Descrição de chapéu Governo Trump

Por que republicanos condenam deputado racista e não fazem o mesmo com Trump?

Steve King é repudiado por membros do partido após declarações sobre supremacia branca

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Sheryl Gay Stolberg
Washington | The New York Times

Depois de ignorar os comportamentos racistas e declarações inflamatórias do deputado Steve King durante anos, nesta semana os republicanos decidiram dar um basta quando King perguntou ao The New York Times quando foi que frases como “supremacia branca” e “nacionalismo branco” haviam se tornado ofensivas.

Ao mesmo tempo que os republicanos condenavam o deputado, porém, o presidente Donald Trump usava o Twitter para ironizar a senadora Elizabeth Warren, perguntando por que não anunciara seu comitê exploratório presidencial em Wounded Knee ou Little Bighorn, locais sagrados para os indígenas americanos, cujos ancestrais combateram e morreram ali.

Deputado do Iowa, King disse certa vez que imigrantes ilegais “têm a batata da perna do tamanho de melões porque atravessam o deserto carregando 35 kg de maconha”.

O deputado americano Steve King - Joshua Roberts - 20.dez.18/Reuters

Ele agora virou persona non grata em seu partido, ao mesmo tempo em que Trump continua a retratar os mesmos migrantes como estupradores, traficantes de drogas e importadores do caos.

Na quarta-feira (16), a porta-voz de Trump, Sarah Huckabee Sanders, descreveu os comentários de King como “odiosos”.

Essa incoerência está dando subsídio a democratas ansiosos para descrever os republicanos como hipócritas e para republicanos da ala contrária a Trump, que enxergam o presidente como ameaça existencial ao seu partido.

E ela expõe o desafio enfrentado por republicanos na era de Trump, que tentam cortejar o voto latino e ao mesmo tempo não incorrer no desagrado de um presidente que fez do vilipêndio de imigrantes um dos elementos fundamentais de seu apelo populista.

“Vejam bem, minha prática nos dois últimos anos vem sendo não fazer observações aleatórias sobre os tuites do presidente e outras coisas”, disse a jornalistas na terça-feira (15) o senador Mitch McConnell, líder da maioria no Senado, pouco antes de a Câmara aprovar por maioria avassaladora uma resolução condenando a supremacia branca e citando King.

“O deputado King claramente proferiu palavras que são inaceitáveis na América hoje.”

McConnell, que sugeriu que King encontrasse outra profissão, não foi o único líder republicano a tentar distanciar Trump do deputado.

O deputado Kevin McCarthy, líder da minoria republicana na Câmara, destituiu King de sua participação em comitês da Câmara e sugeriu que não cabe a ele repreender Trump, já que o presidente não é membro da Conferência Republicana da Câmara. (Na realidade, a Câmara é, sim, autorizada a repreender ou censurar o presidente.)

O deputado Tom Cole, de Oklahoma, outro membro da liderança republicana, disse mais ou menos a mesma coisa: “Acho que é uma questão da linguagem que empregamos na Câmara. A meu ver, não é apropriado disciplinarmos o presidente. Ele faz parte de um poder diferente do nosso”.

Os republicanos estão acostumados a não saber como tratar os comentários ofensivos e declarações racialmente inflamatórias do presidente.

As declarações do presidente após a manifestação nacionalista branca de agosto de 2017 em Charlottesville, Virgínia, quando Trump disse que havia “ótimas pessoas de ambos os lados”, levou os líderes republicanos a tentarem se proteger, ao mesmo tempo tomando o cuidado de não criticar o presidente diretamente.

“Precisamos deixar claro”, escreveu no Twitter na época o então presidente da Câmara, Paul Ryan. “A supremacia branca é repulsiva. Esse preconceito e essa discriminação são contrários a tudo o que este país representa. Não pode haver ambiguidade moral.”

E quando o tuíte do presidente sobre Wounded Knee na noite de domingo (13) enfureceu líderes indígenas em seu Estado, o senador John Thune, do Dakota do Sul, o segundo mais poderoso republicano no Senado, fez uma crítica leve ao presidente.

“Eu queria que ele não usasse o Twitter com tanta frequência”, disse Thune a repórteres. “Wounded Knee é obviamente uma parte muito sensível da história de nosso estado. Então eu queria que ele mantivesse distância do Twitter.”

De modo geral, porém, os políticos republicanos eleitos têm evitado tecer críticas ao presidente.

“Eles sabem em algum nível que sua defesa de Trump é moralmente insustentável. Por isso, quando têm a oportunidade de manifestar-se contra Steve King, que não tem poder sobre eles e não representa uma ameaça a eles, muitos correm para condená-lo”, disse Peter Wehner, que assessorou o presidente George W. Bush em questões de política interna.

“Mas não dá para condenar Steve King sem condenar Donald Trump e fazer de conta que se está fazendo a coisa moral e ética certa.”

Parece que os republicanos estão contentes por terem encontrado em Steve King a oportunidade de condenar o racismo sem atacar o presidente.

Depois de levarem uma surra nas eleições parlamentares de 2018 –da qual saiu uma nova leva de parlamentares republicanos composta quase inteiramente de homens brancos e que elevou para 90% a parcela de homens brancos na Conferência Republicana da Câmara—, os republicanos também têm plena consciência de que seu partido precisa reformar sua imagem.

Michael Gerson, que foi o redator principal de discursos de Bush, publicou um artigo de opinião no “Washington Post” nesta semana com o título “Os republicanos precisam condenar o preconceito deslavado de Trump”.

Wehner concordou. Depois de a deputada Liz Cheney, de Wyoming, a republicana número três da Câmara, ter dito na televisão na terça-feira (15) que as declarações de Steve King foram “absolutamente repulsivas” e “racistas”, Wehner escreveu no Twitter: “Será que Liz Cheney diria a mesma coisa de Donald Trump?”.

Mas alguns republicanos dizem que não podem ser a polícia do discurso e discordam em relação aos parâmetros que definem o discurso suficientemente ofensivo para ser digno de repúdio.

“Será que toda declaração dada por um deputado ou político eleito merece ser objeto de ações na Câmara?”, perguntou o deputado republicano Mario Diaz-Balart, da Flórida. “Se sim, é só isso que vamos ficar fazendo.”

Tradução de Clara Allain

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