Investidor ajudou EUA em diálogo com Kim

Com negócios pré-sanções na Coreia do Norte, Gabriel Schulze abriu canal entre regime e Jared Kushner, genro de Trump

O presidente Donald Trump e o ditador norte-coreano Kim Jong-un caminham para aperto de mão histórico em reunião em Singapura, em 12 de junho
O presidente Donald Trump e o ditador norte-coreano Kim Jong-un caminham para aperto de mão histórico em reunião em Singapura, em 12 de junho - Evan Vucci - 12.jun.18/Associated Press
Mark Mazzetti e Mark Landler
Washington | The New York Times

Um financista americano chamado Gabriel Schulze acenou ao governo Trump com uma proposta incomum: o regime norte-coreano queria conversar com Jared Kushner, genro e principal assessor do presidente.

Schulze explicou que uma importante autoridade da Coreia do Norte procurava um canal lateral para sondar a possibilidade de uma reunião entre o presidente Donald Trump e Kim Jong-un, que durante meses haviam trocado ameaças de confronto militar. 

Com residência em Singapura, Schulze construiu uma rede de contatos na Coreia do Norte durante viagens que fez para desenvolver oportunidades de negócios no Estado isolado. Para o regime, Kushner parecia um contato promissor.

Pyongyang julgava que, como membro da família do presidente, ele teria acesso ao sogro e estaria imune às mudanças de pessoal que tumultuaram os primeiros meses do governo. 

O gesto silencioso de Schulze foi apenas um passo em um caminho sinuoso que levou ao aperto de mãos na semana passada entre Trump e Kim em um hotel em estilo colonial numa ilha em Singapura —caminho que envolveu reuniões secretas entre espiões, conversas entre empresários de olho nos lucros e um papel antes não relatado de Kushner, segundo entrevistas com autoridades americanas atuais e passadas e outras pessoas inteiradas das negociações.

Ao procurar Kushner, os norte-coreanos seguiam o exemplo dos chineses, que antes tinham identificado o marido de Ivanka Trump como uma espécie de príncipe-consorte bem conectado, por meio do qual se pudesse contornar a burocracia do Departamento de Estado.

Quando procurou a Casa Branca, Schulze estava se aproveitando de uma abertura incomum em um governo em que as questões políticas e de negócios muitas vezes parecem se misturar. 

Outras figuras além de Schulze tiveram papéis importantes para a realização da cúpula entre Trump e Kim, como o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, que foi um mediador incansável. Mas pessoas que conhecem as negociações disseram que os primeiros contatos de Schulze foram úteis para pôr em ação a diplomacia até o encontro. 

Kushner, porém, não teve um papel direto nas negociações com autoridades norte-coreanas, segundo pessoas inteiradas da questão. Ele notificou Mike Pompeo, o diretor da CIA na época, sobre a proposta de Schulze e pediu que a CIA se encarregasse das discussões.

Não está claro por que Kushner achou que a CIA --e não o Departamento de Estado-- deveria assumir a liderança, embora ele tivesse uma relação antagônica com Rex Tillerson, secretário de Estado à época, e uma boa relação com Pompeo. 

A Casa Branca e a CIA não quiseram comentar o contato de Kushner com Schulze.

Para Schulze, herdeiro de uma família que ganhou bilhões de dólares com mineração, uma distensão no relacionamento dos EUA com a Coreia do Norte seria potencialmente lucrativo.

Sua firma, a SGI Frontier Capital, adota uma estratégia de alto risco de investir nos chamados mercados de fronteira, como Etiópia, Mongólia e outros. Ele fez diversos pequenos negócios com a Coreia do Norte antes que o governo Obama impusesse novas sanções econômicas em 2016.

"Acredito que a oportunidade seja encontrada na borda de nossa zona de conforto", disse ao Financial Times em 2013. Agora, em comunicado, Schulze afirmou: "Não discuto a natureza de meus negócios ou minhas relações pessoais". 

Outras pessoas já haviam se oferecido como mediadoras para negociar com Pyongyang, mas sem sucesso.

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