Nossa aposta é superar a polarização na Colômbia, diz Humberto de la Calle

Negociador com Farc vê legado de pacificação e promete avançar em conversas com ELN

SYLVIA COLOMBO
Buenos Aires

Durante quatro anos, desde 2012, Humberto de La Calle, 71, fez uma espécie de ponte aérea constante entre Bogotá e Havana. Na capital cubana, chefiou a equipe de negociadores do Estado colombiano que, em 2016, conseguiu finalizar um acordo de paz com a então guerrilha das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).

Candidato à presidência da Colômbia, Humberto de la Calle participa de conferência em Bogotá, na Colômbia, em 23 de janeiro de 2018.
Candidato à presidência da Colômbia, Humberto de la Calle participa de conferência em Bogotá, na Colômbia, em 23 de janeiro de 2018. - Jhon Paz/Xinhua

Quando pensou que ia descansar, o ex-vice-presidente (1994-96) teve a má notícia. Em outubro do mesmo ano, em um plebiscito convocado pelo presidente Juan Manuel Santos, os colombianos disseram “não” ao acordo.
Foi preciso voltar a embarcar para Cuba, sentar-se novamente com os líderes da guerrilha, fazer remendos e dar uma nova redação ao documento. Santos, então, sem mais vontade de correr riscos, submeteu o teor do documento não à população, mas ao Congresso. Desta vez, teve êxito.
Era o fim de uma guerra de mais de 50 anos e um acontecimento histórico para a Colômbia, que acabou rendendo o Nobel da Paz para o presidente da República.
Só por isso, era de se imaginar que De La Calle, ao se apresentar como candidato para as eleições presidenciais de 2018 (em maio), saísse com grande vantagem na campanha. Mas os números das pesquisas não têm sido muito animadores. 
Ele está em quinto lugar, refletindo a baixa popularidade de Santos e do próprio acordo de paz, que muitos colombianos creem ser complacente com a ex-guerrilha.
Mas o candidato crê que os colombianos não tardarão em ver os resultados positivos do documento. E apresenta sua candidatura como a única capaz de defender o tratado e ainda conseguir outro, com o ELN (Exército de Libertação Nacional), hoje a guerrilha mais expressiva em atividade na Colômbia.

Folha - Qual será seu principal objetivo como presidente?
Humberto de La Calle - Ter colocado fim a um conflito armado de 50 anos nos permite colocar o foco nos problemas que mais angustiam os colombianos e que temos sido incapazes de resolver. A paz oferece grandes oportunidades. Seremos um governo revolucionário. Faremos em quatro anos o que o país não fez nos últimos 20, que é enfrentar as questões que os colombianos apontam como prioritárias, como a corrupção e a insegurança.

Como isso será possível?
Colocando os pobres como prioridade. Procuraremos atender os que vinham sendo ignorados. Não por meio de subsídios assistencialistas, mas sim oferecendo ferramentas para que tenham igualdade real de oportunidades.

O sr. se considera um continuador das políticas de Juan Manuel Santos?
Sempre manifestei gratidão com relação ao presidente Santos por ter permitido que eu liderasse a equipe negociadora com as Farc. Mas não me considero apenas um candidato de Santos. Nossa aposta é justamente a de superar algo que vem sendo daninho à sociedade, que é a atual polarização do país.

Como a paz com a Farc [hoje um partido político] vai impactar as eleições?
Já tivemos uma oportunidade de ver o lado positivo no último dia 11, quando tivemos as eleições legislativas mais pacíficas em décadas. Já salvamos milhares de vidas e estamos redescobrindo partes do país em que apenas a guerrilha reinava, e onde os cidadãos viviam isolados.
Temos de defender os acordos, pois há muita gente que quer destruí-los. Meu compromisso com o que foi acertado é absoluto. Num governo meu, não haverá retrocesso nos processos de paz.

E o ELN?
Apesar de a negociação não estar num bom momento, defendo que a melhor opção será sempre o diálogo. Porém, o diálogo requer demonstrações reais de compromisso. Nas legislativas, o ELN interrompeu as hostilidades. Esperamos que o mesmo ocorra nas presidenciais. 

Como a Colômbia deve atuar na crise da Venezuela?
A Venezuela vive uma crise humanitária, portanto devemos responder de modo solidário. A prioridade deve ser promover uma aliança internacional que busque reestabelecer a democracia e que proteja os direitos humanos e as garantias políticas dos venezuelanos de acordo com o direito internacional.
É uma oportunidade que os países latino-americanos têm de atuar de forma articulada e de demonstrar que os laços que nos unem com relação a direitos humanos não têm fronteiras.

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