Mercosul tem de funcionar para países menores, diz candidato paraguaio

Opositor Efraín Alegre quer usar energia para melhorar inserção do país no mundo

 
O candidato do Partido Liberal à Presidência do Paraguai, Efraín Alegre, dá entrevista à Reuters em janeiro em Assunção
O candidato do Partido Liberal à Presidência do Paraguai, Efraín Alegre, dá entrevista à Reuters em janeiro em Assunção - Jorge Saenz/Associated Press
Sylvia Colombo
Buenos Aires

Candidato à Presidência do Paraguai pela segunda vez, o advogado Efraín Alegre, 55, crê que o Mercosul "precisa funcionar melhor para as economias menores" (a paraguaia e a uruguaia) e defende mudar a política econômica "de entregar riquezas nacionais a Brasil e Argentina".

Em entrevista à Folha por telefone, Alegre afirmou que sua aliança --uma coligação que inclui de liberais a esquerdistas, encabeçada por seu Partido Liberal Radical Autêntico-- se contrapõe a "forças do passado", representadas pela candidatura do colorado Mario Abdo Benítez, filho do secretário do ditador Alfredo Stroessner (1912-2006).

Entre os partidos da aliança está a Frente Guasú, do ex-presidente Fernando Lugo, de quem foi ministro de Obras Públicas (2008-11). O vencedor da eleição em turno único, em 22 de abril, sucederá o também colorado Horacio Cartes, que em 2013 venceu Alegre por oito pontos.

 

Folha - Qual é a sua proposta?

Efraín Alegre - Temos um país com bom crescimento (4,3% em 2017), mas cuja pobreza atinge a 28,9% da população, e essa cifra veio crescendo nos últimos dois anos de gestão de Horacio Cartes.

Em nossa campanha, ouvimos queixas do setor de agricultura familiar e de pequenos e médios empresários, que creem que os investimentos do atual governo não os têm como prioridade. Vamos mudar isso. Defendemos uma política de criação de empregos e de oportunidades iguais a todos, assim poderemos diminuir esse índice de pobreza.

E de onde viriam os recursos?

Sobretudo da energia. Ainda a exportamos a baixo custo e, do que é destinado ao uso interno, tiramos pouco proveito. Investiremos em infraestrutura e numa política para que boa parte do rendimento da energia produzida aqui seja usufruída aqui [hoje, o Paraguai tem direito a 50% da energia produzida na usina binacional de Itaipu, mas consome apenas 5% —o restante é vendido ao Brasil, seu sócio].

A energia também deve ser usada como elemento de negociação para melhorar nossa inserção no mercado internacional. Nos últimos 70 anos, nossa política tem sido de entrega dos grandes interesses nacionais ao Brasil e à Argentina, e isso precisa mudar.

Além disso, é preciso proporcionar energia mais barata para a população pobre.

Qual é o principal legado negativo da presidência Cartes?

A promiscuidade entre as instituições e uma Justiça resignada ao Executivo. Precisamos mudar a cultura da impunidade para quem trafica drogas, maneja contrabando e outros delitos de grande porte. Isso só é possível com uma reforma institucional.

O contrabando de cigarros [que envolve empresas ligadas a Cartes] é uma vergonha internacional que afeta nossa imagem e causa danos a economias da região. Quanto ao narcotráfico e ao descontrole de nossas fronteiras, adotaremos uma linha dura. São nossos grandes problemas.

No Paraguai, há grande presença de empresas brasileiras e de "maquilas" [fábricas que exportam 100% da produção, com isenção de impostos]. Isso prejudica investidores locais e pequenos produtores?

As "maquilas" têm grande importância na economia e vêm trabalhando muito bem. Mas precisamos oferecer mecanismos de proteção e estímulo para aqueles pequenos empresários ou agricultores que não estão incluídos em grandes projetos, algo que o atual governo não fez, causando grande desigualdade.

Seu adversário, Mario Abdo  Benítez, derrotou um pré-candidato mais progressista, Santiago Peña. Foi uma vitória do setor mais conservador colorado? A quem Abdo representará?

Abdo é a volta do partido Colorado mais autoritário. Representa o setor mais conservador, sectário, monocromático e autoritário da nossa sociedade. Nossa aliança quer atrair todas as forças democráticas da oposição e representa a independência dos poderes e a diversidade.

Qual a opinião do sr. sobre bandeiras como aborto e a regulamentação da produção e do consumo de drogas?

Somos contra o aborto. Com relação às drogas, não vejo problemas em debater o uso medicinal da maconha. Mas em relação a tudo o que esteja vinculado ao crime organizado, estamos preocupados.

Combateremos o narcotráfico e a produção de drogas localmente, como a maconha, traficada por facções criminosas para o Brasil, a Argentina e outros países. Uma de minhas propostas é reforçar o controle da fronteira, onde o crime organizado opera livremente. Precisamos erradicar a cultura do contrabando, que vai do cigarro às drogas.

Como o sr. vê o Mercosul?

É um fórum necessário, e o Paraguai continuará sendo parte dele, tentando colaborar para fortalecê-lo. Porém, Paraguai e Uruguai são tratados de forma desigual num bloco dominado por economias maiores --Brasil e Argentina.

Além disso, ainda há barreiras protecionistas. Precisamos fazer com que o Mercosul funcione melhor para nós, que seja mais eficaz para a comercialização dos nossos produtos. E seria importante que o bloco fosse mais flexível com a possibilidade de os membros fazerem tratados de livre comércio individualmente com outros países.

Como o sr. vê a Venezuela?

Vamos respaldar todos os esforços regionais por uma saída pelo diálogo, por meio de organismos internacionais.

 

RAIO-X

Efraín Alegre

Nascimento

San Juan Bautista (Misiones), Paraguai, 18 de janeiro de 1963

Formação

Advogado e mestre em Ciências Políticas; estudou na Universidade Católica de Assunção, na Universidade de Buenos Aires e na de Salamanca (Espanha)

Carreira

Ex-deputado, ex-ministro de Obras Públicas (2008-11) sob Fernando Lugo; candidato a presidente em 2013 pelo Partido Liberal Radical Autêntico

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