Príncipe herdeiro da Arábia Saudita defende direito de Israel existir

Mohammed bin Salman também apoiou relações diplomáticas com o até há pouco inimigo

O príncipe saudita Mohammed bin Salman aparece sério em entrevista; ao fundo do lado esquerdo, uma bandeira da ONU
O príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, participa de reunião com o secretário-geral da ONU, António Guterres, em 27 de março em Nova York - Amir Levy - 27.mar.2018/Reuters
Clóvis Rossi
São Paulo

O príncipe saudita Mohammed bin Salman defendeu o direito de Israel de existir e foi além: insinuou o estabelecimento de relações diplomáticas entre seu reino e o Estado judeu, até há pouco inimigos quase existenciais.

“Acredito que cada povo, em qualquer parte, tem o direito de viver em sua pacífica nação; acredito que os palestinos e os israelenses têm o direito de ter a própria terra”, declarou MBS, como é mais conhecido o príncipe herdeiro, na verdade o governante “de facto” da Arábia Saudita.

Foi em entrevista publicada nesta segunda-feira (2) pela revista The Atlantic.

O príncipe foi muito simpático em relação a Israel: “Israel é uma grande economia, comparada com a dimensão do país, e é uma economia em crescimento. É natural que haja uma porção interesses que compartilhamos com Israel.”

MBS condicionou o restabelecimento de relações a um acordo de paz entre Israel e os palestinos, no que apenas reitera ponto central do plano de paz que os sauditas já haviam apresentado em 2002.

No essencial, o plano previa a devolução aos palestinos de territórios ocupados por Israel, em troca da normalização das relações do mundo árabe com Israel.

A novidade na entrevista de MBS é o reconhecimento do direito à existência de Israel quando está cada vez mais distante a hipótese de um acordo com os palestinos.

Israel está tecnicamente em guerra com dois de seus quatro vizinhos (Síria e Líbano) e só tem acordos de paz com Egito e Jordânia. Todos os demais países árabes se consideram inimigos de Israel.

Como a Arábia Saudita lidera significativa parte do mundo árabe-muçulmano, uma aproximação com Israel mudaria no mínimo a retórica —em geral inflamatória— no relacionamento com esse mundo.

A entrevista de Salman parece provocada pela ofensiva saudita contra o Irã, rival religioso e regional da Arábia Saudita. Disse à revista que o líder supremo iraniano, o aiatolá Ali Khamenei, faz “Hitler parecer bom”. E acrescentou: “Ele [Khamenei] é o Hitler do Oriente Médio”.

O Irã é, no momento, o inimigo existencial de Israel. Seus líderes com frequência apontam o desejo de destruir o Estado judaico.

Os sauditas são, na maioria, sunitas, ao passo que o Irã é um país de maioria xiita —os dois grandes ramos do Islã.

O Irã é considerado radical no Ocidente, por ser uma ditadura teocrática, mas a Arábia Saudita não é menos ditadura nem menos inclinada ao radicalismo.

A doutrina sempre citada como a oficial da Arábia Saudita é o wahabismo, baseado nos ensinamentos radicais de Muhammad ibn Abd al-Wahhab (1703-1792). Tem sido apontada como uma das principais influências para o terrorismo islâmico.

Além de se aproximar de Israel, o príncipe Salman pretende mudar essa imagem, confirme declarou a investidores em outubro passado: “Estamos retornando ao que éramos antes, um país de islamismo moderado que esteja aberto a todas as religiões e ao mundo”.

O aceno de agora a Israel se encaixa à perfeição nessa promessa —e, se levada adiante, muda a geopolítica de uma das regiões mais explosivas do planeta.

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