Mudanças no regime cubano são cosméticas, dizem analistas

Acesso à internet e novas regras econômicas não mudam fundações do sistema

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Jovem em Havana tenta se conectar no primeiro dia de venda de pacotes de internet para celular - Yamil Lage/AFP
Nova York

Os anúncios feitos nos últimos dias pelo regime cubano estão mais para “fake changes” (mudanças falsas) do que representam, de fato, uma guinada na condução econômica da ilha e um aceno a uma Cuba menos avessa ao capitalismo.

Para analistas, o regime cubano tenta se reorganizar e atrair novos aliados em um cenário em que um de seus principais parceiros, a Venezuela, mergulha em uma crise humanitária e econômica.

“São ‘fake changes’. O governo cubano convenceu [o ex-presidente americano Barack] Obama de que estava fazendo mudanças reais, e eram cosméticas. O capitalismo não está voltando para Cuba, eles não mudaram nenhuma das fundações do regime”, afirma à Folha Sebastián Arcos, diretor associado do Cuban Research Institute, da Universidade Florida International.

Ele se refere ao estreitamento das relações entre Cuba e EUA que aconteceu durante o governo do democrata e enquanto Raúl Castro ainda era o dirigente da ilha, mas que foi desfeito após o republicano Donald Trump assumir a Casa Branca, em 2017.

“Eles fizeram mudanças porque precisam se adaptar aos novos tempos, porque o apoio econômico da Venezuela e da Rússia foi embora. Mas eles não querem abrir mão de poder. Não podemos esperar abertura econômica e política em Cuba enquanto essa geração se mantiver no poder.”

Uma das mudanças que o especialista tacha de cosmética é o acesso à internet via celular. O modelo adotado é parecido com o da China, em que o governo permite a navegação, mas sob supervisão do Estado. Em Cuba, há uma companhia estatal de internet e telefone.

“Eles dão a impressão de que oferecem acesso aos cubanos, mas querem controlar esse acesso.”

Na prática, a medida também beneficia uma parcela muito limitada da população cubana, afirma Philip Brenner, professor de relações internacionais da American University.

“A jogada de dar aos cubanos acesso à internet via telefones celulares é mais simbólica do que tangível. O custo mensal de acesso à internet é muito acima do que o cubano médio pode pagar, e então isso vai beneficiar apenas um pequeno número de cubanos”, diz.

Outro exemplo são as licenças para empreendedores cubanos, que poderão ter mais de uma por pessoa.

Entretanto, em algumas atividades será obrigatório abrir uma conta bancária, e o dono do negócio terá que depositar um percentual da receita obtida, para evitar evasão fiscal.

“O regime não gosta do empreendedor, porque alguns deles estão ficando ricos, o que traz de volta a desigualdade, que é justamente o que a revolução tentou combater”, afirma John Kavulich, presidente do U.S.-Cuba Trade and Economic Council.

Especialistas, porém, veem nos anúncios uma indicação de que o regime cubano pode tentar uma abordagem à la China, um socialismo de mercado.

É o caso de Arturo Lopez-Levy, professor assistente visitante do Gustavus Adolphus College, de Minnesota.

Para ele, com as pequenas mudanças, o regime cubano entra em uma fase de testes. “Eles ainda são um governo leninista, mas revertem algumas políticas quando acham que as coisas estão saindo do controle, como a China.”

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.