Premiada, série 'Um Mundo de Muros' humanizou tragédias e foi além dos números

Reconhecimento é revigorante em tempos em que jornalismo é alvo de quem prefere fatos alternativos à verdade, escreve editora de Mundo

Luciana Coelho
São Paulo

Vinte anos de jornalismo internacional ensinam que o mundo se encontra muito mais em suas desgraças do que nas boas notícias. Crises em locais distintos não raramente têm causas comuns.

Como tratá-las, então, além dos números e da burocracia? Como dar humanidade ao que, de tanto se repetir, anestesia leitores e políticos, e parece distante de nossa rotina?

Isso norteou a série de reportagens multimídia “Um Mundo de Muros”, publicada de junho a setembro de 2017 pela Folha.

Dia 27, o projeto venceu o Grande Prêmio Petrobras de Jornalismo, o principal do país. Antes, ganhara o Prêmio Rei da Espanha, dado pela agência Efe e o Ministério das Relações Exteriores espanhol, e o Prêmio do Comitê Internacional da Cruz Vermelha. 

“Um Mundo de Muros” não trata de algo longínquo. Trata de exclusão e de empatia, tão em falta em brasileiros.

O muro que separa pobres em Cubatão (SP) de viajantes rumo ao litoral paulista se ergue, afinal, sobre o mesmo preconceito que separa refugiados somalis de quenianos.

Ou que blinda israelenses temerosos de ataques de palestinos; que separa mexicanos dos EUA com concreto e arame; que barra refugiados do Oriente Médio a caminho para a Europa; que esconde a pobreza de indígenas em Lima.

A ideia de buscar quem estava do outro lado desses muros veio dos repórteres Patricia Campos Mello e Lalo de Almeida e consumiu oito meses de trabalho deles e de outros 20 repórteres de texto e imagem, editores, programadores, infografistas e técnicos.

Fabiano Maisonnave, Avener Prado, Isabel Fleck, Diogo Bercito, Victor Parolim, Daigo Oliva, Thiago Almeida, Simon Ducroquet, Angelo Dias, Renan Marra, Irapuã Campos, Marcelo Pliger, Angelo Dias, Rubens Alencar, Rogério Pilker, José Henrique Mariante, Edson Sales, Thea Severino, Kleber Bonjoan e Roberto Dias, mais Patricia e Lalo, foram uma equipe aguerrida, companheira e incansável.

Nosso esforço custou paciência, pesquisa e dinheiro.

Receber esse prêmio quando o jornalismo é alvo de quem prefere “fatos alternativos” à verdade, em que a própria Folha e a Patricia são atacados por fazerem bem seu trabalho e revelar fatos que desagradam, é revigorante.

Essa tentativa de desmerecer o jornalismo foi lembrada na premiação por vários colegas. Assim como foi lembrado o interesse pelo outro, a busca incessante por entender e fazer melhor incutidos nesta equipe por Otavio Frias Filho, diretor de Redação da Folha, morto em agosto.

Entender todos os lados de uma história é penoso, mas também gratificante.

Luciana Coelho é editora de Mundo e coordenou “Um Mundo de Muros”

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