Descrição de chapéu

Ex-embaixadora dos EUA na ONU pode estar em busca de voos mais altos

Nikki Haley nega se candidatar à presidência em 2020, mas observadores não descartam

Patrícia Campos Mello
São Paulo

Desde que Donald Trump assumiu a presidência dos Estados Unidos, em 20 de janeiro de 2017, 23 altos funcionários – entre assessores e ‘ministros’  -  deixaram o governo ou foram demitidos. É uma rotatividade inédita no governo americano, alimentada por conflitos internos e acusações de corrupção (caso do ex-secretário de Saúde, Tom Price, e do ex-chefe da agência de proteção ao meio ambiente, Scott Pruitt).

Mas a saída da embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Nikki Haley, parece ser de uma natureza diferente.

Presidente dos EUA, Donald Trump, fala após a embaixadora dos EUA na ONU, Nikki Haley, anunciar sua renúncia, no Salão Oval
Presidente dos EUA, Donald Trump, fala após a embaixadora dos EUA na ONU, Nikki Haley, anunciar sua renúncia, no Salão Oval - Olivier Douliery/AFP

Para começar, ela não passou por um processo de fritura, como aconteceu com o ex-secretário de Estado, Rex Tillerson, que caiu em desgraça com Trump. O presidente americano até afirmou esperar que Haley volte à Casa Branca em um cargo diferente. “Ela tornou o cargo mais glamouroso e mais importante”, desmanchou-se Trump.

E, ao contrário de outros integrantes do governo Trump, Haley não saiu queimando pontes. Ela elogiou longamente o presidente. “Foi uma bênção poder entrar todos os dias na ONU vestindo uma armadura, para defender a América”, disse a embaixadora.

Haley divergia do presidente em muitos aspectos, às vezes publicamente. Ela foi muito mais crítica à Rússia do que Trump. Em dezembro, afirmou que as mulheres que acusavam Trump de assédio sexual “deveriam ser ouvidas”.  

Mas a embaixadora nunca deixou de cumprir à risca a política isolacionista dos EUA, mesmo sendo imensamente desconfortável para uma representante do país na ONU. Quando os EUA foram atacados por mudar a embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, Haley ameaçou cortar ajuda financeira dos países que criticaram a decisão. “Haverá votação de uma resolução na ONU criticando nossa escolha. Sim, nós iremos anotar os nomes (de todos que assinarem)”, disse.

Ela supervisionou a saída do EUA do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o corte do financiamento americano para a agência das Nações Unidas para refugiados palestinos, e defendeu sanções duras contra Irã e Venezuela.

Apesar de ela ter afirmado que não pretende se candidatar à Presidência em 2020, contra uma provável tentativa de reeleição de Trump, não se pode descartar que esteja em curso uma manobra para polir suas credenciais políticas. Haley sempre foi a integrante mais popular do governo Trump e era frequentemente mencionada como potencial candidata à presidência.

Em uma pesquisa da Quinnipiac em abril, Haley era aprovada por 75% dos eleitores republicanos e 53% dos democratas. Quando era governadora da Carolina do Sul , a primeira mulher do cargo, chegou a ter aprovação de 81%.

 Ela sempre foi politicamente arguta. Passou a campanha de 2016 criticando Trump por causa de suas declarações contra imigrantes (ela mesma é filha de indianos). “ Trump contribuiu para uma retórica irresponsável”, disse.

Nas primárias, primeiro apoiou Marco Rubio, depois, Ted Cruz. Mas, quando Trump venceu e ela foi chamada para integrar o governo, abraçou a chance com entusiasmo.

Recentemente, foi apontada como uma das possíveis autoras do artigo anônimo publicado pelo New York Times em setembro, em que um alto funcionário do governo Trump criticava o presidente americano. No dia seguinte, ela publicou um artigo no Washington Post, defendendo Trump das críticas do texto do NYT.

Possivelmente, o cargo de embaixadora na ONU havia deixado de render a Haley a exposição desejável para que ela alçasse voos políticos mais altos. Enquanto Rex Tillerson era o secretário de Estado, ela frequentemente roubava os holofotes e surgia como a face mais visível da política externa americana. No entanto, desde que Mike Pompeo assumiu como secretário de Estado e John Bolton, como assessor de Segurança Nacional, Haley passou a aparecer bem menos.

Outro fator é a denúncia de que ela teria aceito sete caronas em jatinhos de luxo de amigos enquanto estava no cargo, um “presente” no valor estimado de US$ 24 mil (cerca de R$ 92 mil). Isso pode levar a uma investigação, que arranharia sua reputação e, em última instância, acabaria em sua renúncia – como ocorreu com Pruitt e Price.

Por último, Haley estaria com enormes dívidas. Agora seria um bom momento de ir para setor privado, ganhar dinheiro, e depois voltar para a vida política, de olho em cargos mais altos.

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