Descrição de chapéu The New York Times

Após revogação de Trump, China deve liderar política climática mundial

EDWARD WONG
DO "NEW YORK TIMES"

O governo de Barack Obama passou anos suplicando, persuadindo e pressionando a China a comprometer-se a limitar o consumo de combustíveis fósseis, em um esforço para desacelerar os efeitos globais das mudanças climáticas.

O democrata e outras autoridades dos EUA consideravam crucial que tanto Pequim quanto Washington assumissem compromissos climáticos, na medida em que a China é a maior emissora mundial de gases estufa, seguida pelos EUA.

É provável que a dinâmica se inverta nos próximos anos. Quando Trump, na terça-feira (28), assinou um decreto que visa revogar muitas das políticas do governo Obama em relação às mudanças climáticas, os papéis das duas potências foram trocados.

Agora é muito mais provável que o mundo veja a China pressionando os EUA a honrar seus compromissos assumidos e procurar obedecer a letra e o espírito do Acordo de Paris, de 2015, embora Trump tenha assinalado que não pretende fazê-lo.

"Eles definiram a direção que pretendem seguir nos próximos cinco anos", disse, aludindo à China, a advogada sênior Barbara Finamore, diretora para a Ásia do Conselho de Defesa dos Recursos Naturais, com sede em Nova York.

"Está claro que a China pretende envidar todos os esforços para reduzir sua dependência do carvão e aumentar seu uso de energia renovável. A China quer assumir o papel dos EUA como líder climática e incluiu isso em seus planos quinquenais", ela ponderou, aludindo aos planos de desenvolvimento econômico traçados pelo governo chinês.

Mesmo antes da campanha presidencial do ano passado, Trump tinha dado declarações indicativas de negação das mudanças climáticas, tendo, entre outras coisas, dito que as mudanças climáticas são uma farsa criada pela China.

Ele também ameaçou retirar formalmente os Estados Unidos do Acordo de Paris. Desde sua eleição, em novembro, líderes chineses vêm assumindo a liderança na questão climática e exortando todos os países, incluindo os EUA, a cumprir seus compromissos climáticos.

A maior mudança no discurso se deu em janeiro, quando, no Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça, o presidente chinês, Xi Jinping, disse que o Acordo de Paris foi fruto de um esforço árduo e deve permanecer em vigor.

"Todos os signatários deveriam cumprir o acordo em lugar de afastar-se dele", disse Xi. "Essa é uma responsabilidade que precisamos assumir pelo bem das gerações futuras."

Outras autoridades chinesas em Davos reiteraram essa mensagem, entre elas o ministro da Economia, Nur Bekri, e executivos-chefes de estatais chinesas.

Em entrevista concedida antes da conferência climática recente em Marrakech, Chai Qimin, pesquisador que estuda as mudanças climáticas e assessor para políticas públicas, disse que as políticas adotadas em uma reunião recente do Partido Comunista mostram que a China "atribui importância sempre crescente à civilização ecológica e ao desenvolvimento verde".

"Todo o mundo está levando esta questão cada vez mais a sério", ele acrescentou.

Na quarta-feira (29) um porta-voz do Ministério do Exterior disse, em entrevista coletiva à imprensa em Pequim, que todos os países signatários do Acordo de Paris deveriam "honrar seus compromissos" e que a China cumprirá suas promessas, "independentemente de como possam mudar as políticas climáticas de outros países",

O jornal nacionalista estatal "Global Times" usou termos mais ásperos para criticar a administração Trump, dizendo que ela está "se esquivando descaradamente de assumir sua responsabilidade em relação à mudança climática".

"Washington tem a obrigação de dar um exemplo nos esforços da humanidade contra o aquecimento global, e o governo Trump tornou-se o primeiro governo de uma grande potência a iniciar ações contrárias ao Acordo de Paris", disse o jornal. "Ela está solapando a grande causa da humanidade, que é proteger a Terra, e isso é de fato irresponsável e altamente decepcionante."

O editorial também questionou a razão de a China estar fazendo concessões no consumo de combustíveis fósseis, ao mesmo tempo em que os EUA estão jogando suas promessas de lado: "Como a China, ainda subdesenvolvida, pode abrir mão de um espaço grande para o desenvolvimento, apenas para alimentar esses países ocidentais já tão ricos?"

PARTICIPAÇÃO CRÍTICA

A participação da China é crítica para os esforços globais com relação às mudanças climáticas. Com seu crescimento econômico e sua construção acelerada de infraestrutura, a China consome tanto carvão quanto todo o resto do mundo somado.

A queima de carvão, que está à base das indústrias energética, siderúrgica e de cimento no país, gera volumes enormes de dióxido de carbono, o principal gás causador do efeito estufa. Por isso ambientalistas e autoridades de todo o mundo dizem constantemente que a China precisa romper sua dependência do carvão.

Diferentemente dos EUA, porém, líderes e altos funcionários chineses vêm dizendo consistentemente que as mudanças climáticas constituem um problema sério e reconhecem a importância de mudar sua matriz energética, afastando-se das fontes de combustível fóssil.

E, devido à sua crise de poluição atmosférica, a China anunciou políticas em 2013 para limitar o consumo de carvão em seus três maiores centros populacionais. Mais recentemente, cientistas disseram que existe um ciclo perigoso em ação: padrões meteorológicos da mudança climática estão exacerbando a névoa de poluição.

"A China está reduzindo o consumo de carvão por causa de seus custos letais para a saúde humana e das altas emissões de carbono. O país pretende fazer a transição para as fontes energéticas do futuro, não do passado", disse Isabel Hilton, fundadora do site Chinadialogue, que publica informes sobre questões ambientais e políticas públicas. "O presidente Trump parece estar decidido a reforçar uma fonte energética do século 19, ao invés de investir na promessa do século 21."

Tradução de CLARA ALLAIN

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