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Relação com Forças Armadas é o que realmente importa no Paquistão

Vencedor de eleições, Imran Khan sabe que não se governa no país sem apoio de militares

 
Apoiadores de Imran Khan comemoram sua vitória nas eleições no Paquistão, nesta quinta-feira (26) - Rizwan Tabassum/AFP
 
São Paulo

A fracionada política paquistanesa entregou uma novidade para o Ocidente, Imran Khan, como vencedor da eleição desta quarta-feira (25).

O que importa mesmo, para a grande nação muçulmana do sul asiático e para o mundo, é como o ex-capitão da equipe nacional de críquete irá lidar com o poder real de seu país: as Forças Armadas.

Dirigentes diretos do Paquistão em metade de suas sete décadas de vida, eleitores e carrascos de presidentes e primeiros-ministros, os militares são o centro da vida política local e não parecem ter gostado muito de terem sido alijados de lá desde 2013.

Naquele ano, um premiê que havia sido derrubado por golpe militar em 1993, Nawaz Sharif, voltou ao poder.

Ficou até o meio do ano passado, quando a Justiça o afastou e prendeu por mais uma acusação de corrupção.

A oposição militar a seu partido, a personalíssima Liga Muçulmana do Paquistão-Nawaz (sim, de Sharif), levou apoiadores do ex-premiê e outros políticos a acusar o Exército de fomentar fraudes para dar o poder ao PTI de Khan.

Ele, contudo, parece longe de ser um clássico marionete dos quartéis. É um crítico duro da associação entre o Exército e os EUA no combate à chamada guerra ao terror, na esteira dos ataques de 2001.

A estimativa é de que mais de 60 mil pessoas morreram, no Paquistão, em ambos os lados no conflito desde então.

Mas Khan, por toda sua retórica, não é burro. Não se governa no Paquistão sem alguma medida de apoio militar, e o fato de ele ter ampliado a crítica aos EUA e elogiado a associação crescente com a China é sinal de que topará o rumo geopolítico atual do país.

Aqui entra o interesse maior sobre o que acontece no Paquistão. Se parece imaterial, basta lembrar que o fato de que todo mundo precisa quase se despir para pegar um voo internacional é cortesia de conflitos originários daquele canto do mundo.

Os EUA fecharam a torneira que pingava US$ 1,1 bilhão anual para Islamabad por ordem de Donald Trump, e a já presente Pequim tende a ocupar mais espaços.

Para os grandes atores da política no Paquistão, e Khan subscreve isso com o desejo de uma solução para a disputa sobre a Caxemira dividida com a Índia, o foco sempre se dirige à rival Nova Déli.

Como os indianos estão próximos de Washington, talvez haja uma confluência do nacionalismo de Khan com os interesses do Exército.

Se isso levará a um estado mais exacerbado de tensões com a Índia, é incerto, mas o fato de o astro do críquete ter defendido no passado negociações com terroristas como o Taleban paquistanês não sugere pacificação no setor.

Khan também pode estimular ruídos por manter boa relação com o Irã, adversário geopolítico de Trump.

Não só em Washington. As Forças Armadas paquistanesas são muito ligadas à Arábia Saudita, adversária de Teerã. Tanto é assim que são consideradas uma reserva última do reino no caso de conflito com os iranianos, já que têm a bomba atômica.

O fato de a eleição ser contestada e ainda não estar certa a condição de montagem de governo para Khan favorece os militares. Como o político é conhecido por seu voluntarismo, fragilidade parlamentar pode ser o melhor meio para tourear suas intenções.

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