visto americano para brasileiros saltou de 5,36% em 2015 (ano fiscal americano, que termina em setembro) para 16,7% neste ano fiscal.

Sem conseguir vistos, muitos brasileiros estão recorrendo aos coiotes. "Eles pagam R$ 45 mil para a máfia de coiotes, que os orienta a cruzar a fronteira e se entregar às autoridades de imigração."

Até setembro, o centro recebia duas famílias por semana. Agora, atende em média duas famílias por dia, vindas da fronteira do México.

A lei americana exige que crianças de países que não têm fronteira com os EUA sejam transferidas aos cuidados do Departamento de Saúde antes de serem encaminhados a um responsável, normalmente um parente, enquanto esperam que seu caso seja ouvido por um juiz.

A comunidade de brasileiros indocumentados nos EUA era de 140 mil (de um total de cerca de 1,4 milhão) em 2009. Com a crise financeira dos EUA em 2008, houve um êxodo de brasileiros. Mas com a situação econômica se deteriorando no Brasil desde 2014, muitos dos "retornados" voltaram aos EUA.

Nos dois últimos meses do ano passado, 940 brasileiros foram pegos após atravessar ilegalmente a fronteira americana, média de 15,4 por dia.

Trata-se de um crescimento de 73% em relação à média diária do ano fiscal de 2016, quando 3.252 brasileiros foram presos (8,9 casos/dia).

O ano fiscal de 2016 já havia registrado um aumento de 142% em relação a 2015, quando foram detidos 1.344 brasileiros.

"O maior perigo é que essas medidas vão aumentar o pânico na comunidade de brasileiros indocumentados, e eles vão deixar de procurar ajuda em casos de violência doméstica, problemas de saúde etc.", diz Heloísa Galvão, diretora do Grupo Mulher Brasileira.

No governo Obama, quase 3 milhões de ilegais foram deportados. "Mas eram só aqueles com ficha criminal ou que tinham deixado de comparecer a suas audiências; agora não sabemos qual vai ser o critério", diz Lídia Souza, diretora do New England Community Center.

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