Pinochet impediu que o Chile se convertesse em uma Cuba, diz Eduardo Bolsonaro

Deputado visita o Chile para se reunir com representantes da direita

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María José O´Shea e Fernando Fuentes
Santiago

O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL) avalia positivamente o regime do ex-ditador Augusto Pinochet (1915-2006), que diz ser o responsável por impedir que o Chile “se convertesse numa nova Cuba”.

“Aconteceu com o Chile, aconteceu com o Brasil, aconteceu com a Argentina, com mais ou menos força. Mas aqui no Chile, vocês hoje assistem aos frutos de sua reforma das aposentadorias. A economia tem muito a ver com o que aconteceu nos anos 1980. Então o que aconteceu de ruim, quer sejam torturas, mortes, pode se falar disso, mas houve muita coisa boa também”, disse Eduardo nesta quinta-feira (13) em entrevista ao jornal chileno La Tercera.

O deputado falou ao jornal também sobre sua visão política e sobre a “onda conservadora” que, afirma com orgulho, chegou para ficar na América do Sul.

O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL) se encontra com o político de direita chileno José Antonio Kast, em Santiago, no Chile - Ivan Alvarado-13.dez.2018/Reuters

Filho do presidente eleito, Jair Bolsonaro, ele diz admirar o conservador José Antonio Kast, “o Bolsonaro do Chile”, derrotado por Sebastián Piñera (de centro-direita) nas eleições chilenas de 2017. “As pessoas estão fartas desse tipo de político que não polemiza; elas querem pessoas com posição. Essa é uma fase nova que chegou aqui na América do Sul.”

Questionado se prefere Sebastián Piñera ou o economista José Piñera, um dos Chicago Boys e ministro da ditadura de Pinochet, ele diz que o segundo é uma inspiração. “Agora nós também temos nosso Chicago Boy, que é Paulo Guedes. Trinta anos depois, o Brasil vai tentar fazer o que o Chile fez nos anos 1980. Estamos muito atrasados. Então obrigado, José Piñera.”

 

Este não é seu primeiro mandato como deputado. Por que o sr. acha que recebeu tantos votos? Primeiro, por ser filho de meu pai. Tenho muito orgulho disso, ademais porque meu pai é um político que está fora de todo esse sistema de corrupção, então está comprovado que ele é uma pessoa limpa.

Acho que a internet também contribuiu. Com a comunicação direta, inauguramos uma nova era, outro nível de comunicação com as pessoas. Por mais que uma parte da imprensa continue a dizer que somos racistas, fascistas, nazistas, sexistas, xenófobos, misóginos e tudo isso, a pessoa tem acesso à internet e vê que não é assim. Os ataques dos adversários também se notam. É por isso que as coisas estão tão polarizadas: não há mais debate, não há mais argumentos, há apenas ataques. Se você é contra mostrarem um vídeo de homens se beijando nas escolas para as crianças de 4 ou 5 anos, te chamam de homofóbico.

O sr. não se considera homofóbico? Nem um pouco. Com todo respeito, não sei se você é lésbica e isso não me interessa, assim como para você com certeza não interessa se vou fazer sexo com homens ou com mulheres.

Não. É sempre assim, a esquerda é mestre nisso: em dividir, fragmentar a sociedade para que depois chegue um político para proteger essa minoria. Para nós, não importa se vamos receber votos ou não por dizer o que pensamos. E ao que parece, o que Jair Bolsonaro está dizendo é do gosto das pessoas. Se não, teríamos 60 milhões de racistas, sexistas, misóginos, fascistas e tudo isso nas ruas.

No governo que seu pai vai chefiar, o que vai acontecer com políticas públicas como o casamento homossexual? Não vai acontecer nada. Se as pessoas no Brasil querem e desejam o casamento entre homossexuais, podem ficar tranquilas. Se um deputado ou senador propuser um projeto de lei para que seja feita a modificação na nossa Constituição, aí, sim, vamos aceitá-lo. Há muitas coisas na Constituição das quais não gosto, por exemplo, eu adoraria que existisse a prisão perpétua no Brasil, mas há uma limitação na Constituição. Os políticos de esquerda tentam impor sua visão através de ativismo judicial ou de organismos internacionais, para que a modificação venha de cima para baixo, mas sem legitimidade. Então é esse o momento que o Brasil vive e é por isso que as coisas estão tão polarizadas.

O sr. é jovem, tem 34 anos. Os jovens são mais progressistas que o sr.? Há uma frase que diz: ‘se você tem 20 anos e não é socialista, não tem coração; se tem 30 anos e ainda é socialista, não tem cabeça’. Você começa a trabalhar e pagar suas contas e começa a ter uma percepção mais próxima da realidade. Você vê que o mundo precisa de meritocracia, que dinheiro não dá em árvore. Se por um lado há um político com uma proposta assistencialista, é porque pelo outro lado há pessoas trabalhando para manter tudo isso. O que queremos? Uma cultura de meritocracia onde as pessoas recebam o fruto de seu trabalho, não políticas assistencialistas.

O que o sr. pensa de como a direita no Chile está encarando o fenômeno Bolsonaro? No Chile e também na Colômbia estão encarando com muita esperança, porque o Brasil é quase metade da América do Sul, portanto o que acontece no país tem efeito sobre toda a região. Nos últimos 13 ou 14 anos, quando tivemos presidentes do PT, eles financiavam as outras ditaduras, não apenas da Venezuela, mas também em Cuba, na Nicarágua e outros países. Com esta mudança que está ocorrendo no Brasil com a chegada do meu pai, é certeza que vamos fazer outras investigações.

O sistema corrupto utilizou um banco público, o BNDES, para financiar outros países, e sei que há muitas suspeitas em relação a obras da Odebrecht construídas também aqui no Chile. É o que vamos investigar, porque esse banco público é como uma caixa preta.

Vocês têm algum indício de que a Odebrecht tenha dado dinheiro a políticos chilenos? Não posso dar certeza, mas suspeitas sempre existem, porque há um “modus operandi”. Isso aconteceu com a Venezuela, com a Nicarágua, com Cuba, com países africanos, a Guiana, a Bolívia, então seria uma ingenuidade imaginar que seria completamente diferente com o Chile. Mas quem vai falar disso não é Eduardo Bolsonaro, não é Jair Bolsonaro, são as autoridades responsáveis pela investigação no Brasil.

Aqui foi investigado o caso de um avião que a OAS emprestou ao candidato Marco Enríquez-Ominami. O sr. está sabendo disso? Desse caso específico, não. Mas suspeitas sempre existem.

Voltando a falar da direita, o que a direita chilena significa para Bolsonaro? O Chile é um exemplo de estabilidade econômica. O que aconteceu aqui nos anos 1980 com as reformas das pensões é um exemplo para o mundo. Essa é a principal medida que apreciamos no Brasil. Uma renda per capita de US$ 25 mil revela que o Chile está em um nível diferente de toda a América do Sul. Mas vim para cá também para aproveitar este momento para que não seja apenas uma onda conservadora na América do Sul, porque assim como tivemos muitos presidentes socialistas, agora a América do Sul está olhando para pessoas como Piñera, Macri, Jair Bolsonaro, então é um momento para uma mudança permanente. Mas, para realizar isso, precisamos ter uma comunicação. O que a esquerda propõe no Brasil é a mesma coisa que acontece no Chile, na Colômbia, então por que nós não podemos nos manter em contato?

E Piñera faz parte dessa onda conservadora? Com certeza, muito mais que [Michelle] Bachelet. [antecessora de Piñera e socialista]

Houve discussões diretas com o governo? Ainda não. Amanhã [nesta sexta] vamos ao Ministério da Fazenda com outras pessoas do governo, mas muito mais para ouvir e para ter um canal direto que outra coisa. Não estou aqui representando o Brasil oficialmente. Vim com minha própria perspectiva, minha própria visão como deputado.

Quando o sr. fala dessa onda conservadora, além do modelo econômico, que outras coisas a definem? Trata-se também de reduzir o espaço do Estado, menos intervenção econômica, mudar a visão equivocada dos direitos humanos que hoje só beneficiam os criminosos. Precisamos pensar nas vítimas, porque hoje os direitos humanos encaram os bandidos como vítimas de uma sociedade capitalista, e não é assim. No mesmo lugar pobre de onde saem criminosos há uma maioria de pessoas trabalhadoras e honestas.

E em matéria de valores, quais são suas ideias? Meu pensamento é que não podemos viver numa ditadura das minorias. As minorias precisam ser respeitadas, mas não se podem propor medidas para privilegiar 2% da população em detrimento dos outros 98%. Não é o caso de tratar os homossexuais, os negros, as mulheres como pessoas não qualificadas, mas de lhes dar igualdade de oportunidades, só isso. Meritocracia.

O sr. esteve com Jacqueline Van Rysselberghe. Ela enfrenta uma eleição em seu partido, a UDI, para continuar na presidência. O sr. está ao lado dela? Sim, se eu fosse chileno, votaria nela. Gosto muito dela porque há uma ligação de ideais. Além disso, ela foi visitar meu pai.

Se o sr. fosse chileno, votaria nela, não em Javier Macaya… Sim, sim, se eu fosse da UDI votaria em Jacqueline. Não conheço muitos outros senadores aqui no Chile e ela é uma pessoa muito carismática, que tem um pensamento muito próximo do nosso. Ela tem meu apoio.

O outro que está sempre próximo de Bolsonaro é José Antonio Kast. Sim, me disseram que ele é o Bolsonaro do Chile. Sua posição é muito forte, muito bem definida, por falar fora do discurso politicamente correta. Não é preciso ter um discurso mais moderado para agradar ao máximo possível de pessoas. As pessoas estão fartas desse tipo de político que não polemiza; elas querem pessoas com posição. Essa é uma fase nova que chegou aqui na América do Sul.

Ele fez uma apresentação na cúpula conservadora recente no Brasil, e nos cartazes aparecia Pinochet, um tema que divide muito. Para vocês, como onda conservadora, isso significa alguma coisa ou não quer dizer nada? Pinochet foi uma pessoa que impediu que o Chile também se convertesse numa nova Cuba. Aconteceu com o Chile, aconteceu com o Brasil, aconteceu com a Argentina, com mais ou menos força, mas aqui no Chile vocês hoje assistem aos frutos de sua reforma das aposentadorias. A economia tem muito a ver com o que aconteceu nos anos 1980. Então o que aconteceu de ruim, quer sejam torturas, mortes, pode se falar disso, por que não, mas houve muita coisa boa também. Mas quero deixar claro que não conheço a fundo a situação do Chile.

Quando o sr. fala do modelo chileno, José Piñera foi importante como autor da reforma das pensões. Qual Piñera vocês preferem, José ou Sebastián? José Piñera é uma inspiração, isso é inegável. Agora nós também temos nosso Chicago Boy, que é Paulo Guedes. Trinta anos depois, o Brasil vai tentar fazer o que o Chile fez nos anos 1980. Estamos muito atrasados. Então obrigado, José Piñera!

O sr. se reuniu com ele, com José? Ainda não, mas acho que vamos nos encontrar, sim.

Deputado, irmão de deputado e filho de presidente. O sr.também quer ser presidente no futuro? Não, essa é uma pergunta muito difícil porque muita coisa vai acontecer. Pode ser que sim, pode ser que não, é muito mais por conta do que as pessoas querem do que o que eu quero. É uma questão de muita responsabilidade. Se eu tentar chegar à Presidência com certeza será um desafio enorme, mas uma mudança muito brutal. Você precisa estar muito preparado para isso, mas se a oportunidade surgir, por que não? Não é algo que eu ambicione, não estou trabalhando para me tornar presidente do Brasil daqui a quatro anos. Se as coisas ocorrerem naturalmente nesse sentido, por que não?

La Tercera PM, tradução de Clara Allain

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