Massacre na Flórida põe armas na berlinda em eleição legislativa de 2018

Democratas e republicanos reveem posições sobre controle de armamentos após chacina

Cartaz de estudantes pede que NRA seja abolida, em protesto contra armas em Washington (EUA)
Cartaz de estudantes pede que NRA seja abolida, em protesto contra armas em Washington (EUA) - Evan Vucci/Associated Press
 
Jonathan Martin ALEXANDER BURNS
Washington | The New York Times

Em Minnesota, um candidato a governador, democrata com raízes rurais, está fugindo de seus vínculos passados com a NRA (o lobby das armas de fogo nos EUA).

No sul da Flórida, deputados republicanos em risco de não serem reeleitos abraçam uma proibição às armas de assalto.

No Ohio, o candidato democrata moderado a governador, sentindo a pressão vinda da esquerda de seu partido, agora defende uma plataforma mais rígida contra a violência com armas do que poderiam sugerir suas relações passadas com a NRA.

 

A chacina recente na escola de segundo grau Marjory Stoneman Douglas, em Parkland, Flórida, inseriu a questão dos direitos às armas na campanha legislativa deste ano, atrapalhando os planos de campanha tradicionais de ambos os partidos, com a discussão agora se desviando para medidas de restrição de armas.

Muitos deputados republicanos e alguns governadores do partido estão começando a se distanciar da ortodoxia de seu partido em relação aos direitos às armas, indicando uma abertura a restrições, algo que reflete a indignação crescente entre os eleitores suburbanos.

Mas os democratas enfrentam ainda mais pressões internas para reajustar sua posição sobre essa questão. Ao mesmo tempo em que procuram recuperar Estados e cadeiras de deputado conservadores, os moderados reconhecem que carregar a marca da NRA pode ser fatal para eles nas primárias.

“Sempre respeitei o direito dos cidadãos respeitadores da lei a serem donos responsáveis de armas, e muitas pessoas no Ohio têm posições fortes sobre o assunto”, disse Richard Cordray, principal candidato democrata ao governo do Ohio e ex-diretor do Birô de Proteção Financeira ao Consumidor.

Ele precisa derrotar o candidato de esquerda Dennis Kucinich para conseguir a indicação por seu partido. “Mas penso também que pessoas com olhos e ouvidos abertos estão vendo algumas destas tragédias de diferentes tipos em nossa sociedade e pensando que precisamos fazer mais.”

Pelo lado republicano, o governador do Tennessee, Bill Haslam, que preside a Associação de Governadores Republicanos, mas não precisa ser candidato outra vez, avisou seu partido sobre o desafio político imediato que enfrenta: os eleitores, “principalmente as mulheres suburbanas”, estão se mobilizando para defender o controle de armas.

“Quando uma coisa é dramatizada tão fortemente, como aconteceu na Flórida, isso chama a atenção das pessoas. E elas dizem: ‘Tem que haver certas coisas que possamos fazer’”, disse Haslam, que defendeu a elevação do limite de idade para a aquisição de armas, passando por cima da oposição da NRA.

O perigo político para os dois partidos se encontra em partes divergentes do país. Para os republicanos, ignorar os temores de seus eleitores em relação à violência com armas pode lhes custar caro na Câmara, onde o partido quer conservar suas posições em dezenas de distritos em torno de grandes cidades —incluindo Filadélfia, Chicago, Los Angeles e San Diego— onde o presidente Donald Trump é visto com aversão profunda e a NRA tem pouco apoio.

Do lado democrata, é nos Estados mais rurais –cruciais para suas esperanças de avanço em disputas para o Senado e governos— que os defensores democratas dos direitos às armas estão se mobilizando para reagir.

Em alguns casos, a discussão sobre as armas, que está mudando rapidamente de tom, colide com eleições primárias que líderes partidários como Inslee esperam que não ganhem um tom muito agressivo.

As chances dos democratas de competir em eleições estaduais no Meio-Oeste e no Sul em 2018 pode depender da capacidade dos candidatos de agradar aos donos de armas, muitos dos quais se opõem radicalmente a novos regulamentos.

Até recentemente, os democratas liberais em grande medida toleravam esses gestos, que enxergavam como necessidade política.

Na semana passada, o democrata Conor Lamb, que trava uma campanha acirrada para uma eleição especial num distrito conservador da Câmara no sudoeste da Pensilvânia, rejeitou chamados pela adoção de novas leis de armas após a chacina em Parkland.

Mas as imagens tenebrosas de estudantes, fiéis de igrejas e pessoas que assistem a um concerto sendo abatidas por indivíduos com fuzis semiautomáticos de estilo militar está mobilizando de maneira nova os proponentes do controle de armas, levando até mesmo democratas de Estados tradicionalmente republicanos ou indecisos a mudar de rumo repentinamente.

Antes mesmo da chacina na Flórida, porém, as fileiras dos democratas fortemente alinhados com a NRA já tinham diminuído até quase desaparecer.

Após as perdas do partido nas eleições de 2010 e 2014, apenas um grupo pequeno de democratas de áreas rurais, solidamente republicanos, permanece no Congresso. Dos cinco senadores democratas que votaram contra uma lei proposta em 2013 para ampliar a verificação de antecedentes dos compradores de armas, apenas uma (Heidi Heitkamp, do Dakota do Norte) ainda está no cargo.

Mesmo no Texas, Estado cuja cultura de armas vem desde sua fundação, a maré democrata é claramente favorável às restrições às armas. O deputado democrata texano Beto O’Rourke, candidato ao lugar de Ted Cruz no Senado, reconheceu que seu apoio à proibição das armas de assalto provavelmente não o beneficiará nas urnas.

Mas, segundo ele, “é preciso fazer o que é certo, e as pessoas precisam saber qual é nossa posição nessas questões”.

A uniformidade na questão das armas é igualmente pronunciada entre os republicanos. Apenas três senadores republicanos ainda em seus cargos votaram a favor da medida de 2013 sobre verificação de antecedentes de compradores de armas, redigida pelos senadores Joe Manchin 3º, democrata da Virgínia Ocidental, e Patrick Toomey, republicano da Pensilvânia, após o massacre de dezembro de 2012 na escola primária de Sandy Hook, em Newtown, Connecticut.

Mas a chacina na Flórida evidentemente levou alguns republicanos a rever sua posição ou, pelo menos, comprar tempo para poder avaliar se a onda mais recente de indignação será passageira.
 

Tradução CLARA ALLAIN

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