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Mulheres chinesas clamam "#MeToo", mas enfrentam censores estatais

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Crédito: Billy H. C. Kwok/The New York Times Zhang Qiongwen, que diz ter sido abusada sexualmente por um professor de sua universidade
Zhang Qiongwen, que diz ter sido abusada sexualmente por um professor de sua universidade

JAVIER C. HERNÁNDEZ
ZOE MOU
DO "NEW YORK TIMES", EM PEQUIM

Elas se descrevem como "rompedoras do silêncio", circulam petições reivindicando a investigação de denúncias de assédio sexual e compartilham memes com imagens como punhos cerrados e unhas pintadas.

Mas as chinesas estão tendo dificuldade em organizar um movimento #MeToo forte. Elas enfrentam não apenas uma sociedade dominada por homens, mas o próprio Partido Comunista Chinês.

Censores governamentais vêm tentando obstruir a campanha, bloqueando o uso de frases como "contra o assédio sexual" nas redes sociais e deletando petições online por maior proteção às mulheres. Autoridades recomendaram a ativistas que não se manifestem, sugerindo que, se persistirem, poderão ser tratadas como traidoras em conluio com estrangeiros.

"São muitas vozes sinceras e ansiosas que estão sendo caladas", disse a ativista Zhang Leilei, de Guanghzou (sul), que tem circulado petições entre universitárias. "Estamos chocadas e furiosas."

Mulheres estão exigindo que seus chefes, professores e colegas sejam investigados, pressionando universidades para que apurem queixas e criticando o sexismo e o fato de haver poucas mulheres em cargos de chefia.

A campanha está testando os limites de um governo que não vê com bons olhos os movimentos liderados por cidadãos, tem um histórico fraco na promoção dos direitos das mulheres e controla a mídia.

"O #MeToo soou um alarme para nós", disse a jornalista Sophia Huang Xueqin, que criou uma plataforma de mídia social para as denúncias. "Não temos coragem de nos destacar individualmente, mas podemos ser fortes juntas."

Segundo ela, muitas mulheres têm vergonha de denunciar o assédio devido ao estigma. "A sensação é de ainda vivemos em um mundo tradicional onde as mulheres deviam ficar em casa, cuidar da família e cozinhar para os filhos."

O PC frequentemente abraça a igualdade de gêneros como tema de propaganda política. Mas o governo fez pouco nos últimos anos para combater o ressurgimento do sexismo e da discriminação no trabalho.

Os altos escalões do partido são ocupados principalmente por homens. Altos funcionários do governo e grandes executivos são protegidos contra acusações de má conduta.

Segundo especialistas, as leis sobre estupro e assédio sexual são imprecisas, e os tribunais frequentemente não julgam a favor de mulheres que prestam queixa contra seus empregadores.

"A maioria das vítimas fica em silêncio", disse Li Ying, advogada e diretora do grupo Beijing Yuanzhong Gender Development Center. "Elas não podem correr o risco de perder o emprego."

O #MeToo chinês se limita a mulheres com alto nível de instrução e de grandes cidades. Muitas se inspiram em Luo Xixi, diplomada pela Universidade Beihang, que publicou um texto on-line lido por mais de 3 milhões de pessoas. Luo disse que foi uma de sete mulheres assediadas pelo professor Chen Xiaowu.

Ela escreveu que mais de uma década atrás Chen tentou fazer sexo com ela, apesar de ela lhe ter suplicado para parar. Chen negou as acusações, mas a universidade o demitiu, dizendo que ele assediou várias estudantes.

Seu relato foi descrito por alguns como "o primeiro passo em uma longa marcha" contra o assédio sexual na China. Mas Luo, que vive nos EUA, disse que o movimento precisará ser "suave e gentil" para evitar ser reprimido pelo governo. "Apenas assim a campanha chinesa contra o assédio sexual vai poder seguir adiante e se fortalecer."

Zhang Qiongwen, 22, escondeu um segredo por sete meses. Um diretor de sua universidade, Zhou Bin, a assediou em várias ocasiões, masturbando-se diante dela e obrigando-a a beijá-lo. O diretor ameaçou não deixar que ela e suas colegas se formassem se ela o denunciasse.

Outro diretor da universidade, Cheng Shuijin, disse: "A reação correta é fazer de conta que nada aconteceu".

Atormentada, Zhang começou a pensar em suicídio. No fim do ano ela rompeu o silêncio. Postou um texto online intitulado "Leitura obrigatória para as estudantes de nossa escola. Como se proteger contra predadores" e prestou queixa à polícia. Os dois diretores foram demitidos. "Não consegui apagar uma coisa tão brutal de minha cabeça. Não queria que meu silêncio criasse condições para mais crimes."

Tradução de CLARA ALLAIN

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