Defensores do brexit merecem o inferno, diz presidente do Conselho Europeu

Theresa May irá nesta quinta (7) a Bruxelas para tentar mudar os termos da separação

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O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, durante sua declaração a jornalistas nesta quarta (6) em Bruxelas
O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, durante sua declaração a jornalistas nesta quarta (6) em Bruxelas - Aris Oikonomou/AFP
São Paulo, Bruxelas, Londres e Belfast | Reuters e AFP

Um dia antes de a primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May, ir a Bruxelas para pedir mudanças no acordo de saída do país da União Europeia (UE), a cúpula do bloco enviou um duro recado aos britânicos, negando a possibilidade de novas negociações. 

Em uma frase que ilustra a tensão no continente com o impasse em torno do brexit, o presidente do Conselho Europeu (que reúne os chefes de governo e de Estado do bloco), Donald Tusk, afirmou nesta quarta-feira (6) que os defensores da separação merecem o inferno.

"Tenho pensado em como deve ser este lugar especial no inferno para as pessoas que fizeram campanha pelo brexit sem ter nem mesmo um esboço de plano de como realizá-lo de modo ordenado", disse Tusk a jornalistas. 

A frase foi bombardeada pelos parlamentares britânicos a favor da saída do país do bloco. A conservadora Andrea Leadsom chamou Tusk de "sem educação" e exigiu que ele pedisse desculpas.

O ex-líder do partido de direita radical Ukip, Nigel Farage, também respondeu ao europeu.

"Depois do brexit, estaremos livres de provocadores arrogantes e não eleitos como você [o presidente do Conselho é escolhido pelos demais membros] —e isso soa como o paraíso para mim", disse

Já grupos a favor da permanência na UE aplaudiram a declaração, para a qual Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia (o braço executivo da UE), ofereceu um adendo um pouco menos virulento algumas horas depois. 

"Sou menos católico do que meu bom amigo Donald. Ele acredita no céu e, por consequência, no inferno.

Já eu acredito no céu e não no inferno, com exceção do que estou fazendo agora, que é o inferno", disse, referindo-se às negociações para o brexit.

No final de 2018, Bruxelas e Londres fecharam um pacto para definir os termos do “divórcio”, marcado para 29 de março, mas o plano foi derrubado em janeiro pelo Parlamento britânico, que dias depois se comprometeu a aprovar uma versão editada do texto.

No centro do impasse está a questão da fronteira entre a República da Irlanda (país independente que faz parte da UE) e a Irlanda do Norte (parte do Reino Unido).

Segundo o acordo de paz que pôs fim ao conflito na região em 1998, os cidadãos das duas Irlandas são livres para se movimentarem entre elas, não podendo assim existir uma barreira física na fronteira —o que não era um problema quando todos estavam dentro da UE, mas passou a ser com o brexit. 

A proposta que consta no documento acordado entre Londres e Bruxelas envolve a criação de uma união aduaneira temporária cobrindo toda a UE e o Reino Unido. O dispositivo entraria em vigor caso, a seis meses do fim do período de transição pós-brexit (ou seja, em julho de 2020), os dois lados não tivessem fechado um novo (e definitivo) acordo comercial.

Para os defensores da separação, porém, a ideia é intragável, porque significa manter o Reino Unido atado a regras e decisões europeias, o que contraria o desejo de emancipação expresso no voto majoritário pelo “leave” no plebiscito de 2016.  

Essa ala defende que, no mínimo, os britânicos tenham o direito de deixar unilateralmente a união aduaneira –o mecanismo que a instauraria, visto como um seguro para a República da Irlanda, é chamado em inglês de “backstop”.

A possibilidade de retirada de Londres do “backstop” à revelia de Bruxelas está na pauta da visita de May à cúpula europeia nesta quinta (7). A primeira-ministra também deve apresentar um plano que limita a vigência da hipotética união aduaneira –possivelmente a um ano, a saber, até o fim de 2021.

Espera-se ainda que ela discuta uma terceira via, ancorada no prolongamento da fase de transição e na substituição do “backstop” por soluções tecnológicas para controlar mercadorias longe da fronteira irlandesa. Nesse cenário, a união aduaneira daria lugar a um acordo de livre-comércio com tarifa zero de lado a lado.

De toda forma, Juncker já descartou a possibilidade de a UE ceder em relação ao dispositivo.

"O brexit não é uma questão bilateral entre a República da Irlanda e o Reino Unido, é uma questão europeia", disse ele na quarta, em entrevista ao lado do primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar. "O 'backstop' é parte do acordo de saída, e não podemos reabrir a discussão."

A primeira-ministra britânica não respondeu às declarações dos líderes europeus, mas um porta-voz de seu governo disse a jornalistas que a UE precisa aceitar as mudanças se quiser evitar a hipótese de saída sem acordo (o "no-deal").

Para complicar a situação, o partido irlandês Sinn Fein afirmou que, caso a separação aconteça de fato sem acordo —o que significa que as fronteiras teriam que retornar—, Londres deve permitir um plebiscito sobre a reunificação das Irlandas. 

O acordo de paz de 1998 estabeleceu que, se a maioria da Irlanda e da Irlanda do Norte se manifestasse a favor da reunificação em algum momento, o governo britânico seria obrigado a permitir que ela ocorresse.

No plebiscito que decidiu pelo brexit, a maior parte dos norte-irlandeses votou a favor da permanência na UE, embora até aqui a população tenha sempre se pronunciado majoritariamente pela preservação do território no Reino Unido.

May prometeu voltar ao Parlamento britânico em 13 de fevereiro com uma nova proposta para o brexit. 

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