Herdeiro de clã político Bhutto faz campanha para ser premiê do Paquistão

Filho de Benazir Bhutto, assassinada em 2007, Bilawal tenta levar a família de volta ao poder

Saad Sayeed
Thatta (Paquistão) | Reuters

Sua mãe foi assassinada enquanto fazia campanha e seu avô foi executado por um ditador militar, mas isso não impediu Bilawal Bhutto Zardari de buscar o cargo que ambos exerceram: primeiro-ministro do Paquistão.

Solteiro e formado pela Universidade de Oxford, Bhutto Zardari, 29, está fazendo campanha pela primeira vez, atravessando as grandes planícies de sua província natal, Sindh, por seu partido de centro esquerda, o PPP (Partido Popular do Paquistão), antes da eleição geral de 25 de julho.

Ele ainda estava na universidade em 2007 quando sua mãe, a duas vezes primeira-ministra Benazir Bhutto, foi assassinada enquanto fazia campanha para restaurar a democracia no país após um governo militar. O pai dela, o também primeiro-ministro Zulfikar Ali Bhutto, foi deposto em um golpe militar e enforcado em 1979. 

Bilawal Bhutto Zardari durante comício em Thatta, no Paquistão
Bilawal Bhutto Zardari durante comício em Thatta, no Paquistão - Akhtar Soomro - 2.jul.2018/Reuters

“Eu não escolhi esta vida, não saí à procura dela”, disse Bhutto Zardari à agência de notícias Reuters, falando do alto de seu ônibus blindado de seis metros de altura e capota aberta. “Minha mãe sempre dizia que não escolheu essa vida, que foi essa vida que a escolheu. É o que acontece comigo também.”

Perguntado se sente medo quando está em campanha, ele respondeu apenas: “Não”. Em seguida começou a falar do “clima de medo” neste período que antecede as eleições, atribuído por alguns ativistas aos poderosos militares do Paquistão.

Em uma das primeiras entrevistas que concede desde que foi escolhido o candidato do PPP a primeiro-ministro, Bhutto Zardari criticou o líder oposicionista Imran Khan, também formado em Oxford e potencial parceiro seu em uma possível coalizão.

Cercado por partidários nos dois lados da avenida de pista única, o candidato tomou uma chuva de pétalas de rosas e acenou para milhares de pessoas que aguardavam para ter um vislumbre do membro mais jovem da dinastia política descrita por muitos como o equivalente paquistanês aos Kennedy.

Apesar do ambiente de otimismo dominante na multidão, a época eleitoral sempre é tensa no Paquistão, país governado por militares por quase metade dos 70 anos passados desde sua independência.

O governo da LMP-N (Liga Muçulmana do Paquistão-N) acusou os militares e os tribunais de participação na deposição do primeiro-ministro Nawaz Sharif, no ano passado, e de beneficiar o partido político de Imran Khan, o PTI.

Khan, ex-capitão da equipe de críquete do Paquistão, rejeita a acusação e descreve a LMP-N como uma “máfia” corrupta.

O receio que paira sobre tudo isso é que a eleição esteja sendo manipulada pelo “establishment”, eufemismo usado para designar as temidas Forças Armadas e as agências de inteligência do Paquistão, juntamente com alguns altos funcionários do executivo e do Judiciário. 

As Forças Armadas rejeitaram várias vezes a ideia de que elas interfiram na política moderna.

“Acho que existe sem dúvida um histórico no país de um papel excessivamente ativo de nosso establishment, e o Partido Popular do Paquistão considera que isso não deveria acontecer”, disse Bhutto Zardari, perguntado sobre o envolvimento dos militares na política.

“Existe sem dúvida o sentimento de que determinados candidatos se sentem pressionados, sentem que determinados partidos políticos estão sendo apoiados de maneira indevida”, ele prosseguiu. “Acho que todos devem ter confiança na população paquistanesa e sua capacidade de fazer suas próprias escolhas.”

Influência política 

O comboio de Bhutto Zardari começou na cidade de Thatta, a capital medieval da província de Sindh, e se dirigiu ao norte, para as províncias de Punjab e Khyber Pakhtunkhwa, com a esperança de reativar a base de eleitores que perdeu na eleição de 2013, quando foi o segundo colocado.

Uma pesquisa nacional do Instituto Gallup em março avaliou a popularidade do PPP em 17%, com o PTI de Imran Khan recebendo 24% e a LMP-N, de Nawaz Sharif, 36% do apoio popular.

Um dos desafios do PPP é superar a imagem do pai de Bhutto Zardari, o ex-presidente Asif Ali Zardari. Para alguns analistas, as muitas acusações de corrupção feitas a Zardari podem prejudicar o PPP nas eleições, formando um contraste com a forte mensagem anticorrupção de Imran Khan.

Zardari passou 11 anos na prisão por acusações de corrupção e homicídio, mas nunca chegou a ser condenado. Ele sempre afirmou sua inocência e continua a ser líder do partido e assessor de seu filho.

Embora Bhutto Zardari esteja fazendo campanha para primeiro-ministro, muitos analistas políticos acham que, se nenhum partido político conquistar uma maioria clara, como parece provável, o PPP poderá na melhor das hipóteses ser uma voz de influência na política, que poderá ajudar a definir lideranças.

Bhutto Zardari já indicou que estaria disposto a participar de um possível governo de coalizão, mas não disse se preferiria se aliar à  LMP-N ou ao PTI.

Ele declarou que o socialmente conservador PTI “promove a política do ódio, da polarização, da divisão”.

“Isso pode garantir uma vitória eleitoral para Imran Khan, mas terá consequências desastrosas para os jovens paquistaneses e para a sociedade nacional”, disse Bhutto Zardari.

Ele foi citado na mídia local como tendo descrito a LMP-N como “governante cruel” e dito que o partido “decidiu eliminar os pobres, não a pobreza”.

Bhutto Zardari disse que ambiciona não apenas tornar-se primeiro-ministro, mas trazer de volta as políticas públicas defendidas por sua mãe, cujo nome ele menciona com frequência em seus discursos de campanha.

“Precisamos cumprir a promessa de B.B. Precisamos salvar o Paquistão”, ele diz em urdu, a língua nacional, usando as iniciais pelas quais sua mãe era conhecida.

“Não existe maior realização na vida de um filho que sentir que está levando adiante as missões que sua mãe não pôde concluir.”

Tradução de Clara Allain

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