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Brasil tem lei avançada para proteger imigrante, mas falta efetividade

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Venezuelana e sua filha na rua em Boa Vista (RR), cidade que tem cerca de 2.000 imigrantes morando nas ruas - Mauro Pimentel/AFP
Roberto Quiroga Bianca S. Waks
São Paulo

O agravamento da crise na Venezuela já deslocou para o Brasil mais de 52 mil pessoas em situações migratórias diversas ou em situação irregular. Destas, 25 mil são solicitantes de refúgio.

O status de refugiado deve ser concedido, nos termos da Declaração de Genebra de 1951, àqueles que se deslocam em razão de fundado temor de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, opinião política ou participação em grupos sociais.

Na América Latina, a Declaração de Cartagena de 1984 ampliou a definição ao incluir também "a violação maciça dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública".

O Brasil incorporou tais normativos em sua ordem interna por meio de lei nº 9.474/1997 ao incluir entre as hipóteses de refúgio as situações de grave e generalizada violação de direitos humanos, além de reconhecer os direitos de que refugiados não sejam devolvidos aos territórios onde se encontravam em perigo --princípio do "non refoulement"-- e de que tenham acesso aos direitos econômicos e sociais.

Mais recentemente, a nova Lei de Migração (lei n° 13.445/2017) introduziu diretrizes inovadoras.

Embora sua regulamentação tenha sido alvo de críticas, previu o fortalecimento da integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, o repúdio à xenofobia, ao racismo e à discriminação, e a garantia de que estrangeiros possam acessar serviços públicos e o mercado de trabalho.

Instituiu, ainda, o visto temporário para acolhida humanitária, que poderá ser concedido, entre outros, aos nacionais de qualquer país em situação de grave ou iminente instabilidade institucional.

Face ao expressivo contingente de venezuelanos em Pacaraima (RR) e em Boa Vista, a ONU se manifestou recentemente convocando o Brasil a considerar que as amplas circunstâncias que culminam na saída de nacionais daquele país se enquadram no conceito de grave e generalizada violação de direitos humanos, resultando, assim, em uma presunção relativa de necessidade de proteção internacional.

Em sentido convergente foi o entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) na Ação Cível Originária n° 3.121 ao indeferir os pedidos de fechamento temporário da fronteira do estado de Roraima com a Venezuela. Em decisão monocrática, a ministra Rosa Weber se valeu da ampliação do conceito de refugiado para afirmar o dever de proteção humanitária aos Estados signatários da Declaração de Cartagena.

Ainda que o Brasil disponha de uma legislação avançada com diferentes vias por meio das quais venezuelanos poderiam, em tese, ter sua situação migratória regularizada, há, no entanto, muito desconhecimento e pouca efetividade. A complexidade da crise de um país fronteiriço, em que a acentuada recessão econômica compromete a garantia de direitos sociais, demanda do estado brasileiro a adoção de medidas efetivas de proteção e acolhimento.

Não obstante os desafios institucionais e financeiros para o desenvolvimento de políticas públicas --que sejam adequadas às responsabilidades e atribuições dos diferentes níveis federativos--, é fundamental que o Brasil seja capaz de oferecer resposta condizente com os compromissos assumidos internacionalmente, no sentido de acolher os que não encontram meios de permanecer em seus territórios com dignidade.

Roberto Quiroga e Bianca S. Waks
Sócio e coordenadora da prática pro bono do escritório Mattos Filho

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