Descrição de chapéu The New York Times

Para time de hóquei sul-coreano, união com o Norte é um sacrifício

Crédito: Ahn Young-joon - 6.abr.2017/Associated Press Atletas das Coreias do Sul e do Norte posam juntas após amistoso de hóquei no gelo em Pyeongchang
Atletas das Coreias do Sul e do Norte posam juntas após amistoso de hóquei no gelo em Pyeongchang

MOTOKO RICH
SETH BERKMAN
DO "NEW YORK TIMES", EM TÓQUIO

A combativa equipe feminina de hóquei da Coreia do Sul trabalhou duro para conquistar o direito de desafiar adversárias maiores e mais experientes nos Jogos Olímpicos de Inverno que começam no próximo mês em Pyeongchang, na Coreia do Sul.

Depois de anos de esforço para construir união entre as jogadoras, incluindo uma dos EUA e outra americana naturalizada sul-coreana, a equipe sul-coreana está frustrada por de repente ser transformada em peão num drama geopolítico.

Em um gesto grandioso de diplomacia esportiva, os governos das duas Coreias concordaram na semana passada em apresentar um único time de hóquei feminino nos Jogos de Inverno.

Enquanto o governo sul-coreano vê a equipe intercoreana como uma base para as negociações que poderão desacelerar o programa nuclear da Coreia do Norte, as jogadoras do país dizem estar decepcionadas com a decisão de última hora de colocar no time jogadoras norte-coreanas.

"Todas nós tivemos de abandonar alguma coisa em nossa vida, mas vínhamos lutando na direção de um objetivo: jogar na Olimpíada", disse a goleira Shin So-jung ao jornal "Chosun Ilbo" na sexta-feira (19). "Suportamos tudo porque nos orgulhamos de representar nosso país. Por isso agora nos sentimos desoladas."

A equipe feminina de hóquei será o primeiro time coreano combinado a participar de uma Olimpíada. A última vez em que atletas das Coreias do Norte e do Sul jogaram no mesmo time foi durante um campeonato internacional de tênis de mesa e a Copa do Mundo Sub-20 de Futebol de 1991, em Portugal.

As Coreias também chegaram a um acordo no dia 17 para que seus atletas marchem juntos sob uma só bandeira na cerimônia de abertura em 9 de fevereiro.

Com o anúncio oficial no último sábado (20) de que 12 jogadoras norte-coreanas serão acrescentadas à equipe olímpica feminina, com três delas incluídas obrigatoriamente em cada partida, algumas atletas sul-coreanas temem jogar menos tempo ou ficar no banco em alguns jogos.

"É difícil porque as jogadoras conquistaram seus lugares e acham que merecem ir à Olimpíada", disse a treinadora do time, Sarah Murray, na semana passada. "As jogadoras disseram em junho para não as transformarem em uma declaração política e que elas apenas querem jogar", acrescentou Murray. "Eu concordo com elas."

POPULARIDADE

Na Coreia do Sul, críticas sobre a decisão do governo de apoiar uma equipe intercoreana minou os índices de aprovação do presidente Moon Jae-in, que apoiou a inclusão do Norte no hóquei.

Segundo a mais recente pesquisa Gallup, seu índice caiu para 67%, a marca mais baixa em 16 semanas. Pesquisas feitas na Coreia do Sul na última semana também mostraram que muitos entrevistados discordam da decisão de acrescentar as norte-coreanas à equipe olímpica.

Nas redes sociais e em abaixo-assinados entregues à Casa Azul, sede da Presidência, os sul-coreanos demonstraram simpatia às jogadoras de hóquei do país.

"Não acho que a vida das atletas deva ser sacrificada por um evento", escreveu um usuário do Facebook, Jaeeok Kim. Um abaixo-assinado contra a equipe intercoreana, apresentado no site da Casa Azul, conseguiu mais de 50 mil assinaturas.

A maioria das jogadoras ainda é adolescente, e várias delas lutaram contra lesões e suportaram longas viagens e um treinamento duro juntamente com a dura vergonha de grandes derrotas.

Com a equipe sul-coreana classificada em 22º lugar no mundo, muitas jogadoras acreditam que a decisão de unir-se às norte-coreanas é um desrespeito. A equipe masculina não foi considerada para a integração.

Na semana passada, o primeiro-ministro da Coreia do Sul, Lee Nak-yeon, atraiu fortes críticas quando disse que a equipe feminina de hóquei não era candidata a medalha, de qualquer forma, insinuando que sua equipe atlética podia ser sacrificada pela união política. Mais tarde ele pediu desculpas pelo comentário.

Alguns analistas disseram que a decisão foi simplesmente sexista. "Há um grau de noção de gênero de que os esportes femininos não são tão importantes e podem ser usados nessa abordagem cultural mole", disse Benjamin Young, doutorando em história moderna da Coreia na Universidade George Washington.

"O governo sul-coreano não está tendo dois times de hóquei intercoreanos, masculino e feminino. Eles estão deixando explícito seu preconceito de gênero. Certamente entendo que as jogadoras da equipe, as treinadoras e o público estejam incomodados."

Alguns analistas disseram que a oportunidade de criar um sentido de união e promover um processo de paz é mais importante que a decepção das atletas.

"A comoção pública de que estamos sacrificando os sonhos das jovens atletas coreanas é mais uma declaração política com objetivos específicos de minar o fato de que haverá um processo de paz junto com a Olimpíada de Pyeongchang", disse Chung Yong-chul, professor de psicologia do esporte na Escola Graduada de Educação na Universidade de Sogang, em Seul.

"Todas as pessoas que dizem como é injusto para elas desistir de seu lugar nem sabiam o que era hóquei no gelo antes que surgisse essa questão."

Por enquanto, as jogadoras sul-coreanas estão fazendo os últimos treinos antes do início dos jogos, no mês que vem. O slogan estampado em seus agasalhos é: "Dê Orgulho à Coreia".

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES

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