Coreia do Norte e do Sul vivem em mundos distintos, mas mantêm hábitos comuns

Economia vibrante de Seul contrasta com privação de liberdade na ditadura

Johanna Nublat

O contraste entre Seul e Pyongyang, distantes menos de 200 km, não poderia ser mais intrigante. A capital sul-coreana vibra com o movimento constante de seus 10,2 milhões de habitantes em bares e cafés, tem luxuosos shoppings com marcas internacionais e letreiros luminosos de propagandas comerciais nas ruas. 

Um de seus pontos turísticos mais curiosos é a estátua de um par de mãos imitando o gesto da música “Gangnam Style”, hit do rapper Psy que correu o mundo em 2012. 

A capital do Norte, de outra parte, é um aglomerado de prédios modestos, onde sua população de 3,2 milhões de pessoas convive cotidianamente com slogans da propaganda estatal e uma mistura crescente de negócios formais autorizados pelo governo e os informais autorizados pela propina.

É uma cidade com iluminação pública mínima, o que garante uma reserva de energia para que as estátuas de Kim Il-sung e Kim Jong-il –respectivamente o avô e o pai do atual ditador, Kim Jong-un– estejam sempre em destaque, seja noite ou seja dia.

Há uma segunda camada de diferenças não menos evidentes. Enquanto os sul-coreanos estão entre os povos mais conectados à internet e, em maio passado, elegeram um novo presidente após a anterior ter sido retirada do cargo em meio a acusações de corrupção, os norte-coreanos vivem há décadas sob o isolamento do mundo e a opressão de uma mesma família. 

Os coreanos comuns do Norte não têm acesso à internet, não têm liberdade de se locomover dentro ou para fora de seu país, não podem atuar livremente na iniciativa privada, estão sujeitos a desaparecer em campos de prisão política caso discordem minimamente da liderança que eles não escolheram e, para completar, ainda são alguns centímetros mais baixos que os coreanos do Sul devido a anos de privação de comida.

Mas, ao mesmo tempo em que vivem mundos completamente à parte, os coreanos dos dois lados da fronteira são um mesmo povo, que foi forçado a seguir caminhos opostos há apenas setenta anos. 

Eles comem kimchi –o fermentado de verduras que acompanha as refeições coreanas–, têm parentes espalhados nas duas pontas da península, foram influenciados por ideias confucionistas e nacionalistas e têm interesse pelos mesmos filmes e novelas produzidos no Sul –vistos pelos do Norte clandestinamente, sob risco de punição severa.

Mais importante, tanto os coreanos do Norte quanto os do Sul aspiram aos mesmos objetivos: o fim de uma vida sob a ameaça da guerra iminente e, sobretudo para as gerações mais antigas, a reunificação em uma mesma nação.

A histórica imagem do aperto de mãos entre Kim e o presidente sul-coreano, Moon Jae-in, fez alguns chorarem e muitos terem esperança de que essas tantas diferenças do dia a dia possam ficar para trás. Afinal, foi um grande dia, seja para os coreanos do Norte ou os do Sul.

Qual é, no entanto, a esperança possível? Kim Jong-un vai fechar os campos de prisão política, liberar viagens dos cidadãos ao exterior, abrir o país à internet –e, ao mesmo tempo, às verdades que destroem o discurso oficial? 

Vai abrir mão das armas nucleares que sua família persegue pelo menos desde a década de 1960, como garantia da sobrevivência dos Kim no poder e em detrimento de necessários investimentos em saúde e alimentação? 

E, por fim, o jovem ditador está se oferecendo para entregar o trono em prol de que a península seja reunificada sob um governo democrático?

É muito difícil acreditar em qualquer destes cenários. Dado o conturbado histórico de negociações com Pyongyang, a boa vontade dos Kim é sempre suspeita. A tão esperada reunificação da península também não é um desfecho garantido, devido à diferença econômica entre os dois lados da fronteira e ao menor interesse dos jovens sul-coreanos pela união.

Deixando de lado todo esse ceticismo, é bom ter esperança e ver o aceno para a paz entre Kim e Moon como uma promessa de que, em breve, Seul e Pyongyang serão planetas menos distantes.

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