Espanha removerá ossada de general fascista de catedral em Sevilha

Despojos de Queipo de Llano serão levados a cova discreta; decisão acirra polêmica sobre Franco

Seis pessoas segurando duas bandeiras da Espanha fascista fazem gesto de saudação fascisrta, com a mão em riste, diante de mausoléu
Manifestantes protestam contra decisão do governo espanhol de retirar os despojos do ditador Francisco Franco do mausoléu do Vale de los Caídos, que deve ser transformado em monumento aos mortos pelo seu regime - Javier Barbancho - 15.jul.18/Reuters
Madri

A ossada de um dos generais mais sanguinários da história moderna espanhola, Gonzalo Queipo de Llano (1875-1951), deve ser removida de uma capela em Sevilha e levada para outro sepulcro, deixando o lugar de destaque que tem hoje no templo. A decisão foi anunciada na terça-feira (17) e pode ser cumprida até o Natal, em meio a todo um debate social sobre a memória histórica.

Queipo de Llano foi um dos principais líderes militares da Guerra Civil Espanhola, de 1936 a 1939. Ele conquistou e comandou a cidade de Sevilha, onde ordenou o fuzilamento de seus inimigos.

A decisão de mover sua ossada para um lugar de menos destaque coincide com os recentes esforços do governo do primeiro-ministro socialista, Pedro Sánchez, de desenterrar também o ex-ditador Francisco Franco, que liderou o país de 1939 até morrer em 1975.

O premiê anunciou os planos de exumar Franco quando tomou posse, em junho, e nesta semana voltou a insistir em que a remoção virá em breve —o caudilho está enterrado no monumento do Vale dos Caídos, ao noroeste de Madri, abaixo de uma cruz de 130 metros de altura e ladeado pelas ossadas de mais de 30 mil combatentes.

A ideia é que o país retire do ditador o status que tem no vale, onde é visitado a diário por seus seguidores. A reportagem da Folha recentemente presenciou, por exemplo, diversos espanhóis fazendo gestos fascistas diante da tumba.

Com isso, o governo quer seguir adiante na reconciliação nacional ainda em aberto, mesmo após o país ter concluído nos anos 1970 seu processo de democratização, encerrando seu longo período de ditadura.

Além da exumação de Franco, também é iminente a retirada dos restos mortais de combatentes enterrados ao lado dele, tanto aqueles que lutaram a seu favor quanto aqueles que queriam derrotá-lo.

O Vale dos Caídos, inaugurado em 1959, foi de início apresentado como um símbolo da conciliação entre ambos os bandos após o fim da guerra civil. Mas as famílias dos soldados nunca foram avisadas ou consultadas e, hoje, lutam na justiça para recuperar as ossadas de seus antepassados. Hoje, portanto, o vale é um símbolo da ditadura.

A remoção da ossada de Queipo de Llano, em Sevilha, se insere nesse mesmo contexto. Existe ademais uma lei regional ali que proíbe “elementos contrários à memória democrática” em edifícios particulares que tenham uso público, segundo o jornal espanhol El País. Com isso, a basílica decidiu agir antes de ser penalizada pelo governo.

Há na última década um crescente interesse por exumações na Espanha, e não apenas aquelas relacionadas ao ex-ditador Franco e seus generais. É um fenômeno descrito pelo antropólogo espanhol Francisco Ferrándiz como uma “autópsia social”  —a busca por revirar o passado que durante um longo período esteve por debaixo da terra.

A recuperação das ossadas dos combatentes da Guerra Civil é considerada uma maneira de questionar as narrativas oficiais e buscar reparações. Não apenas as ossadas dos guerreiros, aliás. Os restos mortais mais célebres sob busca durante os últimos anos na Espanha são os do poeta Federico García Lorca, fuzilado em 1936.

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