Trump testa popularidade entre evangélicos após acusação de racismo

Crédito: Joe Raedle - 12.jan.2018/Getty Images/AFP A pastora Lorna Shuford participa de ato contra Trump com cartaz com a frase "Trump é preconceituoso"
A pastora Lorna Shuford participa de ato contra Trump com cartaz com a frase "Trump é preconceituoso"

ESTELITA HASS CARAZZAI
DE WASHINGTON

O presidente Donald Trump quer recuperar o terreno perdido.

Nesta sexta (19), em discurso a milhares de evangélicos que farão uma marcha em Washington contra o aborto, ele irá testar a própria popularidade entre cristãos, importante fatia do seu eleitorado e que foi impactada pelo comentário dele sobre "países de merda", na semana passada.

Desde a divulgação dessa fala, diversos líderes religiosos vieram a público condenar a referência pejorativa do presidente a países africanos e centro-americanos, de onde vem parte do fluxo migratório que Trump tenta reduzir.

"São meus irmãos em Cristo", disse o pastor Thabiti Anyabwile, líder de uma igreja evangélica em Washington. "Sou um pastor, não um político. Mas não posso respeitar esse tipo de comentário."

Igrejas com grande afluência de afro-americanos foram as mais assertivas na condenação às declarações do republicano —principalmente porque elas foram dadas às vésperas do feriado de Martin Luther King Jr., pastor e ativista dos direitos civis, celebrado na última segunda-feira (15).

"A melhor forma de honrar o legado do reverendo King é defender os valores que ele defendia. O maior deles era o amor, e não há nada de amoroso nessa fala", afirmou o pastor batista Maurice Watson, durante culto em Washington no domingo (14).

No meio dos fiéis da congregação, de maioria negra, estava o vice-presidente Mike Pence —que enrubesceu ao ouvir o sacerdote, segundo o relato dos presentes. Watson chamou a fala de Trump de "desrespeitosa e desumana".

O uso por Trump da expressão chula foi relatado por legisladores que compareceram a uma reunião sobre a reforma imigratória, na última quinta (11). A Casa Branca, inicialmente, não confirmou nem negou o teor da intervenção dele. Diante da repercussão, Trump afirmou que não usou o termo "países de merda", mas sim outras "palavras fortes".

DIVISÃO

A negativa tardia de Trump convenceu alguns de seus eleitores conservadores.

"Ele não disse isso. Vocês acreditam no que afirmam os democratas e a mídia? Eles abastecem a agenda satânica, de mentiras e falsidades", afirmou o professor e evangélico Rhettman Alexander, em fórum numa rede social.

Mas muitos cristãos se disseram envergonhados. "Vivo em um tempo constrangedor para ser missionária americana na África", comentou Karen Gray, 48, que nasceu em Massachusetts e mora em Burkina Fasso.

Trump foi eleito com 58% dos votos dos protestantes americanos, segundo pesquisa do Pew Research Center —percentual que sobe para 81% entre evangélicos brancos.

Ao longo do primeiro ano de governo, porém, ele viu sua aprovação baixar no segmento. De acordo com o Pew, ela encolheu de 78% em fevereiro para 61% em dezembro de 2017 (ainda bem mais do que os 32% aferidos entre a população geral).

Mas as recentes declarações do presidente podem pesar sobre sua aprovação entre evangélicos que dão suporte a ações missionárias na África.

"Há muitos cristãos perturbados com a forma como ele fala, em especial sobre imigrantes", disse à Folha o escritor e pesquisador Kent Annan, 45, filho de pastor e membro de uma igreja luterana na Flórida.

Annan viveu no Haiti como missionário durante dois anos e meio e já trabalhou com ações sociais em países como Uganda e Camboja.

Em sua igreja na Flórida, há um equilíbrio entre republicanos e democratas. Mas a balança pesou contra Trump depois dos comentários controversos.

"Muitas pessoas na igreja oram, fazem doações e dão suporte ao trabalho missionário. É natural que haja uma resposta", afirmou.

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