Descrição de chapéu The New York Times

Lavanderias automáticas viram espaço cool em Hong Kong

Com apartamentos cada vez menores, lojas do tipo estão se multiplicando no território

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Clientes dentro de uma lavanderia self-service em Hong Kong
Clientes dentro de uma lavanderia self-service em Hong Kong - Lam Yik Fei/The New York Times
Mary Hui
Hong Kong | The New York Times

Um estabelecimento se destaca numa rua movimentada de Hong Kong cheia de lojas de frutos do mar secos, onde cestos de pepinos-do-mar disputam espaço com vieiras e outros moluscos. Em meio ao cheiro forte de camarão e peixe seco, os aromas de café fresquinho e roupas lavadas saem de uma loja chamada muito corretamente Coffee & Laundry (Café e Lavanderia).

Metade lavanderia automática e metade café, a loja oferece aos fregueses uma variedade de bebidas, doces e salgadinhos, além de dez lavadoras e secadoras self-service.

Lavar a própria roupa numa lavanderia automática é uma experiência nova para os moradores de Hong Kong. Acredita-se que a primeira lavanderia self-service da cidade só foi aberta em 2014. Desde então esse tipo de estabelecimento vem se multiplicando; segundo uma estimativa, até o início de 2018 já havia mais de 180 lavanderias automáticas.

A que se deve essa proliferação? A razão é a crescente escassez de imóveis a preços acessíveis em Hong Kong. Com a alta contínua de preços naquele que já é o mercado imobiliário mais caro do mundo, os habitantes de Hong Kong estão sendo obrigados a se comprimir em apartamentos cada vez menores, que têm pouco espaço para lavadoras e secadoras.

A área média de um apartamento novo em 2017 era 33 metros quadrados, segundo o departamento de construções da cidade, sendo que em 2013 era 39 metros quadrados. E os apartamentos não param de encolher. Segundo a JLL, empresa global de serviços imobiliários, a previsão é que até 2020 sejam erguidos milhares de chamados microapartamentos com menos de 18,5 metros quadrados.

“Este é um setor que nasceu devido aos problemas habitacionais de Hong Kong”, disse Katol Lo, um dos fundadores da Coffee & Laundry. “Mesmo que haja espaço para uma máquina de lavar, onde as pessoas poderiam secar suas roupas?”

Durante muito tempo a resposta era “acima das ruas da cidade”. As roupas estendidas para secar sobre varais que se projetavam das laterais de prédios eram tão onipresentes que se dizia, brincando, que eram a “bandeira nacional” de Hong Kong.

Essa situação começou a mudar na década de 1980, quando lavadoras e secadoras de roupa ficaram mais acessíveis à população, cujo poder aquisitivo subiu graças à abertura da economia chinesa e ao fato de a cidade ter se tornado um grande centro financeiro.

Basta caminhar hoje pelos conjuntos habitacionais públicos e os prédios mais antigos de Hong Kong para perceber que muitas pessoas ainda penduram roupas para secar ao ar livre. Mas o aumento da renda permitiu que boa parte da população se mudasse para edifícios modernos, com fachadas de vidro, sem varais visíveis para secar roupas.

Agora, com o preço do metro quadrado de imóvel subindo cada vez mais, a dificuldade não está mais em ter condições de comprar lavadoras e secadoras, mas de encontrar espaço para colocá-las.

Um resultado disso foi o aumento da demanda pelo serviço de entrega a domicílio das lavanderias tradicionais, presentes em Hong Kong há muito tempo. Com isso, algumas das lavanderias passaram a ter uma sobrecarga tão grande de demanda que os fregueses tinham que esperar muitos dias para receber suas roupas de volta.

Foi quando as lavanderias self-service entraram em cena.

Numa tarde recente, depois do trabalho, Michael Bolger, 27 anos, lia um livro enquanto esperava suas roupas ficarem prontas na Coffee & Laundry.

Irlandês que trabalha numa bolsa de bitcoin, Bolger disse que quando se mudou para Hong Kong, em 2016, seu apartamento era tão pequeno que não tinha espaço para uma secadora. Devido à umidade do ar, suas roupas não secavam bem penduradas dentro do apartamento. Ele recorreu a uma lavanderia tradicional durante algum tempo, mas suas roupas às vezes eram devolvidas rasgadas e manchadas.

“É agradável ficar sentado lendo em um lugar que não é meu apartamento”, ele disse, falando da Coffee & Laundry. “Ficar sentado aqui, olhando as máquinas de lavar, é como uma terapia.”

No bairro de classe trabalhadora de Tai Kok Tsui, uma mulher jogava mahjong no smartphone enquanto esperava sua roupa de cama secar numa filial da Water Laundry, outra rede local de lavanderias automáticas. Quase cada centímetro de parede no pequeno estabelecimento estava ocupado por máquinas.

“Nós trabalhadores não temos dinheiro para comprar uma máquina de lavar e não temos espaço para pendurar as roupas para secar em casa”, disse a dona de casa de 40 anos, que se identificou como sra. Lo. Ela disse que vive com o marido num espaço de 8,3 metros quadrados em um apartamento subdividido em partes.

“É um problema econômico”, ela disse. “As pessoas não viriam a este tipo de lavanderia se tivessem mais dinheiro.”

Segundo Jianxiang Huang, professora do Departamento de Planejamento e Design Urbano da Universidade de Hong Kong, a multiplicação das lavanderias automáticas começou a modificar a paisagem social da cidade, na medida em que a lavagem de roupa, algo antes feito no âmbito privado, foi levada ao espaço público, por força das circunstâncias.

Huang comentou: “Isso está mudando essencialmente o modo como as pessoas se reúnem, como elas vivem suas vidas –está mudando mentalidades.”

Tradução de Clara Allain

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