Turquia investiga se jornalista saudita desaparecido foi morto em consulado

Crítico de seu país, Jamal Khashoggi foi a representação em Istambul buscar documentos

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Ancara | AFP, Reuters e Associated Press

A Turquia pediu permissão para efetuar buscas no consulado da Arábia Saudita em Istambul para investigar se um jornalista saudita desaparecido foi morto no interior do edifício, afirmou o canal NTV nesta segunda-feira (8).

Autoridades turcas acreditam que Jamal Khashoggi, proeminente crítico de Riad e colaborador do jornal americano Washington Post, foi morto após entrar no consulado para resolver questões administrativas na semana passada, disseram fontes a agências de notícias. A Arábia Saudita nega.

Nesta segunda, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, disse que regime saudita precisa provar que o repórter deixou o edifício.

Khashoggi, ex-editor de jornal e consultor do ex-chefe de inteligência de seu país, foi para a Turquia no ano passado dizendo temer uma retaliação por suas crescentes críticas à política saudita na guerra do Iêmen e à repressão às divergências.

Foto de dezembro de 2014 mostra o jornalista saudita Jamal Khashoggi quando era diretor do canal New Arabic News
Foto de dezembro de 2014 mostra o jornalista saudita Jamal Khashoggi quando era diretor do canal New Arabic News - Hasan Jamali-15.dez.2014/AP

Na terça-feira (2), ele entrou no consulado saudita em Istambul para obter documentos para seu futuro casamento. Autoridades sauditas dizem que ele deixou o prédio pouco depois, mas sua noiva, que estava esperando do lado de fora, afirma que ele nunca saiu. 

A polícia turca também afirma que ele não saiu do prédio.

"A avaliação inicial da polícia turca é que Khashoggi foi morto no consulado da Arábia Saudita em Istambul. Acreditamos que o assassinato tenha sido premeditado e que o corpo tenha sido posteriormente retirado do consulado", disse um funcionário turco à Reuters, no sábado (6).

No sábado, a polícia turca anunciou que 15 sauditas haviam entrado e deixado Istambul na própria terça-feira e que estiveram no consulado no mesmo momento que o jornalista. ​

​O embaixador saudita na Turquia foi convocado por Ancara na quarta-feira. Um inquérito judicial também foi aberto.

Uma fonte saudita no consulado negou que Khashoggi tenha sido morto no local e disse em um comunicado que as acusações eram infundadas.

Em uma entrevista à agência Bloomberg na sexta-feira, o príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman disse que Jamal Khashoggi realmente "entrou" no consulado, mas partiu logo em seguida. Ele convidou as autoridades turcas a "procurar" no consulado. "Não temos nada a esconder."

"Estou à espera de uma confirmação oficial do governo turco para acreditar", escreveu nas redes sociais a noiva turca do jornalista, Hatice Cengiz.

"Ele foi ao consulado com hora marcada, então eles sabiam quando ele estaria lá", disse um jornalista próximo a Khashoggi, Yasin Aktay. "Ele ligou para o consulado um pouco antes para ver se seus documentos estavam prontos, eles disseram 'sim, estão prontos, você pode vir'", acrescentou ele.

"Seus amigos o alertaram, falaram que era melhor que ele não fosse, porque não era seguro. Mas ele estava confiante de que tal coisa era impossível na Turquia", acrescentou ​Aktay.

O coordenador da Associação de Mídia Turco-Árabe, Turan Kislakci, que também é amigo de Khashoggi, disse à Associated Press que agentes disseram a ele que o jornalista foi morto de forma "bárbara" e que seu corpo foi desmembrado.

Repercussão

O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, pediu nesta segunda-feira que as autoridades da Arábia Saudita "provem" que o jornalista Jamal Khashoggi deixou o local.

"As autoridades do consulado não podem se livrar dizendo apenas que ele deixou o consulado. As autoridades competentes devem provar", declarou Erdogan durante visita a Budapeste em resposta a uma pergunta sobre o mistério a respeito do desaparecimento do jornalista.

"Se ele deixou o local, vocês devem provar isso com imagens", acrescentou o presidente turco.

"As imagens dos embarques e desembarques no aeroporto de Istambul estão sendo analisadas. Há pessoas que vieram da Arábia Saudita. A Procuradoria está examinando esta questão", prosseguiu Erdogan.

Nesta segunda (8), o presidente americano Donald Trump falou sobre o caso de Khashoggi. "Estou preocupado. Não gosto de ouvir falar disso. Espero que isso se resolva, no momento ninguém sabe nada sobre isso", disse o republicano.

O departamento de Estado americano indicou no sábado que "não poderia confirmar" o destino de Jamal Kashoggi, mas afirmou que "acompanha a situação de perto".

No domingo, a diplomacia britânica considerou  "extremamente graves as alegações" de que o jornalista foi assassinado no consulado. "Estamos a par das últimas informações e trabalhamos para esclarecer os fatos", declarou à AFP um porta-voz do ministério das Relações Exteriores britânico. ​

Em sinal de apoio, o Washington Post decidiu deixar em aberto o espaço em que deveria ter publicado a coluna do jornalista saudita em sua edição de sexta-feira.

A representante da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação da Europa) Harlem Désir fez um apelo para que as autoridades turcas revelem os detalhes do caso, estimando que os "responsáveis por este crime horrível devem prestar contas à Justiça".

Em comentário na Al Jazeera em inglês, o jornalista e analista Bill Law diz conhecer Khashoggi há 16 anos e o descreve como "um jornalista brilhante, dotado de uma mente ferozmente independente e de bastante pragmatismo para saber até onde pode se aproximar das linhas vermelhas".

A Arábia Saudita está na posição 169 de 180 no ranking mundial de liberdade de imprensa da organização Repórteres sem Fronteiras.

Riad promove uma campanha de modernização desde que o príncipe Mohamed bin Salman foi designado herdeiro ao trono, em 2017. Mas a repressão aos dissidentes, com detenções de religiosos, personalidades liberais e de ativistas feministas, se acentuou desde então.

Khashoggi, que fará 60 anos em 13 de outubro, é um dos poucos jornalistas que têm criticado esta repressão.

Em 6 de março, em texto de opinião escrito com Robert Lacey no jornal britânico The Guardian, escreveu que o príncipe Mohamed bin Salman "parece conduzir o país de um extremismo religioso de outra época ao seu próprio extremismo de 'tem que aceitar minhas reformas', sem nenhuma consulta e com detenções e desaparecimentos de seus detratores. Ignora seu programa uma das reformas mais importantes, a democracia?".

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