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Ex-executiva é incumbida de negociar com sindicatos reforma na França

Ministra do Trabalho, Muriel Pénicaud é responsável por comandar mudança na legislação

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Liz Alderman
Paris | The New York Times

Muriel Pénicaud é o tipo de figura que os manifestantes franceses adoram atacar. Uma ex-executiva de recursos humanos. Uma tenaz negociadora que briga com os sindicatos. E uma amiga de líderes empresariais e das elites políticas.

Em breve poderá haver mais coisas que atraiam a objeção popular.

Como ministra do Trabalho da França, e o membro mais rico do gabinete de governo, Pénicaud recebeu as rédeas para efetuar a tarefa divisora de reformular o código do trabalho da França, famoso por seu volume. Em um país onde as manifestações comandadas pelos sindicatos muitas vezes forçaram os governos a recuar em seus planos de reforma econômica, não é um emprego fácil.

A ministra do Trabalho da França, Muriel Pénicaud, chega ao Palácio do Eliseu, em Paris
A ministra do Trabalho da França, Muriel Pénicaud, chega ao Palácio do Eliseu, em Paris - Eric Feferberg - 17.jul.2018/AFP

"A França não terá êxito se continuarmos em conflito entre nós", disse ela em uma entrevista. "É urgente tomarmos medidas, porque o mundo mudou."

A campanha para renovar a economia francesa, uma das principais políticas do presidente Emmanuel Macron, envolve seguir na direção de um modelo de leis trabalhistas no estilo nórdico, conhecido como "seguridade flexível". As mudanças visam reequilibrar o Estado do bem-estar social criando maior flexibilidade para as empresas contratarem e demitirem, enquanto oferece mais treinamento e apoio para ajudar os trabalhadores na transição para novos empregos.

Pénicaud foi vital para introduzir essas mudanças. No último ano, ela cortou algumas das partes mais queridas do livro de regras de 3.300 páginas, em nome de refazer o capitalismo francês. O principal foi descentralizar os acordos de negociação coletiva, antes considerados intocáveis, e permitir que as empresas fechem seus próprios acordos com os trabalhadores.

Agora ela está negociando a próxima fase da "seguridade flexível à francesa": uma reforma dos ineficientes programas de treinamento do país, assim como uma remodelagem dos programas de desemprego, para expandir os benefícios aos empresários autoempregados e endurecer os controles sobre os que buscam emprego.

Tais atos incomodaram os críticos, que a acusam —e a Macron— de se importar menos com os trabalhadores do que com as empresas. Os críticos dizem que Pénicaud está fora de contato com os trabalhadores comuns, e ela foi alvo de uma investigação sobre o envolvimento em um lucrativo contrato sem licitação do governo.

Pénicaud insiste que está lutando para superar os obstáculos ao que Macron chamou de mudanças essenciais para a França.

Para garantir as atualizações no código de trabalho, ela conduziu uma blitz de negociação de 300 horas com os chefes dos principais sindicatos e dos grupos empresariais franceses. Diferentemente da Escandinávia, onde o diálogo do governo com parceiros sociais tende a ser tranquilo, o relacionamento na França é mais confrontador. Assim, ela insistiu em se reunir com cada grupo individualmente para forjar relações e consenso, e os fez jurar confidencialidade para evitar posicionamentos conjuntos.

Uma reunião com um líder trabalhista de extrema-esquerda, Philippe Martinez, chefe do sindicato CGT, teve uma intensa discussão sobre preocupações de que o governo está enfraquecendo os direitos trabalhistas, segundo Pénicaud, mas afinal resultou em um acordo sobre questões de gênero no local de trabalho.

Outros conjuntos de conversas foram mais amistosos. Laurent Berger, diretor do maior sindicato francês, o reformista CFDT, declarou publicamente seu apreço pelo que chamou de visão de "desenvolvimento econômico com justiça social" da ministra.

Que a França precisa mudar não se discute.

Apesar de uma recuperação modesta, o desemprego continua acima de 9%, mais que o dobro do alemão. Um quinto dos jovens estão sem trabalho, e 40% dos desempregados continuam nessa situação durante até dois anos.

Ao mesmo tempo, quase 330 mil empregos estão vagos, enquanto os empregadores lutam para encontrar programadores, encanadores e outros profissionais experientes. A França poderá ter uma escassez de 2,2 milhões de trabalhadores qualificados até 2020, segundo a firma de consultoria global McKinsey & Co.

Pénicaud disse que a França precisa "renovar o modelo social" afrouxando as restrições às empresas e melhorando o treinamento técnico dos trabalhadores. "Visamos um crescimento inclusivo", disse ela. "Porque se os mais vulneráveis disserem 'eu não consigo subir a bordo' haverá perigo para a coesão social e a política."

Seu tempo na política foi relativamente limitado. No início dos anos 1990, ela trabalhou durante três anos para a ministra do Trabalho, a então socialista Martine Aubry, supervisionando políticas de treinamento profissional para jovens carentes e desempregados. Mas ela nunca entrou para o partido, observando certa vez que as mulheres na época tinham pouca responsabilidade além de "fazer café".

Seus adversários afirmam que ela não se relaciona com o trabalhador comum. Riqueza e poder são pontos de destaque para o populismo francês, e Pénicaud, que declarou bens pessoais de mais de 7 milhões de euros (R$ 31 milhões) quando assumiu o cargo, tornou-se alvo de críticos que acusam Macron de favorecer os ricos.

A imagem de uma ministra do Trabalho simpática aos interesses corporativos se firmou quando, agindo sob ordens de Macron, ela convenceu legisladores a aprovar as reformas que beneficiam as empresas por decreto, procedimento que contorna o longo processo parlamentar. Os críticos denunciaram que foi uma maneira de forçar reformas com pouca dissidência.

Em outubro passado, pouco antes que as novas regras fossem aprovadas, manifestantes cercaram um restaurante de luxo em Paris onde ela deveria participar de uma conferência, armados com folhetos dizendo "Procurada" e sua imagem, e sugerindo que ela fosse caçada. Dezenas de pessoas foram presas depois de choques com a polícia e carros queimados.

Sobre o ritmo e o estilo de seu esforço de reformas, ela não se desculpa. "Avançamos devagar demais nas reformas trabalhistas nos últimos 20 anos", disse, acrescentando que passar pelo processo legislativo teria demorado demais. "É um tempo que não temos."

O governo está no caminho certo, insistiu ela. Dezenas de milhares de novos empregos foram criados. Os investidores estrangeiros estão vindo à França.

Mas ela reconheceu que se as mudanças não melhorarem rapidamente a vida dos cidadãos comuns o risco de uma reação popular poderá aumentar.

Para Pénicaud, isso significa mover-se ainda mais depressa.

"A mudança pode criar medo, eu entendo", afirmou. "Mas não podemos mais manter a situação atual."

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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