Moradores de Ghouta voltam para suas casas, mas não as reconhecem

Governo sírio iça bandeira na região e a declara reconquistada de rebeldes

Zamalka (Síria) | AFP

Com a testa franzida, Um Mohamed examina uma fila de casas destruídas sem poder encontrar a sua. Ao voltar para suas casas, os moradores de Ghouta Oriental, próximo a Damasco, não conseguem reconhecer seus bairros, devastados pelos bombardeios do regime sírio.

"Minha casa ficava do lado do instituto, na rua Al Qabun. Não encontrei nem o instituto nem a rua", afirma Mohamed, 50, que passou mais de dez anos de sua vida em Zamalka, em Ghouta Oriental.

Em meados de fevereiro, as forças pró-governo sírias lançaram uma ofensiva para retomar as zonas rebeldes de Ghouta, provocando mais de 1.700 mortos e enorme destruição. 

Os moradores, que haviam fugidos dos combates, começaram a regressar ao território onde nesta quinta-feira (12) o governo sírio içou sua bandeira, anunciando sua reconquista total. 

Soldado sírio ajuda Um Mohamed, 50, a encontrar sua casa em Zamalka, Ghouta Oriental - Youssef Karwashan - 11.abr.2018/AFP

"O bairro está irreconhecível, não encontro nenhum dos seus principais pontos de referência", diz Um Mohamed, observando a paisagem de desolação que a rodeia. 

Ao longo das ruas invadidas por escombros, se sucedem os edifícios residenciais convertidos em ruínas. Aqui pode-se ver um telhado derrubado; mais adiante, um imóvel de paredes derrubadas. 

DESOLAÇÃO

Durante semanas, os bombardeios e tiros de artilharia das forças do regime de Bashar al-Assad reduziram a pó as localidades rebeldes. 

Ajudada por um soldado sírio, Mohamed escala os montes de cimento, assinalando uma casa, depois outro, visitando vários edifícios, com a esperança de encontrar sua casa. 

"Arrisquei minha vida para voltar aqui. Não vou embora antes de encontrar minha casa", diz. "Zamalka era um paraíso. Agora há barricadas por todas as partes, todas as entradas estão minadas."

Soldado sírio caminha pelos escombros de edifício em Zamalka, em Ghouta Oriental - Youssef Karwashan - 11.abr.2018/AFP

Na quarta (11), centenas de pessoas esperavam com impaciência nas redondezas de Ghouta que as autoridades retirassem os escombros nas principais vias de acesso. 

Uma escavadeira desmonta as barricadas e os sacos de areia para permitir a passagem dos habitantes e de um comboio de jornalistas que participam de uma visita organizada pelas autoridades de Damasco. 

A espera não assusta Um Rateb, que trouxe uma cadeira e uma manta para se proteger do sol.

"Vim sozinha para ver minha casa em Kafr Batna, sem saber se a encontraria de pé", diz a mulher de 65 anos. "Mesmo que só tenha sobrado areia, vou estender minha manta e me sentar na minha casa." 

Fuad Mahjub teve de esperar horas com sua família antes de poder voltar para Ain Tarma, onde espera encontrar sua casa e seu ateliê de costura.

"Estou aqui desde as sete da manhã", conta o homem, enquanto desenha com um pedaço de pau círculos no solo para passar o tempo. 

"Abandonei tudo que tinha. Espero que minha casa e meu ateliê não tenham sido destruídos." 

Mahjub se emociana  ao apontar sua neta, Khadija. "Tem seis anos de idade e nunca viu a casa do avô. Não conhece Ain Tarma, só por fotos. Mas se voltarmos a nos instalar aqui, recuperarei com ela o tempo perdido." 

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