Ponte de Gênova era sobrecarregada e insegura, diz caminhoneiro brasileiro

Ele passava por lá cinco vezes por semana e fez vídeo antes do desabamento

São Paulo

Uma estrutura mal conservada, sobrecarregada por carros e caminhões, com pilares pequenos demais para seu tamanho e sua extensão. Assim o caminhoneiro brasileiro Carlos Eduardo Fernandes, 39, descreve a ponte que desabou nesta terça-feira (14) em Gênova, deixando dezenas de mortos e feridos.

Natural de Rio Claro (SP), Fernandes, que mora na Itália com a mulher e os filhos há quatro anos, passava cerca de cinco vezes por semana pela ponte Morandi para fazer entregas para a loja onde trabalha. Não gostava, mas não tinha alternativa: na outra opção disponível, uma via à beira-mar, caminhões são proibidos. 

O brasileiro Carlos Eduardo Fernandes, que trabalha como caminhoneiro na Itália
O brasileiro Carlos Eduardo Fernandes, que trabalha como caminhoneiro na Itália - Arquivo pessoal

“Ontem mesmo, no fim da tarde, passei por lá. Mas nunca gostei. Este domingo eu estava falando isso com a minha mulher, que é uma ponte alta, estreita, muito comprida, velha. Quando eu passava por baixo, dava para ver os pilares e eram muito pequenos para o tamanho e a altura que ela tem”, conta.

Fernandes relata também que a ponte “vivia em manutenção”. “Tem reportagens de 2016 com engenheiros que já diziam que essa ponte poderia cair. A população sempre falou que ela era um perigo. Uma hora ou outra ia acontecer.”

Inaugurada em 1967, a Morandi não foi projetada, segundo o brasileiro, para a quantidade de caminhões que passaram a circular por ali. “Cheguei a pegar 40 minutos de engarrafamento lá em cima, tinha muito tráfego ali. A gente sentia ela balançar sozinha. Tudo bem que pontes balançam, mas não tanto como aquela”, afirma.

Ele diz que a ponte é uma via importante na cidade, um polo industrial e marítimo da Itália onde nasceu o navegador Cristóvão Colombo (1451-1506). A estrutura liga os três portos da região à rodovia que liga a cidade ao resto do país e à França, à Suíça e à Espanha.

Para Fernandes, o fato de ser véspera do feriado de Ferragosto —que coincide com o feriado católico da assunção e quando muita gente não trabalha— evitou uma tragédia maior.

De seu caminhão, Fernandes fez um vídeo na semana passada da ponte Morandi (veja abaixo):

Ele ficou sabendo do desabamento no grupo de WhatsApp da empresa. “Avisaram para quem estivesse indo para lá voltar. Um colega meu tinha atravessado a ponte uma hora antes do que aconteceu. Quem presenciou [a queda] disse que parecia um terremoto”, conta.

Segundo o caminhoneiro, a região onde fica Gênova tem várias outras pontes, algumas delas em um estado de conservação “de dar medo”. Um dos fatores que ajudam a danificar as estruturas, explica, é o sal que é colocado para derreter o gelo e a neve no inverno. “No inverno aquilo vira uma pista de gelo, e eles ficam 24 horas jogando sal para derreter.”

Moradora de Gênova desde 2005, a professora de inglês Gisella Iasi, 51, também diz que os moradores já reclamavam da segurança da ponte Morandi.

“Na época em que ela foi criada, falaram que era maravilhosa, que tinha algumas características na construção inéditas. Mas logo surgiram controvérsias e os especialistas alertaram que não era bem assim”, conta. “E quem mora ali perto reclamava que sempre estava em manutenção.”

Gisella é casada com um italiano que é oficial do Corpo de Bombeiros da cidade. Seu marido, que estava de folga, foi chamado minutos depois do acidente para ajudar a coordenar o resgate. Bombeiros de outras cidades vizinhas e até de outras regiões reforçam a equipe.

“Ele vai trabalhar pelo menos 24 horas seguidas, só vai voltar amanhã à tarde. Bombeiros, policiais, a Cruz Vermelha, representantes de hospitais, estão todos reunidos na prefeitura. Está uma loucura aqui”, afirma a brasileira.

Em nota, o governo brasileiro prestou condolência aos familiares das vítimas, à população e ao governo italiano. O Itamaraty informa que não há registro de brasileiros entre as vítimas até o momento.

Para assistência aos brasileiros, a Chancelaria disponibilizou os telefones (61) 2030-8803/8804 no Brasil e, no consulado em Milão, os números +39 02 777 107 1 (seg. a sex, de 8h às 12h30) e + 39 335 727 8117 (emergência).

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