Alemanha usa lições do caso Baader-Meinhof contra o terrorismo hoje

Crédito: 31.out.1968/Associated Press Andreas Baader, um dos fundadores do grupo Baader-Meinhof, ao lado de Gudrun Ensslin num tribunal de Frankfurt, na Alemanha. Em outubro de 2007 vai fazer 30 anos que os líderes do grupo Baader-Meinhof cometeram suicídio em suas celas em penitenciárias alemãs, encerrando uma temporada anárquica de seqüestros e assassinatos que veio a ser conhecida como o "outono alemão". Andreas Baader, left, and Gudrun Ensslin joke during their trial in a courtroom in Frankfurt, Germany on Oct. 31, 1968.
Andreas Baader e Gudrun Ensslin durante seu julgamento em um tribunal em Frankfurt

FREDERICK STUDEMANN
DO "FINANCIAL TIMES"

Em um país que tem aniversários históricos em número mais que suficiente, seria fácil deixar passar um que acontece esta semana na Alemanha.

Quarenta anos se passaram desde que uma intensa campanha de terror chegou ao seu clímax sangrento no Deutsche Herbst, ou Outono Alemão, um dos momentos que mais definiu a história recente do país. As consequências são sentidas até hoje.

No período de dois dias, um avião de passageiros da Lufthansa, sequestrado, foi libertado depois de ser invadido por forças especiais no aeroporto de Mogadício; três dos líderes da gangue Baader-Meinhof cometeram suicídio num presídio alemão de alta segurança; uma quarta líder sobreviveu, mesmo depois de apunhalar-se várias vezes no peito; e o presidente sequestrado da maior associação comercial da Alemanha foi assassinado, sendo seu corpo jogado no porta-malas de um carro abandonado.

O sequestro do executivo e do avião fizeram parte de uma tentativa de chantagear o Estado para que libertasse os terroristas encarcerados, liderados por Andreas Baader e Gudrun Ensslin.

"Para quem acompanhou aquela época, foi algo comparável a um 11 de setembro de 2001 alemão", recordou o jornalista Stefan Aust, autor de "The Baader-Meinhof Complex", um dos melhores relatos daquela era, hoje atualizado. "Foi uma ameaça direta e enorme à segurança interna do país."

O Outono Alemão foi o momento culminante de uma série de ataques terroristas ao longo de 1977 que incluíram os assassinatos do procurador-geral federal, do presidente de um dos maiores bancos alemães e de integrantes dos serviços de segurança.

Foi o ápice da expressão mais extrema e violenta da revolta contracultural dos anos 1960, que deu lugar à Facção do Exército Vermelho, para dar à gangue Baader-Meinhof seu nome "oficial".

A resposta do Estado foi contundente. Na fase mais intensa do Outono Alemão, o país chegou perto de algo que parecia um estado de emergência.

O chanceler Helmut Schmidt se mostrou inflexível diante das exigências do grupo, mesmo sabendo que pessoas poderiam ser mortas em consequência da recusa. A tática funcionou —e não provocou uma sublevação das massas, como o grupo esperava que acontecesse.

Comparada ao que aconteceu desde então, a escala da campanha da gangue Baader-Meinhof pode parecer modesta. O movimento, que chegou a ter no máximo entre 40 e 60 membros ativos, nunca chegou a atrair as massas.

Seus integrantes vinham principalmente daquele berço familiar de ativismo da extrema esquerda que era a burguesia que se autorrepudiava. As pelo menos 33 pessoas mortas ao longo de seus 28 anos de campanha de chamada "guerrilha urbana" representam uma parte ínfima do número de mortos em outras campanhas de terror.

Em 1998, quando os membros sobreviventes do grupo declararam o fim do "projeto", o espírito da revolução já não passava de uma memória muito distante. Fato revelador é que mais ou menos na mesma época surgiu uma grife de moda com o nome propositalmente irônico de Prada Meinhof.

Hoje, alguns poucos integrantes da gangue ainda estão na prisão, enquanto outros concedem entrevistas ocasionais à mídia. Alguns partiram em suas "longas marchas" próprias, abrangendo todo o espectro ideológico. Por exemplo, Horst Mahler, um dos integrantes originais do grupo Baader-Meinhof, hoje é um conhecido extremista de direita.

Crédito: Paulo Wagner/AFP *** FOTO ALTA*** The former Lufthansa machine "Landshut" is parked and unfunctioning at the the airport in Fortaleza, Brazil, 31 January 2017. She was last used as a transport machine for the Brazilian airline TAF. Photo: Paulo Wagner/ TMA Fortaleza/ DPA ORG XMIT: 99-284004 ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Avião que foi alvo de um sequestro do Baader-Meinhof ficou anos parado no aeroporto de Fortaleza

Mas o aniversário do Outono Alemão chamou atenção renovada para o grupo, que ganhou nova relevância no país no momento em que a Alemanha enfrenta a ameaça do terror islâmico.

O jornalista Michael Sontheimer, que já escreveu extensamente sobre a gangue, disse que a política de segurança pública alemã de hoje se inspira fortemente nos anos 1970.

Algumas das lições aprendidas naquela época e que são aplicadas hoje são evitar reações excessivas e concentrar-se, em vez disso, sobre um trabalho policial persistente e habilidoso, incluindo técnicas de espionagem inteligente.

Alguns observadores chegaram a se perguntar se há outras semelhanças entre hoje e aquela época, quando jovens alemães revoltados foram ao Oriente Médio para fazer treinamento para cometer atos de terrorismo em seu país.

Aust identifica uma diferença crucial na natureza da ameaça terrorista hoje. Havia algo de familiar nos membros da Facção do Exército Vermelho.

Os cartazes com as imagens dos terroristas procurados, com fotos tipo passaporte de pessoas que lembravam estudantes jovens emoldurados em vermelho, eram vistos comumente na Alemanha dos anos 1970 e 1980.

"Sabíamos tudo sobre eles —seus nomes, até seus boletins escolares." O mesmo não pode ser dito hoje.

Tradução de CLARA ALLAIN

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