Descrição de chapéu México

Com confronto entre líder e empresários, medo vira eixo de campanha no México

Esquerdista López Obrador é alvo de propaganda hostil de seus adversários na eleição de julho

López Obrador aparece no meio, ao lado de uma mulher, cujo rosto aparece pela metade e cercado pelos braços de outras pessoas, que carregam celulares; ao fundo outros dois homens acompanham a cena
O candidato presidencial esquerdista Andrés Manuel López Obrador tira fotos com seguidores ao deixar evento de campanha no bairro de Coyoacán, na Cidade do México - Rebecca Blackwell - 7.mai.18/Associated Press
Clóvis Rossi
Cidade do México

O espírito da campanha eleitoral para o pleito presidencial de 1º de julho no México está bem resumido em um "spot" de José Antonio Meade, candidato do PRI (Partido Revolucionário Institucional), hoje no governo como na maior parte dos últimos 70 anos: "Miedo o Meade" (pronuncia-se "miade", o que configura a rima).

O medo é uma alusão à perspectiva de vitória de AMLO (como é mais conhecido Andrés Manuel López Obrador), um dos raros esquerdistas com chances de vitória nas eleições mais recentes da América Latina.

Mais que chances de vitória, López Obrador é firme favorito. Nesta terça-feira (8), em seminário do Rial (Conselho de Relações Internacionais da América Latina e o Caribe), houve sessão com cinco acadêmicos destacados do México —simpatizantes ou críticos do favorito— na qual deixaram claro que tratam como definida a vitória de AMLO.

Reforça a Eurasia, respeitada consultoria, ao cravar em 70% as chances de vitória do líder esquerdista.

Essa perspectiva ajuda a entender por que López Obrador se tornou o alvo da propaganda hostil como a de Meade ou a de Ricardo Anaya, candidato do conservador Partido de Ação Nacional, segundo colocado nas pesquisas até agora.

Ajuda a entender também o tiroteio verbal entre AMLO e o empresariado, que de certa forma lembra o que houve em 1989, quando Mário Amato, então presidente da Fiesp, disse que 800 mil empresários abandonariam o país se Luiz Inácio Lula da Silva vencesse.

No México, foi a campanha de López Obrador quem disparou o primeiro tiro. Paco Ignacio Taibo, secretário de Arte e Cultura do partido de AMLO, insinuou que haveria expropriação de empresas se seus donos se recusarem a cooperar com López Obrador se ele ganhar a eleição.

Era natural que o empresariado ficasse ressabiado, mas coube ao próprio candidato presidencial acender a fogueira. Afirmou: "De vez em quando, é preciso fazer ver a eles [os empresários] que não são os donos do México".

O Conselho Mexicano de Negócios (entidade patronal) entrou no tiroteio para lembrar a López Obrador que o setor privado gera 90% dos postos. É fato, mas é igualmente fato que 8 de cada 10 trabalhadores estão em pequenas e médias empresas —até aqui, ausentes do confronto verbal.

Se, antes, a campanha dos adversários já atiçava o medo a uma gestão López Obrador, depois da polêmica radicalizou-se. Juan Pablo Castañon, presidente do Conselho Coordenador Empresarial, o conglomerado das grandes empresas, por exemplo, disse que há risco de "fratura social" se AMLO vencer.

Há frequentes "spots" tanto de Meade como de Anaya procurando comparar AMLO ao venezuelano Hugo Chávez. Ou seja, López Obrador levaria o México ao colapso que caracteriza a Venezuela chavista.

Parece um enorme exagero, mas Luis Foncerrada, diretor-geral do Centro de Estudos Econômicos do Setor Privado, disse à Folha que AMLO está dando um tiro no próprio pé. Explica: o investimento privado no México, em 2017, atingiu o pico (19,2% do PIB), enquanto o investimento público está em retração há anos.

Se os investidores privados se retraírem com a vitória de López Obrador, a economia, que vem de três décadas de crescimento muito baixo, sofreria inevitavelmente.

O crescimento medíocre é uma das razões para a liderança de AMLO nas pesquisas, como candidato crítico aos partidos que governaram, a rigor desde a independência.

Quais as chances de que ele repita Lula, que se acomodou ao empresariado após ganhar em 2002? Os acadêmicos que estiveram no seminário que a Folha acompanhou nesta terça-feira acreditam que um entendimento vai ocorrer.

Diz o professor de economia Victor Godinez: "AMLO sabe negociar, como já demonstrou quando foi prefeito da Cidade do México [2000 a 2005]. E os empresários não podem levar as fábricas para fora do país".

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