Índia quer serviço de saúde gratuito para 500 milhões de pessoas

Premiê busca atender à demanda crescente por maior proteção econômica e social

O premiê indiano, Narendra Modi, fala à imprensa em Nova Déli
O premiê indiano, Narendra Modi, fala à imprensa em Nova Déli - Adnan Abidi/Reuters
Vindu Goel Hari Kumar
Nova Déli | The New York Times

A Índia anunciou na quinta-feira um plano abrangente para oferecer a 500 milhões de cidadãos pobres acesso gratuito a serviços de saúde. O primeiro-ministro Narendra Modi quer atender à demanda crescente por proteção econômica e social mais ampla, antes da eleição nacional do ano que vem.

A medida certamente será popular em um país no qual a maioria das pessoas não conta com planos de saúde e a renda per capita é de alguns dólares ao dia. Ainda que a economia indiana como um todo esteja crescendo, Modi e o seu partido, o Bharatiya Janata (BJP), estão tentando maneiras de cortejar as porções da população que não se beneficiam desse crescimento.

"Na vida das pessoas pobres, uma grande preocupação é como tratar as doenças", tuitou Modi em híndi depois do anúncio do plano. "O novo programa", ele afirmou "livrará as pessoas pobres de um grande problema".

O plano de saúde, parte do orçamento do governo para 2018-2019, apresentado nesta quinta-feira (1º), ofereceria a 100 milhões de famílias até 500 mil rúpias (US$ 7,86 mil) em cobertura de saúde por ano. A soma, embora modesta pelos padrões ocidentais, bastaria para cobrir o equivalente a cinco cirurgias cardíacas, na Índia. As autoridades não delinearam os requisitos de elegibilidade, e muitos detalhes do programa ainda não foram definidos.

Arun Jaitley, ministro das Finanças da Índia, declarou em discurso ao Parlamento que o plano cobriria mais pessoas do que qualquer outro programa de saúde governamental do planeta. Além dos benefícios de saúde diretos, ele disse, o programa criaria centenas de milhares de empregos.

O governo da Índia gastou o equivalente a apenas 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) com o sistema de saúde, em 2014, uma proporção que vem se mantendo mais ou menos inalterada há 20 anos, de acordo com o Banco Mundial. Em contraste, naquele ano a China gastou o equivalente a 3,1% de seu PIB com a saúde, enquanto nos Estados Unidos a proporção do PIB dedicada à saúde foi de 8,3%.

Se aprovado pelo Parlamento indiano e custeado apropriadamente, o novo programa poderá significar uma vasta expansão na cobertura de saúde, permitindo que as pessoas recorram aos muitos hospitais privados do país para necessidades de saúde variadas, de tratamentos para o câncer a cirurgias de artroplastia total do joelho. Ainda que os hospitais operados pelo governo sejam teoricamente gratuitos para todos, as esperas são longas, a qualidade é baixa, e a corrupção é endêmica.

"Isso é muito importante. É o maior passo dado pelo governo com relação à saúde em 20 anos", disse o Dr. Ajay Bakshi, antigo presidente-executivo da Manipal Hospitals, uma cadeia de 16 hospitais privados sediada em Bangalore, no sul da Índia.

A expectativa de vida média dos indianos é de 68 anos, muito inferior à de outros grandes países em desenvolvimento, como a China ou o Brasil. Isso se deve em larga medida aos serviços de saúde precários.

"O maior peso da doença recai sobre os 500 milhões de pessoas mais pobres. Elas não têm acesso a diagnósticos. Se forem diagnosticadas, não têm como obter tratamento", disse Bakshi.

Alguns especialistas em saúde pública apontam que as propostas do governo pouco fazem em termos de serviços preventivos de saúde. A Índia vem sofrendo de níveis cada vez mais elevados de poluição atmosférica e da água, e os efeitos disso são agravados pelas políticas pró-mercado do atual governo. Subnutrição, saneamento precário e a falta de habitação apropriada também continuam a ser sérios problemas.

"De que as pessoas pobres morrem? Diarreia, pneumonia, subnutrição, malária, tuberculose", disse Rama Baru, professor do Centro de Medicina Social e Saúde Comunitária da Universidade Jawaharlal Nehru, em Nova Déli. "A prevenção e os serviços curativos precisam caminhar juntos".

O governo não ofereceu detalhes sobre como pretendia pagar pelo programa de saúde. O Ministério das Finanças afirmou ter alocado US$ 314 milhões à proposta, mas o programa certamente custaria bilhões de dólares ao ano.

Um plano anterior, anunciado pelo governo Modi em 2016 para bancar cobertura de saúde anual em valor de 100 mil rúpias por família, não recebeu verbas. Mas Bakshi disse que desta vez é mais provável que surjam verbas, porque a economia está mais forte —e, mais importante, as eleições se aproximam.

"As autoridades garantirão que isso seja implementado", ele disse. "Os eleitores indianos favorecem governos que lhes oferecem cobertura de saúde em larga escala".

Jaitley disse que, como parte da proposta orçamentária, o governo imporia uma sobretaxa que arrecadaria US$ 1,7 bilhão ao ano especificamente para programas de saúde.

O governo também está propondo um novo imposto sobre ganhos de capital a fim de capturar parte da riqueza que está sendo criada pela alta do mercado de ações indiano, que vem batendo recordes.

Os investidores em ações do setor indiano de medicina claramente antecipam grandes ganhos com o novo programa, e as ações do setor subiram nas operações da quinta-feira.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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