Vizinhas, Constituinte chavista e Casa opositora têm convivência tensa

Crédito: Oscar González Grande/Folhapress O Palácio Federal Legislativo, em Caracas, sedia a Assembleia Constituinte e a Assembleia Nacional
O Palácio Federal Legislativo, em Caracas, sedia a Assembleia Constituinte e a Assembleia Nacional

SERGIO MORENO GONZÁLEZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM CARACAS

A ordem era clara: os deputados da Assembleia Nacional venezuelana não podiam entrar no Hemiciclo Protocolar do Palácio Legislativo. Nesta quarta (9), o salão amanheceu cercado por soldados da Guarda Nacional Bolivariana (GNB), que até colocaram uma parede de madeira no corredor para que ninguém entrasse.

A decisão foi tomada pela direção da Assembleia Nacional Constituinte (ANC), que fez na terça (8) sua primeira sessão nessa sala do Parlamento, onde aprovaram por unanimidade um decreto que proclama a subordinação de todos os órgãos do poder público à nova instância.

A ala sul do Parlamento se divide em duas salas principais: o Hemiciclo Protocolar e o das Sessões. Separados por apenas alguns metros, os salões serviram por décadas às duas Câmaras que integravam o Congresso (a de deputados e de senadores). Com a Constituinte de 1999, Hugo Chávez (1954-2013) transformou a Assembleia Nacional em unicameral.

Agora, os hemiciclos estão novamente divididos. Do lado esquerdo ficam os deputados da Assembleia Nacional, um espaço aberto para os parlamentares, funcionários e jornalistas.

Situação distinta vive o salão à direita, repleto de fotos gigantes do rosto de Chávez e vigiado por soldados da GNB, onde só é permitida a entrada dos constituintes.

Na véspera da instalação da ANC, a ex-chanceler Delcy Rodríguez adentrou a sede do Congresso para realizar os preparativos da cerimônia, acompanhada por oficiais da GNB.

"Isso foi outro abuso contra os 14 milhões de venezuelanos que votaram nas eleições de dezembro de 2015", disse o deputado Julio Borges, presidente da Assembleia, em referência ao pleito que deu à oposição o controle do Legislativo. Para os antichavistas, a convivência com a ANC não pode ser algo à força.

A coabitação entre as duas Assembleias não foi incluída na agenda de temas da oposição venezuelana. "Não temos nenhuma coexistência prevista com a Constituinte. Não tivemos contato com nenhum dos representantes do governo. O que o governo fez foi ocupar militarmente o Palácio", disse Stalin González, chefe do bloco parlamentar da coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática.

Crédito: Federico Parra/AFP Deputados se reúnem no Hemiciclo de Sessões, usado com plenário da Assembleia Nacional
Deputados se reúnem no Hemiciclo de Sessões, usado com plenário da Assembleia Nacional

A ocupação do Palácio teve um grande peso simbólico. É o que acredita Colette Capriles, analista político, para quem a sessão da Constituinte foi uma exibição de força de Nicolás Maduro.

"A mensagem de usurpar o Palácio se une com a lógica desafiadora que teve a Constituinte. O recado é que não há limites."

Para o chavista Hermann Escarrá, integrante da ANC e um dos que escreveram a Constituinte de 1999, devem ser tomadas as decisões necessárias para regular a ação do resto dos Poderes, subordinados à autoridade máxima da ANC.

"O país exige que coloquemos ordem naqueles Poderes que de modo hostil se insubordinaram e deram as costas ao Estado de Direito e à democracia", afirmou.

À tensão entre deputados e constituintes se soma a ação dos "coletivos" chavistas, grupos de civis que todo dia controlam as portas de entrada do Parlamento.

Na terça (8), houve agressões a jornalistas, e a entrada dos membros da Assembleia Nacional foi impedida. Nesta quarta (9), tanto deputados quanto repórteres puderam circular pelos salões do Congresso —exceto, é claro, naquele reservado aos constituintes.

Crédito: Editoria de Arte/Folhapress
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