Descrição de chapéu The New York Times

Astro do esporte e sex symbol é favorito para comandar Paquistão

Lenda do críquete, Imran Khan é visto por seus críticos como um fantoche das Forças Armadas

Imran Khan fala à imprensa após votar em Islamabad (Paquistão)
Imran Khan fala à imprensa após votar em Islamabad (Paquistão) - Athit Perawongmetha/Reuters
Lahore (Paquistão) | The New York Times

Imran Khan, 65, lendário jogador de críquete e sex symbol internacional, está a ponto de se tornar o líder do Paquistão, uma república islâmica dotada de armas nucleares?

Khan ganhou fama nos campos de críquete do planeta e nas casas noturnas de Londres. Mas, nas duas décadas em que vem batalhando por um posto político importante no Paquistão, passou por uma complicada transformação.

Tornou-se um muçulmano dedicado, protestando contra os Estados Unidos e se distanciando de suas passado festivo —ainda que a organização política que ele representa use um taco de críquete como símbolo. 

E, nesta quarta-feira (25), quando o Paquistão realiza eleições nacionais, Khan é o líder partidário visto como mais provável candidato a emergir com possibilidades reais de formar um governo.

Khan desfruta de popularidade genuína em todo o seu país e de relações cordiais com as Forças Armadas, que controlam a política do Paquistão. Usou sua celebridade, seu carisma e seu dinheiro para conduzir uma campanha contra a corrupção, uma das questões mais unificadoras em um país pobre que enfrenta múltiplas divisões.

Os paquistaneses viram uma dinastia política após a outra fazendo fortuna enquanto o país despencava. 

Os hospitais públicos estão abandonados e deteriorados; a mortalidade infantil do país atingiu níveis mais altos do que em praticamente qualquer outra nação da Ásia; incontáveis paquistaneses jovens fogem do país a cada ano em busca de emprego como motoristas, zeladores ou operários da construção civil no exterior, devido à completa carência de empregos decentes em seu país.

Khan se apresenta como o antídoto populista a tudo isso.

“Ele não tem escândalos diretos de corrupção atribuídos a sua pessoa, o que é raro no Paquistão, especialmente entre os políticos”, disse Raza Rumi, conhecido jornalista paquistanês que trabalha como analista político no Instituto de Assuntos Públicos da Universidade Cornell.

Mas não é só a imagem limpa de Khan que explica seu sucesso, na atual campanha.

Crescem as provas de que as autoridades militares do país estão envolvidas em forte manipulação política. Ativistas dos direitos humanos e rivais políticos de Khan acusam as Forças Armadas de tomarem por alvo seletivamente os oponentes de Khan, e de amordaçarem a imprensa quando esta o critica.

O líder daquele que era o principal partido político paquistanês, Nawaz Sharif, que foi primeiro-ministro três vezes, terminou detido pela polícia menos de suas semanas atrás. 

Um ano atrás, os juízes da Suprema Corte paquistanesa o destituíram do posto em uma decisão que foi vista por muitos como tendo sido tomada por pressão das Forças Armadas.

Muitos membros do partido de Sharif desertaram, no que observadores descrevem como uma campanha dirigida pelos serviços de segurança para decapitar a organização, conhecida pelas iniciais PML-N.

O padrão da carreira política de Khan até o momento vem sendo o de um desempenho inferior ao esperado, a despeito de suas vantagens, mas nesta eleição ele talvez tenha tanta vantagem que fracassar se torne impossível.

Khan tem voz grave e soa confiante e relaxado, como uma pessoa que tem os pés no chão. Mas ao mesmo tempo parece um pouco distante.

E insiste em que não trabalha a mando do Exército —ainda que expresse apoio às Forças Armadas.

“Creio que um governo democrático governe por sua autoridade moral”, disse Khan em entrevista ao The New York Times algumas semanas atrás. 

“E, se você não tem autoridade moral, aqueles que têm autoridade física se afirmam. Em minha opinião, o Exército do Paquistão não é um exército inimigo. Terei o Exército comigo.”

As Forças Armadas do Paquistão governaram diretamente o país por boa parte de sua história e pelo resto do tempo se intrometeram seriamente nos assuntos políticos. Muitos analistas exprimem ceticismo diante das afirmações de independência de Khan.

“Ele é o fantoche das Forças Armadas”, disse Christine Fair, analista política da Universidade de Georgetown. 

“Está onde está agora por causa do Exército e do ISI [o serviço de inteligência militar], que se envolveram em imensa manipulação antes da votação e continuarão a fazê-lo no dia da eleição e depois para garantir a vitória de uma coalizão liderada por Imran Khan.”

De que maneira Khan governará, então?

O Paquistão é um país importante, o sexto mais populoso do mundo, conta com armas nucleares e sua situação geopolítica é complicada, por causa da inimizade duradoura com a Índia e do apoio a organizações militantes que agem em seu nome, como o Taleban no Afeganistão.

Khan disse que gostaria de promover a paz com a Índia. E ainda que tenha criticado algumas das ações violentas do Taleban, também defendeu publicamente a organização e seus objetivos. 

Ele adotou uma postura linha dura para com os Estados Unidos, se queixando amargamente dos ataques por drones [aeronaves de pilotagem remota] americanos em território paquistanês e definindo a guerra contra o terrorismo como “loucura”.

“Sua política externa é certamente antiamericana”, disse Omar Wairach, diretor-assistente das Anistia Internacional para o sul da Ásia.

Na frente interna, Khan —ou quem quer que seja o vencedor— provavelmente enfrentará problemas incontornáveis, com a queda persistente da economia paquistanesa e a crise em muitos dos ativos públicos do país, como as redes de eletricidade e de água.

Ainda que as credenciais pessoais de Khan como governante continuem não comprovadas, seu partido governa a província de Khyber-Pakhtunkhwa, vasta mas esparsamente povoada, desde 2013. 

O desempenho do partido no governo provincial não é totalmente positivo, mas a agremiação vem sendo elogiada pela melhora nos serviços públicos.

Se o partido não conquistar maioria clara na quarta-feira, as coisas podem se complicar.

Khan disse que não formará uma coalizão com qualquer dos dois outros grandes partidos, afirmando que são corruptos demais para uma aliança. O resultado pode ser um legislativo fraco e fraturado, que pode ser incapaz de afirmar seu poder.

Khan teve uma vida encantada, embora nem sempre coerente.

Filho de uma família privilegiada, educado na Universidade de Oxford, amante de muitas mulheres belas e famosas e um astro visto como um dos melhores jogadores da história do críquete, as experiências dele e as dos paquistaneses comuns não poderiam ser mais diferentes.

“O comportamento dele no passado, isso é problema dele”, disse Tanveer Haider, um operador de guindaste paquistanês que trabalha no Oriente Médio e viajou para casa esta semana para votar no partido de Khan. “O que me importa é o que ele fará pelo país. De todos os políticos, é ele que fará mais.”

Os analistas afirmam que o Paquistão está desesperado por mudanças, e é isso que Khan representa.

“Uma vasta seção dos paquistaneses urbanos, mas nem todos eles, está cansada dos dois partidos”, disse Rumi, o analista e jornalista político. “As pessoas sentem que é preciso deixar esses partidos para trás, e Khan é a saída.”

Tradução de Paulo Migliacci

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