Descrição de chapéu Venezuela

Candidato opositor à Presidência da Venezuela prega voto e conciliação

Ex-militar que deixou o chavismo, Henri Falcón afirma que abstenção não é a saída

O candidato a presidente da Venezuela, Henri Falcon, durante evento em Caracas
O candidato a presidente da Venezuela, Henri Falcon, durante evento em Caracas - Carlos Garcia Rawlins - 23.abr.2018/Reuters
Caracas

A Venezuela terá eleições presidenciais em 20 de maio, mas os líderes opositores —Henrique Capriles, María Corina Machado, Leopoldo López e Freddy Guevara— estão fora de combate.

Alguns tiveram seus direitos políticos cassados, outros, fora do país, e há quem não queira participar por medo de fraudes que reelejam o ditador Nicolás Maduro, 55.

Vários países denunciam o pleito, que não terá observadores internacionais independentes. Pairam suspeitas de manipulação, como nas votações para os membros da Assembleia Constituinte, governadores e prefeitos em 2017.

Ainda assim, Henri Falcón, 56, um ex-militar dissidente do chavismo e hoje no partido Avanço Progressista, afirma que a abstenção não é a saída.

Falcón, que lidera as pesquisas com 41,4%, contra 34,3% de Maduro (Datanálisis), concedeu entrevista à Folha em seu comitê, em Caracas.

Sua candidatura selou a cisão da coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD), abalada desde o fim dos protestos de 2017.

Os partidos que não se uniram a Falcón, incluindo o Primeiro Justiça e Vontade Popular, articuladores dos atos, formaram em março, com movimentos de direita e ex-chavistas, a Frente Ampla Venezuela Livre, que defende a pressão pela saída de Maduro. Até o momento, porém, a adesão popular foi reduzida.

 

Por que o sr. quer ser presidente da Venezuela?

Quero uma transformação que melhore as condições de vida. Na Venezuela, hoje, nada funciona. O governo perdeu o controle, há distorções na economia e desequilíbrio social.

A Venezuela hoje é o país que tem as maiores evasões escolar e universitária da América Latina. E é grave o problema da fome, ligado à queda do aparato produtivo e à perseguição do governo contra a iniciativa privada.

Enumerar os problemas pode levar o dia inteiro; por onde começar? 

Primeiro pacificar o país, baixar o nível de tensão e gerar condições de governabilidade. Isso se alcança com um processo de diálogo. 

Os setores vulneráveis superam hoje os 82% da população. Nenhum país supera esses problemas na base do enfrentamento.

O sr. está sugerindo uma negociação com o chavismo?

Sim, a primeira medida seria iniciar uma concertação para libertar os presos políticos e criar mecanismos que dificultem a retaliação. Penso em chamar todas as forças para o diálogo.

Seguiria com a ideia do governo de mudar a Constituição?

Serão necessárias uma revisão constitucional e itens que permitam um projeto de estabilização econômica.

Por exemplo?

Nossa principal proposta é dolarizar a economia, por meio de uma consulta popular e de uma reforma constitucional. Isso geraria confiança entre investidores, comunidade internacional e empresários. Seria o início da recuperação.

E quais as outras saídas?

Precisamos reestruturar nossa petroleira, que hoje é um caixa para o governo e símbolo máximo da corrupção no país.

A Venezuela produzia quase 4 milhões de barris por dia, e hoje não chega a 1,5 milhão. Caíram as importações, e isso fez com que a economia ficasse em condições precárias.

Sem importações, não há insumos e cai a produção no campo. O Estado já deixou de garantir a segurança alimentar. Vivemos em um país quebrado, sem possibilidades de honrar dívidas com o exterior. Há instituições e governos  prontos para ajudar, mas não com esse governo que aí está.

Muitos opositores estão inabilitados e o sr. não. Houve algum tipo de acordo?

Não, o governo terá tido suas razões.

E porque não fez o mesmo com o sr.?

Porque tivemos uma participação ativa em todos os processos eleitorais. É claro que é condenável que o governo tenha feito isso com outros atores, mas nossa participação foi mais coerente. Nunca boicotamos eleições.

Qual é a linha de seu partido?

Nós acreditamos em dois caminhos. O primeiro é o do diálogo, que parece não ser tão prioritário a outros opositores. A política do diálogo é a política da negociação.

Os que foram dialogar com Maduro na República Dominicana não se deram bem porque o governo armou para que aquilo não funcionasse, e os opositores foram sectários.

Outro diferencial é que nunca saímos da opção eleitoral. Não acreditamos em outra via.

Na última eleição, muitos creem que Capriles ganhou, mas preferiu evitar a violência. Se o sr. estiver convicto de que venceu, mas o governo se declarar vencedor, o que fará?

Vamos nos defender e defender a vontade das pessoas.

Mas isso seria recorrer às ruas. Não sai de seu princípio de usar só a via eleitoral?

Não, porque os protestos são uma via de pressão válida para que se reconheça um resultado.
No Chile, havia um governo ditatorial, pressão das ruas, um plebiscito. E, depois, o que houve? Um governo de transição baseado na união por meio da Concertação.

Na Nicarágua foi igual, eram invencíveis os sandinistas, até que Violeta Chamorro (em 1990) derrotou o regime autoritário e implementou um governo unindo várias forças.

O sr. crê que possa haver fraudes, como nas eleições para a Constituinte e nas regionais?

Governos de corte ditatorial são derrotados quando se massifica a votação, não pregando a abstenção. Todas as vezes em que perdemos na Venezuela foi porque nos abstivemos de votar.

Muitas vozes da comunidade internacional dizem que não reconhecerão a eleição.

Isso precisa ser colocado entre aspas, pois e se eu ganhar? Ainda assim não vão reconhecer? E se o povo eleger a oposição?

Pesquisas mostram um índice de abstenção de quase 30%. A população deixou de acreditar na via eleitoral?

Sim, porque do lado do governo, estamos nessa situação calamitosa. E a oposição foi incoerente. Primeiro estimulou todos a irem as ruas, veio a repressão, morreram mais de 130 pessoas, e aí a oposição disse que não se deveria mais ir às ruas, que se deveria votar. As pessoas ficam confusas e frustradas. E com razão.

E porque elas se animariam?

Meu argumento é que as pessoas devem votar. O quadro agora é outro: temos um governo com 80% de rejeição e uma hiperinflação, as condições são ideais para votar massivamente. Abster-se é votar em Maduro.

Como o sr. se define hoje, tendo passado pelo chavismo e agora opondo-se a ele?

Eu me defino como venezuelano. A polarização causou muitos danos à Venezuela. O socialismo fracassou; creio hoje na economia de mercado e em uma iniciativa privada que jogue com as regras do Estado.

Henri Falcón
Nasceu em Nirgua, 19 de junho de 1961 (56 anos); tem formação militar e estudou direito. Na política, foi constituinte (1999), prefeito de Irribarren (2000-2008) e governador de Lara (2008-2017)

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