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Os refugiados rohingyas continuam chegando a Bangladesh

Recém-chegados dizem que se sentem inseguros, ameaçados e assediados nas aldeias

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Voluntária carrega criança desnutrida para hospital de campanha no campo de refugiados de Kutupalong, em Bangladesh
Voluntária carrega criança desnutrida para hospital de campanha no campo de refugiados de Kutupalong, em Bangladesh - Manish Swarup - 14.jan.2018/Associated Press
Kate Nolan

Bangladesh recebeu cerca de 700 mil refugiados rohingyas desde 25 de agosto de 2017. Eles se juntam a dezenas de milhares que já estavam no país desde períodos anteriores de tensão e violência no estado fronteiriço de Rakhine, em Mianmar.

O que considero mais marcante sobre essa situação é a magnitude: o grande número de pessoas que cruzaram a fronteira no curto período de tempo de apenas seis meses. Na verdade, as pessoas continuam chegando.

Agora, o número de pessoas que chega não é enorme como no início da crise, mas ainda vemos algumas centenas chegarem ao país toda semana depois de atravessar o rio Naf.

Os refugiados recém-chegados dizem que se sentem inseguros, ameaçados e assediados nas aldeias que são abandonadas.

Eles tentam vender seus produtos de qualquer maneira possível para poder embarcar em um barco e chegar a um país que fez e continua a fazer um grande esforço para acomodá-los.

Os refugiados acabam ficando em assentamentos improvisados, densamente povoados e superpopulosos no distrito sul de Cox's Bazar. Os seus abrigos são feitos principalmente de plástico e de bambu e apresentam condições inadequadas de água e saneamento.

Como vemos através de nossas consultas médicas em todos os assentamentos, os rohingyas já eram marginalizados e excluídos em Mianmar. Eles tiveram pouco ou nenhum acesso a cuidados de saúde e não foram vacinados contra doenças transmissíveis, logo, seu status de imunização tem níveis baixos.

Nossos médicos tratam muitas pessoas com diarreia e infecções respiratórias —doenças relacionadas às condições de vida nos campos. Também vemos feridas que se tornaram infecções graves depois de não serem cuidadas, doenças crônicas que nunca foram devidamente tratadas e famílias fragmentadas em que crianças ou pessoas com deficiência têm que cuidar de muitos outros, garantir suprimentos essenciais ou construir seus próprios abrigos.

Todos esses fatores combinados (tamanho total da população, condições de superlotação, abrigo inadequado e status de vacinação aparentemente muito baixo) criam uma tempestade perfeita para a situação de saúde pública. É uma situação muito frágil que requer constante atenção do nosso pessoal e de outras organizações que trabalham no terreno.

Algo que me preocupa são as novas emergências dentro da emergência atual. Por exemplo, a próxima estação chuvosa com as monções e tempestades tropicais em uma área que é propensa a ciclones pesados —apresenta um maior potencial para doenças transmitidas pela água, como a diarreia aquosa aguda, o que é uma preocupação significativa. Já vimos como a vulnerabilidade das pessoas pode aumentar rapidamente. Agora, estamos tratando pessoas com sarampo e difteria.

Sempre existe o risco de enfrentarmos doenças para as quais os trabalhadores humanitários e o sistema de saúde estão mal preparados. Sobre isso, há espaço para que todos os atores que respondem a esta crise aumentem tanto o número de pessoas a serem vacinadas, quanto o número de doenças contra as quais as pessoas devem ser imunizadas.

Além disso, há poucos assentamentos que podem ser acessados por veículos —e muitos deles ainda precisam ser acessados a pé. Estamos preocupados com a natureza dos abrigos, quão robustos são e se estão realmente preparados e equipados para as fortes chuvas. Estamos considerando a possibilidade de deslizamentos de terra ou mesmo algo tão simples como lamas nas vias, que podem causar acidentes, provocando feridas e fraturas.

Atualmente, estamos preparando nossa própria resposta de emergência, tentando antecipar o potencial dano às nossas estruturas de saúde. Por isso temos suprimentos para realizar reparações rápidas e voltarmos a ser operacionais.


Após a pressa dos últimos meses, nossa prioridade agora é consolidar as atividades médicas, focar nos serviços de saúde secundária e na resposta de emergência aos surtos, para estarmos prontos para responder caso a crise se prolongue e se torne negligenciada.

Nos primeiros dias, água, saneamento e cuidados de saúde primária eram prioridades para nós, mas agora vemos outros atores trabalhando nisso. No entanto, a lacuna nos serviços hospitalares permanecem. Além disso, os serviços de saúde mental continuam sendo uma parte importante da atuação feita junto às pessoas que sofreram níveis extremamente altos de violência, conforme confirmado pelos levantamentos retrospectivos de mortalidade que publicamos em dezembro.

Enquanto continuamos respondendo à emergência, em coordenação com as autoridades, é importante fazer um esforço para melhorar a aceitação e compreensão do nosso crucial trabalho humanitário. A região viu a sua população aumentar drasticamente, junto à subsequente pressão adicional na economia local, no meio ambiente e na vida diária da comunidade e do país de acolhimento que manteve suas fronteiras abertas em uma crise que está longe de terminar.

Desde 25 de agosto de 2017, Médicos Sem Fronteiras ampliou suas operações de forma maciça e agora gerencia 15 postos de saúde, três centros de saúde primária e cinco instalações de internação. As principais morbidades entre os pacientes em nossas clínicas são infecções respiratórias e doenças diarreicas, que estão diretamente relacionadas às precárias condições de abrigo, água e saneamento nos assentamentos.

Mais de 200 mil pacientes foram atendidos nos ambulatórios de MSF e 4.938 pacientes nos serviços de internação entre o final de agosto e o final de dezembro.

KATE NOLAN é coordenadora de emergências da Médicos Sem Fronteiras e relata a atual situação desses refugiados em Bangladesh

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