Argentina adota modelo uruguaio para produção de maconha medicinal

Após aprovação, província de Jujuy deve receber primeiras sementes para plantação

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Mulher segura planta de maconha em manifestação pela liberação da cannabis em Buenos Aires, na Argentina - Marcos Brindicci-4.dez.14/Reuters
Buenos Aires

Em duas semanas, chegam à Argentina as primeiras sementes para o cultivo oficial de maconha. O movimento se tornou possível após o Ministério de Segurança conceder, na última segunda-feira (11), permissão para que a província de Jujuy instale, em um território de 15 hectares, um campo de plantação, um laboratório e de um centro de estudos médicos e científicos relacionados à planta. 

A Argentina já tinha aprovado o cultivo da droga para uso médico em março de 2017. Porém, como o Estado não havia, até então, concedido as licenças necessárias para a produção, criou-se uma situação anômala, em que o uso medicinal estava aprovado, mas para se ter acesso à medicação era necessário recorrer ao mercado negro, ou cultivar em casa.

“Eu não posso correr esse risco de buscar um ‘dealer’, sou professora, não posso ir parar num local de venda ilegal e de repente ser presa por isso”, diz à Folha Irina Ragno, 42, que tem um filho com esquizofrenia. 

Com um grupo de outras mães, ela tem feito petições ao governo para que sejam mais acessíveis, por vias legais, os remédios produzidos em outros países.

A maconha de uso medicinal tem uso liberado para fins diferentes, de acordo com cada país. Os casos em que sua utilização é mais recomendada pelos médicos são os de alívio de dores e de efeitos colaterais provocados pela quimioterapia, episódios de esquizofrenia e outros. 

Porém, cada paciente deve ser avaliado e obter receita individualizada para seu caso, como já ocorre no Uruguai.

O país vizinho, aliás, é um modelo para o caso de Jujuy no que diz respeito à produção. Ela será estatal, assim como a venda para o mercado interno e externo. 

Porém, não se contempla ainda a exploração comercial da maconha para uso recreativo, como no caso uruguaio.

A iniciativa de realizar o experimento em Jujuy partiu do governador Gerardo Morales, da União Cívica Radical (partido que integra a base de apoio do governo de Mauricio Macri).

A previsão inicial é de produzir cerca de 300 mil litros de azeite em cinco anos, para usá-lo na fabricação dos remédios.

A medida, porém, está causando certo ruído, tanto por parte da oposição, como de grupos de parentes interessados em obter a droga para tratar seus familiares.

Isso porque a empresa estatal argentina que participará do empreendimento, a Cannabis Avatãra, é dirigida pelo filho do governador de Jujuy, Gastón Morales, em associação com a norte-americana Green Leaf Farms International, que trará ao país os recursos e aparatos necessários para a produção.

Questiona-se, também, por que a licença foi concedida a Jujuy, onde governa um político governista, e não a outras províncias, comandadas pela oposição, que também fizeram a solicitação. Também está em questão o fato o filho do governador comandar o negócio. 

A deputada oposicionista Alejandra Cejas diz que teme que a família Morales esteja transformando Jujuy num “narco-estado” e que o interesse das famílias que precisam da droga fique em segundo plano.

Gastón Morales disse em entrevista ao jornal Perfil que a oposição está sendo “imatura”. 

“Precisamos deixar de lado essa coisa de levantar bandeiras. Esse projeto não tem cor radical, peronista ou macrista, apenas o interesse de desenvolver a tecnologia para fabricar a maconha de uso medicinal”, completa.

Já organizações de familiares, como a Mamá Cultiva, creem que o investimento está sendo feito “apenas com vistas ao lucro e privilegiando a venda ao exterior”, segundo Patrícia Saldías, uma das mães. 

“Anunciam como se fosse uma propaganda da província de Jujuy e do Ministério de Segurança, mas se esquecem de dizer que os principais beneficiários serão os estrangeiros, pois a prioridade será a exportação. Que resposta têm para as famílias que temos pessoas com problemas e que precisam desses remédios?”.

Apesar das reclamações, o projeto foi autorizado pelo Executivo.

A área onde ocorrerá o cultivo será a fazenda El Pongo e terá vigilância da Gendarmeria Nacional (órgão com funções semelhantes à Polícia Federal brasileira), para evitar desvios ou roubos da colheita.

Gastón Morales nega que o objetivo principal seja o mercado externo, mas aponta que a Secretaria de Saúde argentina apenas libera o uso da maconha medicinal para casos de epilepsia. 

Por conta disso, a empresa por ora também mira os “mercados onde o uso legal é mais amplo e pode ser usado para atender a pacientes que sofrem de outras patologias”.

Espera-se, ainda, que a Secretaria de Saúde, junto ao Ministério de Justiça, regulamente as quantidades e os produtos que poderão ser vendidos, se será necessário um registro prévio dos usuários, ou se bastará apenas um receituário médico para poder comprar o produto.

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