Direita populista deve ganhar espaço em eleição sueca neste domingo

De raízes neonazistas hoje expurgadas, o Democratas Suecos tem 18% das intenções de voto

Ulf Kristersson, líder dos Moderados, joga tênis de mesa durante campanha em Malmö, Suécia
Ulf Kristersson, líder dos Moderados, joga tênis de mesa durante campanha em Malmö, Suécia - Johan Nilsson/TT News Agency/Reuters
Carolina Vila-Nova
São Paulo

​​A Suécia realiza eleições nacionais neste domingo (9) com a perspectiva de um crescimento expressivo da direita populista nacionalista, que avançou no país com o argumento central de que o estado de bem-estar social está sob ameaça diante da crescente imigração.

De raízes neonazistas hoje expurgadas, mas ainda dono de uma retórica nacionalista, o Democratas Suecos (SD) aparece com 18,1% das intenções de voto. Além do endurecimento das leis de imigração, o partido defende um referendo sobre a saída do país da União Europeia.

Se as pesquisas se confirmarem, pela primeira vez o partido poderá ser a segunda força no Parlamento. Em 2010, o SD entrou no Parlamento pela primeira vez, com 5,7% dos votos. Nas últimas eleições, em 2014, atingiu 12,9%. 

"Até 2010 a Suécia era vista como exceção dentro da Europa por não ter partidos anti-imigração com representação no Parlamento. Nesse ano o SD fez sua estreia parlamentar, mas na ocasião a imigração não era um tema relevante para os eleitores ao decidir em que partido votar. Tradicionalmente, a política escandinava girava em torno de questões socioeconômicas, como seguro-desemprego, saúde, educação", afirmou Ann-Cathrin Jungar, que pesquisa a direita radical na Universidade Soderton.

Anders Sannerstedt, especialista sobre o SD na Universidade Lund, concorda: "A Suécia tradicionalmente adotou uma política generosa de imigração. Recebemos por exemplo muitos refugiados do Chile após o golpe contra Allende e a ditadura Pinochet, e das guerras civis na Iugoslávia nos anos 1990. Sempre houve um apoio relativamente amplo entre os partidos sobre essa questão".

Essa tolerância e solidariedade levou o cientista político Lars Trägardh a chamar a Suécia de "superpotência moral".

"Foi depois do ingresso parlamentar do SD que a imigração foi se tornando um tema crucial, e agora imigração, segurança, ordem pública são questões principais para os eleitores. De certa forma, o SD foi capaz de formular a agenda política, e os partidos tradicionais não foram capazes de responder a isso", diz Jungar.

A tendência anti-imigração se acirrou com a crise imigratória europeia de 2015, quando 163 mil requerentes de asilo foram recebidos pelo país. Em reação, o governo adotou uma política mais restritiva, e neste ano, chegaram 23 mil.

"Depois que o SD entrou no Parlamento, os partidos tentaram criar um cordão sanitário para isolá-lo, ao mesmo tempo em que começaram a adotar uma política imigratória mais liberal, gerando uma polarização. Assim, o SD se tornou o único partido a oferecer uma crítica à imigração", afirma Jungar.

"Só depois de 2015 os demais partidos começaram a reagir e reformular sua política, mas aí era tarde, o SD havia se tornado o 'proprietário' do tema e, ao falar de identidade sueca e fechamento de fronteiras, os outros partidos acabaram legitimando sua posição."

Ao mesmo tempo, o SD se desradicalizou, enquanto os partidos de direita e de esquerda foram se aproximando em suas posições socioeconômicas e de imigratória. 

"O SD argumenta que o estalishment negligenciou as necessidades e as preocupações do povo (o que é a principal ideia da ideologia populista)", afirma Sannerstedt. 

O SD disputa o segundo lugar com os Moderados (16,8%), que fazem campanha com uma plataforma de manutenção da lei e da ordem, de endurecimento da lei imigratória e de redução de impostos sobre a renda.

O Social Democratas (centro-esquerda), do atual premiê, Stefan Löfven, continua na liderança, com 25,6%, mas, como outras siglas trabalhistas no restante da Europa, viu seu apoio cair "“nas eleições de 2014, o partido obteve 31%.

Apesar de também pregar o endurecimento imigratório, defende uma expansão do estado de bem-estar social. 

Numa tentativa de atrair o eleitorado, o partido divulgou um manifesto na semana passada em que promete uma semana extra de férias para pais de crianças com idades entre 4 e 16 anos.

Hoje, os suecos com empregos de tempo integral gozam de cinco semanas de férias por ano, além de uma longa licença paternidade. "É difícil para muitos trabalhadores se afastarem quando as escolas estão de férias ou quando seus filhos estão estudando", diz o manifesto. "Por isso queremos dar mais tempo para ajudar os pais que trabalham."

Löfven disse que vai destinar o equivalente a R$ 15 bilhões nos próximos quatro anos para serviços de bem-estar social e para aumentar os gastos com policiamento e Forças Armadas.

Hoje Löfven lidera um governo de minoria ao lado do partido Verde. O mais provável é que a tradição de um governo minoritário seja mantida "“nos últimos 60 anos, apenas durante 8 houve um governo majoritário no país.

Os 349 membros do Riksdag, o Parlamento sueco, são eleitos por voto proporcional, 310 deles para representar as 29 circunscrições eleitorais --cada uma tem número fixo de assentos, dependendo da população. Os 39 restantes são divididos de acordo com os votos obtidos pelos partidos na votação nacional. Há uma cláusula de barreira para a entrada no Parlamento: 4% da votação nacional ou 12% da votação na circunscrição.

Todos os partidos se comprometeram a não cooperar com o SD. O problema é que, se nenhum bloco tradicional, à direita ou à esquerda, obtiver 40% dos assentos, o futuro governo terá de contar com o apoio ou da oposição ou da direita populista.

Caso o SD apoie uma votação parlamentar para derrubar Löfven após as eleições, algo apontado como possível por analistas suecos, o líder dos Moderados, Ulf Kristersson, pode se tornar premiê. 

Em entrevista ao diário britânico Financial Times, Kristersson disse que os suecos perderam a confiança no Estado, que agora está pagando o preço por 20 anos de políticas de integração "malsucedidas". 

A Suécia tem registrado recentemente ataques de granadas, tiroteios e incêndios a carros em subúrbios com grande presença de imigrantes em Estocolmo, Gotemburgo e Malmö. Em meados de agosto, cerca de cem carros foram incendiados em Gotemburgo e cidades vizinhas por gangues.

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