Descrição de chapéu
Governo Trump

Artigo anônimo contra Trump divide NYT e abre corrida para revelar autor

Editores justificam publicação, criticada dentro do próprio jornal por ser ataque apócrifo

Nelson de Sá
São Paulo

No episódio mais recente do folhetim iniciado pelo artigo anônimo no The New York Times em que um funcionário de alto escalão ataca o governo Trump, a repórter Vivian Yee tentou aparentar bom humor ao relatar publicamente o assédio que vem enfrentando em seu telefone no próprio jornal.

Pela ordem, a seção de opinião resolveu publicar na quarta-feira (5) o texto contra Trump, sem consultar a redação; o presidente atacou o articulista “covarde”; sua porta-voz tuitou o número do jornal e falou para ligarem lá, cobrando o nome; e a mesa operadora do NYT passou a transferir as ligações para Vivian.

 
Homem usa smartphone em frente à sede do jornal The New York Times
Homem usa smartphone em frente à sede do jornal The New York Times - Angela Weiss/AFP

Embora a história tenha traços cômicos, como quase tudo que concerne Trump, é também uma nova amostra de degradação institucional, agora do principal jornal americano.

É questionável a publicação de artigo anônimo com ataque a quem quer que seja. Trata-se, de fato, de um autor covarde.

Os editores da seção de opinião, que é separada da redação, correram para dar entrevistas lembrando que já o fizeram antes, com articulistas ameaçados de países como Síria ou El Salvador —situações obviamente muito diversas.

Sobrou para o editor-executivo Dean Baquet, que não teria sido sequer avisado da publicação do texto, defender a publicação com um argumento mais aceitável, o de que era, afinal de contas, notícia.

Sua justificativa convenceu colunistas de mídia como Margaret Sullivan, do Washington Post e ex-NYT, e Howard Kurtz, da Fox News e ex-CNN, que passaram a defender o texto por ser “newsworthy”, merecedor de publicação como notícia.

Mas também é questionável que o seja. Outro repórter do The New York Times, Michael Schmidt, citou a reação de seu próprio pai para questionar o artigo apócrifo: “A gente já não sabia de tudo isso?”.

Se não é propriamente notícia, o artigo certamente causou sensação. Passou a polarizar o debate político nos Estados Unidos e pelo mundo, no lugar do livro de Bob Woodward, do Washington Post —que diz mais ou menos as mesmas coisas.

Não é de hoje que a seção de opinião do NYT, comandada há dois anos por James Bennet, chama a atenção mais pelo sensacionalismo do que por solidez ou por “ampliar o entendimento do público sobre o que está acontecendo”, como ele afirma, em sua defesa.

O primeiro colunista que contratou, o direitista Bret Stephens, questionou desde logo a mudança no clima, causando sensação em mídia social.

Desde quarta, como ironizou Kurtz, o jornalismo americano está numa corrida para levantar o nome do autor. A começar pelos repórteres do NYT, que não têm por que respeitar o anonimato, pois não se trata de fonte.

Enquanto isso, da Casa Branca em polvorosa, já vieram a público para deixar claro que não escreveram o artigo o secretário de Estado, o vice-presidente e até a primeira-dama, três dos mais citados nas casas de apostas, como MyBookie.

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